40% da população baiana esta inadimplente, diz Serasa

Falta de educação financeira e baixa renda estão entre as causas

Por Inara Almeida
Ás

Atualizado
40% da população baiana esta inadimplente, diz Serasa

Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

“Ia passando o cartão, comprando e, quando vi, já era uma grande bola de neve que eu não conseguia pagar". O relato de Antônio Souza (nome fictício) não é um caso isolado: só na Bahia, 40% da população adulta está inadimplente, de acordo com a última pesquisa do Serasa. Ainda segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) feita pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), em novembro, a inadimplência registrada no mês atinge 29,4% das famílias brasileiras - a maior desde outubro de 2023 - enquanto o endividamento atingiu o patamar de 77%.

Antônio conseguiu se livrar não só da inadimplência, há cinco anos, mas do velho hábito de comprar itens desnecessários e por impulso. "Consegui negociar a minha dívida no próprio aplicativo do banco e graças a Deus, porque ficar com o nome sujo é muito ruim.  Aprendi que não dá para gastar R$ 2 mil se você ganha R$ 1 mil. Estou bem mais esperto”, disse.

O economista da CNC, Fabio Bentes, chamou atenção para a dificuldade das famílias brasileiras em equilibrar o orçamento mesmo diante de um mercado de trabalho com bons números - a taxa de desemprego ficou em 6,2% em outubro, a menor da série histórica. 

“Os gastos com serviços têm crescido, isso em uma perspectiva histórica tanto no Brasil quanto em outros países. Mas uma preocupação recente da CNC tem sido os gastos com serviços de aposta. Isso tem pressionado o orçamento das famílias brasileiras. Há um avanço tanto das famílias com contas em atraso quanto no número de famílias que declaram não ter condições de pagar essas dívidas”, disse Bentes, que também destacou a alta de juros como um fator que contribui para o aumento das taxas de inadimplência.

A CNC projeta que o endividamento continuará crescendo em dezembro, impulsionado pelas compras de Natal, com a inadimplência permanecendo estável, dado o ajuste das famílias ao cenário de juros altos.

As tentativas muitas vezes fracassadas de tentar equilibrar todos os pratos do orçamento familiar levam ao problema da reincidência: há quem não consiga arcar com as dívidas, negocie, limpe o nome e, então, faça novas dívidas que não consegue pagar. Para muita gente, inclusive, essa situação torna-se um ciclo vicioso. Segundo Thiago Ramos, coordenador do Serasa, apesar de não existirem dados concretos sobre a taxa de reincidência dos devedores, a empresa reconhece que é um problema.

“Lançamos nesse feirão do Serasa uma melhoria, pensando nesses casos de reincidência: a possibilidade de o consumidor negociar mais de uma conta em um único boleto, porque alegavam, por exemplo, que ao negociar quatro dívidas, como eram quatro datas diferentes, perdia-se o controle e pagavam juros ou perdiam o acordo. Agora é possível pagar todos em um boleto”, pontuou Thiago.

Perfil dos reincidentes

De acordo com o economista Edval Landulfo, vice-presidente do Corecon-BA (Conselho Regional de Economia da Bahia), há, normalmente, dois motivadores de reincidência: falta de educação financeira e renda limitada.

“Quase 70% dos trabalhadores recebem até dois salários mínimos. Então, podem surgir necessidades e, mesmo sem que haja uma reserva, a pessoa precisará comprar no cartão de crédito. Se as contas já estiverem comprometidas, ela ficará inadimplente até chegar um dinheiro extra, como no caso do décimo terceiro e férias. Há, por outro lado, um outro grupo, de pessoas que até têm uma boa renda, mas são consumistas, compram coisas desnecessariamente, atropelam prioridades e acabam caindo na inadimplência”, explica Edval

Segundo Edval, nos casos em que o problema é o descontrole na gestão das finanças, o remédio deve ser a educação financeira. O economista chama atenção ainda para a importância da organização do orçamento diante das ações cada vez mais digitalizadas. “Em outros tempos, o dinheiro estava ali em mãos, você via quando ele saía da carteira. Agora, com as carteiras digitais e contas correntes, no caso do décimo terceiro, por exemplo, você vê a conta ‘gordinha’, mas vai fazendo pequenos pagamentos e nem percebe, porque não costuma haver um acompanhamento diário ou semanal”, aponta.

Para Thiago Ramos, a ausência de educação financeira na grade curricular das escolas públicas e privadas e o tabu entre as famílias são fatores que aumentam os riscos de atrasos de contas. O coordenador do Serasa destaca ainda o problema com cartões de crédito, destacado na última pesquisa da empresa: em outubro, as dívidas com bancos e cartões de crédito foram responsáveis por 27,86% das dívidas da população inadimplente.

"A Serasa realizou uma pesquisa que perguntou para os consumidores quantos cartões de crédito eles tinham. Mais da metade dos entrevistados possuíam três cartões ou mais. E 17% possuíam cinco cartões ou mais. Isso foi uma pesquisa realizada em todo o país. E aí, você já percebe que é difícil, já em uma situação de risco, o consumidor ter três ou cinco cartões de crédito. Existem muitas pessoas nessa situação. Quando nós perguntamos o porquê eles tinham tantos cartões, aí entra a falta de educação financeira. A resposta que os consumidores deram foi que eles estavam procurando um limite maior para poder fazer contas. Só que, na verdade, o caminho que deveria ser adotado para ter um limite maior é o inverso. Era ele concentrar tudo em um cartão de crédito para que o emissor visse que ele faz bom uso, que ele não atrasa o pagamento", explica.

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