Campos Neto defende antecipar debate sobre transição na presidência do Banco Central
Economista afirmou que irá fazer uma "transição mais suave possível" para o próximo presidente
Foto: Raphael Ribeiro/BCB
Presidente do Banco Central até 31 de dezembro deste ano, Roberto Campos Neto defendeu nesta quarta-feira (3) que o início do processo sucessório da autarquia aconteça antes do fim do seu mandato.
Segundo a reportagem apurou, o economista pediu ao ministro Fernando Haddad (Fazenda) que o governo federal escolha o próximo presidente do BC entre outubro e novembro, para que haja tempo hábil de o indicado ser sabatinado no Congresso antes do recesso de fim de ano.
"Seria bom fazer a sabatina este ano. Se um diretor for presidente interino, ele tem que passar por sabatina também", disse o economista durante evento do Bradesco BBI em São Paulo. A lei da autonomia do BC, porém, não esclarece os passos do procedimento sucessório.
Campos Neto também afirmou que irá fazer uma "transição mais suave possível" para o próximo presidente, fazendo alusão à passagem do governo Bolsonaro para o governo Lula.
"Essa coisa de você mudar de um governo para outro, onde o governo que entra fala mal do outro e a gente tem uma transição que não é civilizada, é muito ruim. Eu sempre digo que eu prefiro discutir ideias do que pessoas. Então, nesse sentido, eu vou fazer a transição mais suave possível", disse o presidente do BC. A intenção de Campos Neto de discutir antes a sucessão havia sido antecipada pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Especula-se que o próximo presidente do BC será Gabriel Galípolo, hoje diretor de política monetária da autarquia, após atuar como número dois do ministério da Fazenda durante o início do governo Lula 3.
Tido como homem de confiança do presidente da República, Galípolo desperta em parte do mercado financeiro insegurança em relação à trajetória da Selic. O presidente Lula tem feito críticas a Campos Neto, indicado ao cargo por Jair Bolsonaro (PL), por considerar que ele mantém os juros altos desnecessariamente.
Já o BC justifica que a taxa está no nível necessário para conter a inflação.
"O ciclo de política monetária tem uma diferença, ele tem um timing, vamos dizer assim, um prazo diferenciado. O pior problema que a gente pode ter é a inflação, que corrói o poder de compra de quem está lá embaixo. Então, o melhor plano econômico é a inflação baixa", completou Campos Neto, que aproveitou para dar um recado ao seu sucessor.
"A coisa mais importante para quem se senta na cadeira hoje é ter a firmeza de dizer não quando for necessário. E vai ser necessário sempre, em algum momento, porque os ciclos são diferentes, os desejos vão ser diferentes, os entendimentos sobre o que é bom vão ser diferentes. Então é importante ter firmeza de dizer não e explicar para dentro e para fora", disse o economista.
Segundo o presidente do BC, a percepção de risco do mercado financeiro sobre a mudança no comando da autarquia teria caído. "Quando a gente olha o mercado, aquele prêmio de risco que tinha na mudança da gestão diminuiu bastante."
Para o economista, um dos fatores que contribui para esta redução é a unanimidade das últimas decisões do Copom sobre o tamanho no corte da Selic, hoje em 10,75% ao ano.
Para Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, a grande dúvida é se o próximo mandatário atenderá ou não às pressões do governo para uma queda mais acentuada de juros, de modo a impulsionar a economia.
"O que traz certo alívio é que a equipe econômica do governo tem mantido um bom relacionamento com o Banco Central, a meta de inflação foi mantida em 3% de forma contínua e, dentre as últimas indicações, a de Paulo Pichetti, um respeitado acadêmico especializado em inflação, foi bem recebida", diz Sung.
Além da mudança na presidência, o governo também indicará mais dois diretores, levando a maioria do Copom.
"O mais importante é que o BC mantenha sua credibilidade na condução da política monetária para que a inflação continue em direção à meta e os juros sigam em trajetória de queda", completa Sung.
Para Gustavo Corradi Matos, diretor da Medici Asset, a transição no BC levanta dúvidas quanto à política monetária.
"Apesar de o discurso de Galípolo ser em apoio às decisões do Copom, ele é um economista que sempre esteve muito mais alinhado ao PT. O próprio Lula colocou ele lá, e, por vezes, esteve junto da Gleisi Hoffmann, então ele pode ser influenciado muito por uma pressão do governo para a queda na taxa de juros", diz Matos.
Já Camila Abdelmalack, economista-chefe da Veedha Investimentos, não vê um aumento na percepção de risco com a possibilidade de Galípolo ocupar a presidência do BC.
"O nome do Galípolo é algo que o mercado já acomodou desde quando ele foi indicado para a diretoria do BC no ano passado. E, desde quando ele assumiu o posto, ele não tomou nenhuma decisão divergente ou divergiu em algum discurso relacionado à condução da política monetária, o que também acalma bastante o mercado financeiro", diz Camila.