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André Mendonça diz que usuários não devem ser tratados como “delinquente”

O ministro participa da retomada do julgamento sobre porte de maconha para consumo pessoal

Por Da Redação
Ás

Atualizado
André Mendonça diz que usuários não devem ser tratados como “delinquente”

Foto: Carlos Moura/SCO/STF

O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nesta quinta-feira (20) que o usuário de droga não deve ser tratado como delinquente. Ele relatou na retomada do julgamento sobre critérios para distinguir quem é usuário de quem é o traficante. E também sobre descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal. 

Ainda argumentou que o usuário de entorpecentes não deve ser tratado como um delinquentes 

"Estou convicto de que tratar o usuário como um tóxico delinquente não é a melhor política pública de um Estado Social Democrático de Direito", disse.

O julgamento havia sido interrompido em março, quando Toffoli pediu mais tempo para analisar o caso. Ele foi o primeiro a apresentar voto nesta tarde.

O que está sendo analisado 

O presidente Luis Roberto Barroso explicou que o ato de consumo de drogas, mesmo que para uso individual, permanecerá com ato ilícito, ou seja, contrário à lei, independente de qual seja a decisão do Supremo. O que está sendo analisado é se ele será um ato silício de natureza penal ou administrativa. Se o Supremo entender que é um ato ilícito administrativo, não persistirá a punição de prestação de serviços à comunidade.

O ministro Alexandre de Moraes explicou o impacto da falta de um critério para diferenciar usuário de traficante. Deu como exemplo a diferença de tratamento de situações semelhantes.

"Um homem negro, analfabeto, de 18 anos, é considerado traficante com 20g. Alguém com mais de 30 anos, branco, com curso superior, só é considerado traficante em média com 60g. Estamos falando da mesma situação. A polícia chega. Os dois, em tese, podem estar lado a lado. Se os dois estiverem com 20g, só o negro é preso. Isso não é Justiça", argumentou.

"Só a quantidade vem sendo usada, lamentavelmente, como uma forma de discriminação social", completou Moraes.

O ministro Nunes Marques afirmou que a preocupação das famílias é de que a droga não entre em suas casas. Ou seja, não necessariamente apenas a possibilidade de punição.

"Precisamos não perder de vista como devemos colaborar com a sociedade para que a droga não entre na casa dos brasileiros".

Em que pé está a discussão

Foram apresentados oito votos no caso. Já há maioria para que o tribunal estabeleça um critério que diferencie o usuário do traficante, mas ainda não há definição sobre a possibilidade de estabelecer uma quantidade a ser especificada de maconha para uso individual.

Em relação a esse último ponto, o placar está em 5 a 3. São cinco votos para descriminalizar o porte para uso pessoal de uma quantidade desta droga. Se houver mais um voto nesta linha, será formada maioria. Há três votos para manter o entendimento de que a conduta é criminosa.
O julgamento começou em 2015. Uma decisão da Corte terá impacto em pelo menos 6.354 processos, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça.
Porte de maconha: entenda o que está em jogo no STF

Retomada do julgamento

O caso deve voltar à deliberação no plenário com o voto do ministro Dias Toffoli, que havia pedido vista do processo (mais tempo de análise) em março. Mais dois ministros também votam, se não houver nova interrupção.
Devem apresentar seus posicionamentos a ministra Cármen Lúcia e o ministro Luiz Fux.

Efeitos da decisão

O processo tem repercussão geral, ou seja, a decisão tomada pelo tribunal deverá ser aplicada pelas outras instâncias da Justiça em processos com o mesmo tema. Isso vai ocorrer a partir de uma espécie de guia que será elaborado pelos ministros logo após a conclusão da deliberação.

Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, há pelo menos 6.354 processos com casos semelhantes suspensos em instâncias inferiores da Justiça, aguardando uma decisão do tribunal.

O que está em jogo

O tribunal deve decidir se é crime uma pessoa ter consigo drogas para seu próprio consumo. Além disso, deve fixar, em relação a uma ou mais substâncias, a quantidade considerada como de uso individual. A discussão não envolve o tráfico de drogas, conduta punida como crime que vai continuar sendo um delito, com pena de 5 a 20 anos de prisão.

Validade da Lei de Drogas

A Lei de Drogas, de 2006, estabelece, em seu artigo 28, que é crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal.

No entanto, a legislação não fixa uma pena de prisão para a conduta, mas sim sanções como advertência, prestação de serviços à comunidade e aplicação de medidas educativas (estas duas últimas, pelo prazo máximo de 5 meses).

Ou seja, embora seja um delito, a prática não leva o acusado para prisão. Os processos correm em juizados especiais criminais e a condenação não fica registrada nos antecedentes criminais.

Diferenças entre descriminalização, despenalização e legalização

Despenalizar significa substituir uma pena de prisão (que restringe a liberdade) por punições de outra natureza (restrições de direitos, por exemplo).

Legalizar é estabelecer uma série de leis que permitem e regulamentam uma conduta.  Já descriminalizar consiste em deixar de considerar uma ação como crime. Ou seja, em âmbito penal, a punição deixa de existir. Mas é possível ainda aplicar sanções administrativas ou civis.

Placar do julgamento

O julgamento começou em agosto de 2015. Foi interrompido por pedidos de vista, que permitem uma análise mais detalhada do processo. Os votos favoráveis à descriminalização têm em comum a liberação do porte da maconha para usuários, com propostas diferentes quanto à fixação dos critérios para a caracterização do uso pessoal.

Votos dos ministros

Veja como votaram os ministros até aqui e o que cada um estabeleceu de entendimento:

  • Gilmar Mendes (relator)

Inicialmente votou para descriminalizar todas as drogas para consumo próprio. Mas, em agosto do ano passado, reajustou seu voto para contemplar posicionamentos já apresentados por outros ministros. 

  • Edson Fachin

Defendeu que a liberação do porte fique restrita à maconha, mantendo as regras atuais de proibição para as demais drogas.

  • Rosa Weber (já aposentada)

Votou na linha do relator e dos demais ministros. Concluiu que a criminalização da conduta de portar drogas é desproporcional.

  • Luís Roberto Barroso

Entendeu que a descriminalização do porte individual deve se restringir à maconha. Propôs um critério para definir quem seria enquadrado em usuário.

  • Alexandre de Moraes

O ministro propôs que o Supremo fixe o entendimento de que não é crime a conduta de "adquirir, guardar ter em deposito, transportar ou trazer consigo para consumo pessoal" a maconha; será considerado usuário que tiver de 25 a 60 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas.

  • Cristiano Zanin

Votou para não descriminalizar o porte, mesmo para uso pessoal. 

  • André Mendonça

Votou pela validade da Lei de Drogas, que prevê o porte de maconha para consumo próprio como crime.

  • Nunes Marques

Assim como Mendonça, concluiu que a lei deve ser mantida em vigor e que é necessário diferenciar usuário de traficante.
 

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