Camafeu de Oxossi: o personagem que permanece vivo

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Camafeu de Oxossi: o personagem que permanece vivo

O meu inesquecível de hoje é o famoso Ápio Patrocínio da Conceição, popularmente conhecido por Camafeu de Oxossi. Filho de Maria Firmina da Conceição e Faustino José do Patrocínio, Camafeu nasceu em 4 de outubro de 1915 na Rua do Gravatá, que fica entre o bairro de Nazaré e o antigo Maciel/Pelourinho. Ficou órfão de pai muito cedo – aos seis anos de idade. Anos mais tarde, deixou os estudos na Escola de Artífices para ajudar sua mãe a criar seus irmãos. Ela tinha um tabuleiro de acarajé e o jovem Camafeu apanhava frutas para fazer cocadas e também vendê-las. Embora mal tenha aprendido a ler e escrever, ele aprendeu a se virar pelas ruas do Maciel.

Pelas ruas de Salvador, Camafeu engraxava sapatos e vendia de tudo um pouco, de jornais a cadarços: o jovem almejava ter seu próprio negócio. Chegou a ser estivador até se tornar dono de sua primeira barraca no Mercado Modelo – Barraca São Jorge. Camafeu era mestre de Capoeira; cantor; compositor. Como exímio tocador de berimbau, chegou a lançar um LP pela gravadora Continental: “Berimbaus da Bahia”, em 1967 e, no ano seguinte, um segundo disco foi gravado pela Phillips.       

A oralidade conta que seu epíteto surge quando ele encontra um broche de camafeu – pedra esculpida em alto relevo, muito utilizada para prender a gola dos vestidos das mulheres da alta sociedade naquela época. Já o Oxossi, foi agregado por ele mesmo, pois é o seu Orixá de cabeça. Camafeu de Oxossi era filho de Santo de Mãe Senhora – Maria Bibiana do Espírito Santo do Opô Afonjá e tinha o título de Obá de Xangô, chamando-se Obá Aresá. Muito amigo de Hector Bernabó; o Carybé e Jorge Amado, ambos de Oxossi e também Obá de Xangô – Obá Onaxokun e Obá Arolú, respectivamente. Camafeu era intitulado de “personagem vivo de Jorge Amado”, pois ele aparece em seus romances como Camafeu.

Tenho lembranças muito boas do velho Camafeu. Uma delas é de tia Stella – Mãe Stella de Oxossi – o chamando de “Camafa”. A outra rememoração muito viva advém das idas com meu pai ao Mercado Modelo, onde eles ficavam conversando por horas. A farra ficava completa quando se encontravam – Camafeu e meu pai – com: Maninho, Babão e Luis Domingos, todos três com estabelecimento comercial no Mercado Modelo e hoje todos seguem no “mundo da verdade” – in memoriam. Outra memória honrosa foi quando soube que os grandes Obás estavam a discutir qual Obá eu me tornaria. Irei ilustrar, só para que entendam, pois já falei de tal acontecimento sobre os Obás aqui no Farol [veja aqui].

Em reunião extraordinária, aqueles grandes Obás discutiam para saber de quem eu seria suplente. E soube que houve uma discussão acirrada entre os Obás Abiodun – Sinval da Costa Lima; Onaxokun – Carybé e Aresá – Camafeu. Obviamente que eu só soube disso já na maioridade e o sentimento de orgulho e honra me tomavam. Imaginem a cena: ser disputado pela nata dos Obás de Xangô do Opô Afonjá é motivo de orgulho! E o único registro fotográfico que tenho com o velho “Camafa” foi na minha confirmação, onde me tornei otun Obá Abiodun – o suplente do velho Sinval da Costa Lima.

Aos 78 anos, no ano de 1994 (eu tinha 14 anos), o velho Camafeu de Oxossi, partiu para o Orun, se tornando – assim, personagem icônica das histórias de Salvador, aos olhos de Jorge Amado e daqueles que estiveram ao seu lado.

Salve Camafeu de Oxossi. 


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