Em um ano, transporte público de Salvador foi interrompido mais de 80 vezes devido à insegurança
Segundo levantamento, região da Vila Verde, em Mussurunga, foi a mais afetada
Foto: Bruno Concha / Secom PMS
O serviço de transporte público em Salvador foi interrompido mais de 80 vezes durante um ano, devido questões relacionadas à segurança pública. Os dados foram reunidos pelo levantamento Catraca Racial, feito em parceria pela Iniciativa Negra Por Uma Nova Política Sobre Drogas, Instituto Fogo Cruzado e Observatório da Mobilidade Urbana de Salvador.
Entre os meses de agosto de 2023 e 2024, os ônibus deixaram de circular em 30 localidades da capital baiana, por 85 vezes, ao todo. Somente 15 tiveram o tempo de interrupção detalhado, o que representou 316 horas, equivalente a 13 dias seguidos sem o serviço.
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Ao longo do ano, Salvador teve 69 dias com interrupções do transporte. O bairro mais afetado foi Mussurunga, na localidade de Villa Verde, com 14 pausas, seguido de Fazenda Coutos e Valéria (8), Pernambués (6), Águas Claras (5), Nordeste de Amaralina e Federação (4). [Confira a lista completa de bairros afetados no final da matéria]
Devido o recorte de período, o levantamento não contabilizou as interrupções no Bairro da Paz, localidade que foi massivamente afetada pelos conflitos no final de 2024. Somente nos meses de outubro e novembro, os ônibus ficaram pelo menos 13 dias sem circular.
Em entrevista ao Farol da Bahia, o pesquisador de mobilidade urbana, Daniel Caribé, ressaltou que a população afetada com os cortes do serviço é majoritariamente negra e localizada geograficamente nas áreas mais periféricas da cidade.
“Isso não acontece em bairros mais centrais. Por exemplo, teve um conflito pesado na Barra, na comunidade do Alto das Pombas, e o serviço de ônibus não foi interrompido na Barra, nem na Graça. Se a comunidade está perto de comunidades consideradas nobres, o esquema é um. Mas se são bairros que não têm o privilegio dessa proximidade, perdem o serviço sem nenhum pudor”
População afetada
Mesmo sem ônibus, as vidas dos moradores dessas regiões não param. Ainda é preciso se locomover até a escola, trabalho, e, para isso, longas caminhadas são feitas. Em entrevista ao Farol da Bahia, uma moradora de Vila Verde, que preferiu não se identificar, contou que precisa andar cerca de 1,5 km para conseguir cumprir a rotina.
“É muito difícil, mas virou costume. Se ônibus não entra [no bairro] eu já sei que vou precisar acordar duas horas antes para sair para trabalhar. Levo sempre uma blusa reserva porque a gente sua, né? Sem contar que já chego no serviço cansada”, desabafou.
Em maio deste ano, a comunidade, que fica às margens da Avenida Aliomar Baleeiro, conhecida popularmente como "Estrada Velha", foi ocupada pela polícia após longos conflitos entre facções. Diversos moradores deixaram as casas. Os que permaneceram tiveram que conviver com os percalços.
“A gente precisa pensar, quando você corta uma linha, quais são os impactos na vida dessa população? Por que o serviço de ônibus é o último a retornar? A gente tem muito relatos de bairros que não estão mais conflitos deflagrados, tem um conflito pela manhã, a vida volta ao normal, mas os ônibus continuam sem circular. Isso rouba tempo de vida e tira o acesso a outros direitos, como educação, saúde, lazer e trabalho”, analisou Daniel.
O que diz a prefeitura
Ao estudo, a Prefeitura de Salvador informou que as operações são suspensas quando há ameaças iminentes que comprometam a segurança dos passageiros e operadores dos sistemas.
“A Coordenadoria de Fiscalizaçãoe AdministraçãodeTransporte (Cofat), acompanha e autoriza a suspensão do atendimento do transporte público vias olicitação por parte das empresas de ônibus e do sindicato dos rodoviários nas localidades afetadas, retomando logo que exista po meio dos entes da segurança pública A validação e certeza de retorno normalidade da operação".
Confira a lista com os 30 bairros afetados
Mussurunga - 14 vezes
Fazenda Coutos e Valéria - 8 vezes cada
Pernambués - 6 vezes
Águas Claras - 5 vezes
Nordeste de Amaralina e Engenho Velho da Federação - 4 vezes cada
Beiru/Tancredo Neves e Mirantes de Periperi - 3 vezes cada
Boa Vista de São Caetano, Santa Cruz, Santa Mônica, Narandiba, Pirajá, Engomadeira e IAPI - 2 vezes cada
Alto das Pombas, Fazenda Grande do Retiro, São Caetano, Conjunto Pirajá, Paripe, Periperi, Capelinha, Castelo Branco, São João do Cabrito/Plataforma, Barragem de Ipitanga, San Martin, Ilha Amarela, Jardim Nova Esperança, Barreiras, Cajazeiras e Arenoso - 1 vez cada