Diretores do MAM e do IPAC se reúnem com moradores do Solar do Unhão após acusação de racismo
“Daqui não sairemos e que resistiremos até o último momento”, diz texto divulgado pelos moradores
Foto: Reprodução / Associação de moradores do Solar do Unhão
Os diretores do MAM, Pola Ribeiro, e do IPAC (Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia), João Carlos Oliveira, se reúnem com moradores da comunidade Solar do Unhão, vizinha do museu, nesta terça-feira (17), às 12h, um dia após a Associação de Moradores do bairro, o Museu Street Art Salvador (MUSAS) e o Coletivo de Entidades Negras (CEN) divulgarem publicamente manifesto crítico à atual gestão do equipamento cultural por causa dos desrespeitos à comunidade.
A reunião, provocada a pedido dos diretores, por intermediação do IPAC, acontecerá na pista de acesso ao Solar do Unhão, entre o MAM e a comunidade, e tratará das reivindicações dos moradores. Entre elas, está a reforma de escada de acesso à praia das pedras; a liberação do acesso de ambulantes e moradores à Prainha (faixa de areia dentro do museu) por meio do Parque das Esculturas; a construção de uma quadra esportiva em área não tombada entre o museu e a comunidade; a pintura do muro de acesso ao bairro; entre outras questões do dia a dia do território, relacionadas, por exemplo, a capacitação e empregabilidade local.
Os moradores do Solar do Unhão programavam manifestação para 13h, durante a reabertura do museu, que acontece nesta terça-feira após oito anos de obras e um investimento total de R$ 30 milhões. O protesto aconteceria após o diálogo com o MAM ser interrompido de forma desrespeitosa, devido a destratos praticados pelo diretor do museu com lideranças da comunidade e desprezo às pautas apresentadas pelos moradores nas mesas de negociação.
Em manifesto divulgado nesta segunda-feira (16), os representantes comunitários chamaram a gestão do museu de "racista", apontando inclusive a instalação de arames farpados nos muros que separam o equipamento do Solar.
De acordo com as lideranças, a forma de tratamento do atual diretor do MAM, Pola Ribeiro, e de outros gestores anteriores com a comunidade desrespeita tratados e legislações internacionais às quais o Brasil se submete e que preconizam a interação social do patrimônio com o entorno.
É o exemplo das orientações da UNESCO, que determinam, desde a XV Assembleia Geral de Icomos, corrida em 2005, em Xi’An, na China, nesse sentido. A mesma regra também está prevista na primeira parte do artigo 7º da Carta de Veneza e, pior ainda, na própria concepção de Lina Bo Bardi, a arquiteta ítalo-brasileira que idealizou o MAM e tantos outros equipamentos culturais do Brasil. “Lina Bo Bardi está do nosso lado. Eles que estão do outro”, diz manifesto dos moradores, que circulou nas redes sociais.
No texto, o museu é classificado como “referência opressora e imperialista para o povo que vive com tanta dificuldade na comunidade”.
O sonhado espaço esportivo da comunidade já havia sido garantido por meio de Emenda Parlamentar do deputado federal Valmir Assunção, que disponibilizará o valor, mas a Direção do MAM resistia, até ontem, à ideia da instalação do espaço de, dizendo que era contra o equipamento de lazer. A posição, além de elitista, ia de encontro a todas as defesas conceituais feitas pela arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi, responsável por projetar diversas unidades do SESC pelo Brasil, com o objetivo se que esses fossem espaços justamente de interação de arte, cultura, lazer e esporte.
O tratamento é diferente para as elites, contudo, que ganharam um píer e um atracadouro para estacionar suas lanchas. “O MAM acredita que é preciso píer e casarão para as elites, mas que não é necessário garantir o esporte e o lazer da comunidade do Solar do Unhão”, também consta no manifesto dos moradores.
Eles também apontam que, apesar do bloqueio da Prainha pelo MAM para acesso dos moradores, a faixa de areia segue cheia durante os finais de semana, ocupada pela elite que estaciona por lá com suas lanchas. A elitização do museu vai em rota de colisão com tudo que foi defendido pela sua idealizadora.
“Não somos dignos, para eles, de circular pelo Parque de Esculturas. Devem achar que não sabemos quem são aqueles renomados e empolados artistas. Nos olham nos medindo da cabeça aos pés. Mas mal sabem eles quem somos. E que daqui não sairemos e que resistiremos até o último momento. Não topamos museu racista, não topamos uma elite que nos odeia! Somos defensores da cultura de um povo. Lina Bo Bardi está do nosso lado. Eles que estão do outro”, diz o texto divulgado pelos moradores.