Cláudio Castro enfrenta julgamento de cassação em crise com vice e ameaçado por CPI
CPI foi aberta pela própria base de Castro, na Assembleia Legislativa.
Foto: Felipe de Freitas/Governo do RJ
O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), enfrenta nesta sexta-feira (17) o início do julgamento de cassação de seu mandato ao mesmo tempo em que enfrenta uma CPI aberta por sua própria base na Assembleia Legislativa e a crise com seu vice, Thiago Pampolha (MDB).
Castro estará em missão oficial nos Estados Unidos no momento da sessão do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) em que os processos serão analisados. O julgamento pode não ser concluído nesta sexta, já que há possibilidade de pedido de vista (mais tempo para análise) de 1 dos 7 desembargadores.
O governador é acusado de ter participado da montagem de um esquema para criar 27 mil cargos fantasmas para alocar apadrinhados políticos às vésperas da campanha, driblando regras administrativas e eleitorais. O "estratagema", segundo a Procuradoria Eleitoral, incluía o uso de funcionários fantasmas e de dinheiro vivo.
O chamado escândalo da "folha secreta de pagamento" foi revelado pelo portal UOL em junho de 2022.
Em nota, o governador afirmou que extinguiu os projetos após os relatos de irregularidades e que "não foram apresentados nos autos do processo elementos novos que sustentem as denúncias".
O julgamento ocorre num momento de fragilidade política do governador, que viu a própria base instaurar uma CPI apelidada como "Fim do Mundo" na Assembleia Legislativa.
A comissão foi criada para investigar a falta de transparência do governo estadual. O foco amplo torna qualquer pasta passível de convocação e questionamento. Na primeira reunião do colegiado, na terça-feira (14), a CPI aprovou o envio de ofícios para Rodrigo Abel, chefe de gabinete do governador.
"É uma CPI ampla. A falta de transparência pode acontecer em qualquer secretaria do estado. Temos o poder de convocar, pedir informações a todas as secretarias. Como a imprensa já noticiou, é a CPI do Fim do Mundo", disse o vice-presidente Filipe Poubel (PL).
O presidente da comissão, deputado Alan Lopes (PL), afirma que "não é uma CPI contra o governo, mas a favor do povo".
"Ouvi muito burburinho da imprensa de que o governador pediu para retirar assinatura. O governador não me ligou para retirar o requerimento. Entendo que a CPI não é incômoda. Se o governador souber explorar bem, pode ser benéfica. Depende mais dele do que de nós", disse ele.
A CPI é o auge de uma base que se fragilizou ao longo do mandato de Castro na Assembleia.
As críticas de deputados aliados a secretários do governo provocou até ironia do deputado oposicionista Carlos Minc (PSB), em outubro do ano passado. "A base do governo está fazendo tanta crítica que está querendo tirar espaço da oposição. Como vamos fazer oposição ao governo se a própria base todo dia pede a cabeça de um secretário?", afirmou.
Minc diz que a instalação da CPI é o agravamento de uma queda de braço entre o governador e o presidente da Assembleia, Rodrigo Bacellar (União). Ele é apontado como a voz mais influente sobre Castro --para alguns, com um poder de decisão maior do que o próprio chefe do Palácio Guanabara. A ele é atribuída a queda e nomeação de secretários, bem como a recente crise entre o chefe do Executivo e seu vice.
"É uma crise muito profunda entre eles [Castro e Bacellar]. Não é ideológica, nem por um ou outro cargo. A CPI sobe para outro patamar, porque visivelmente foi uma coisa do Bacellar. Colocou alguém dele para ser relator", afirmou Minc, em referência ao deputado Rodrigo Amorim (União Brasil).
O deputado do PSB diz ser um cenário com algumas semelhanças com o enfrentado pelo ex-governador Wilson Witzel antes do impeachment. Contudo, avalia que Bacellar não pode se desvincular de Castro, já que também é alvo da ação no TRE-RJ.
"O Witzel não tinha partido, não tinha base. Agora tem, mas a base é muito mais do Bacellar do que do Cláudio Castro."
Outra medida da CPI foi o envio de ofícios para a Secretaria do Ambiente, que era comandada por Thiago Pampolha até março. Na Assembleia, a medida foi vista como uma forma de também sinalizar a Castro, rompido com o vice.
"É uma secretaria com contratos milionários. A notificação tem a ver com contratos obscuros, ONGs em que a transparência é muito ruim", disse Lopes.
Castro rompeu com Pampolha após o vice comunicar sua migração da União Brasil para o MDB, em janeiro. A mudança de partido já era prevista, mas o momento em que ela foi feita gerou mal-estar no Palácio Guanabara. A migração ocorreu semanas depois de o STJ (Superior Tribunal de Justiça) avançar nas investigações contra Castro.
Também foi mal visto o fato de os principais articuladores da mudança serem membros da ala do MDB mais próxima a Lula (PT), como o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB). Castro é aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O clima entre os dois voltou a pesar após o MDB peticionar na ação na Justiça Eleitoral pedindo que Pampolha, também réu no processo, tomasse posse em caso de cassação de Castro. A sigla alegou que o vice só foi incluído na acusação em razão do cargo, já que não há qualquer prova contra ele nos autos.
Após o mal-estar, o partido pediu a desconsideração da petição. A Procuradoria Eleitoral, porém, seguiu em parte o pedido em sua alegação final. Pediu que Pampolha fosse cassado porque integrava a chapa vencedora acusada de abuso de poder político e econômico. Contudo, defendeu que o vice não seja punido com a inelegibilidade como propôs em relação aos demais acusados.
As duas ações a serem analisadas pelo TRE foram propostas uma pela Procuradoria Eleitoral e outra pela chapa do candidato derrotado na eleição, Marcelo Freixo (PT). Elas serão analisadas conjuntamente e têm, somadas, 13 réus. Além de Castro, Bacellar e Pampolha, estão entre os acusados dois deputados federais, dois estaduais e três secretários.