Governo Lula compra apenas livros de português e matemática para o ensino básico
A compra é responsabilidade do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) órgão ligado ao MEC

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
O Brasil pode sofrer um apagão de livros didáticos em 2026. Por falta de verba, o governo Lula (PT) ainda não adquiriu os aproximadamente 240 milhões de exemplares necessários para o próximo ano letivo.
A situação é pior na etapa inicial do ensino fundamental (do 1° ao 5° ano), para a qual foram compradas apenas obras de português e matemática, ficando de lado as de história, geografia, ciências e artes. Ensino médio, EJA (Educação de Jovens e Adultos) e programas literários também são atingidos.
Esse material é distribuído para as escolas por meio do PNLD (Programa Nacional do Livro Didático). A compra é responsabilidade do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) órgão ligado ao MEC (Ministério da Educação).
À reportagem, o FNDE diz que "considerando o cenário orçamentário desafiador e a importância inequívoca de manutenção do PNLD para a educação pública do Brasil", adotou a compra escalonada como estratégia para o ensino fundamental, começando pelas áreas de língua portuguesa e matemática e complementado posteriormente com obras das demais áreas.
"As compras para a EJA, cuja licitação está em fase final, estão garantidas. As estratégias para o ensino médio serão definidas na sequência", diz o órgão.
O montante para a compra desses livros é estimado em cerca de R$ 3,5 bilhões. O programa, no entanto, tem um orçamento de 2,04 bilhões. Ou seja, para o governo conseguir adquirir tudo o que era previsto seria necessário um aporte de mais R$ 1,5 bilhão. O PNLD sofre reduções orçamentárias desde 2022, quando teve uma dotação de R$ 2,58 bilhões.
Parte dos 240 milhões de obras necessárias deveria ter sido entregue às escolas públicas em 2022, 2023 e 2024, mas o cronograma de compras foi adiado. Segundo a AbraLivro (Associação Brasileira do Livro), a situação nunca foi tão crítica.
O CENÁRIO
Para os anos iniciais do ensino fundamental, era prevista a compra de cerca de 59 milhões de livros didáticos neste ano, considerando todas as disciplinas. No entanto, foram solicitados somente os livros de português e matemática cerca de 23 milhões.
As disciplinas de história, geografia e ciências, do 1º ao 3º ano, e de artes, do 1º ao 5º ano, são compostas de livros consumíveis, as chamadas apostilas. Nada foi adquirido.
Para os anos finais do fundamental, 6° ao 9°, eram previstos cerca de 12 milhões exemplares, considerando todas as matérias. Por enquanto, só os de português e matemática estão garantidos, cerca de 3 milhões.
"É realmente muito preocupante, diz José Ângelo Xavier de Oliveira, presidente da AbraLivros. "A escola pública é a maior ferramenta de ascensão social que temos. Não podemos tratá-la de qualquer maneira", segue.
O problema se estende ao ensino médio. Está prevista a compra de cerca de 84 milhões de exemplares com materiais totalmente reformulados e adequados às diretrizes após reforma. É previsto que a demanda seja atendida parcialmente.
No EJA, são estimados pelo entre 7 e 10 milhões de exemplares, ainda não encomendados.
Também há um pleito por obras literárias. São cerca de 30 milhões que deveriam ter sido adquiridas em 2023 e mais de 10 milhões não compradas em 2024.
A situação precisa ser resolvida logo, diz José Ângelo. Caso o MEC não faça a encomenda deste material até agosto, dificilmente as editoras conseguirão entregá-lo a tempo, afirma, "e os problemas ficarão com as redes de educação e com os professores".
Os autores também estão preocupados. Sem a compra de seu trabalho, eles temem não receber em 2026.
Em carta ao ministro da Educação, Camilo Santana, a Abrale (Associação Brasileira dos Autores de Livros Educativos) disse que adquirir somente livros de língua portuguesa e matemática representa um grave retrocesso.
"A decisão é inaceitável e pode levar o PNLD a um ponto de não retorno para a educação pública de qualidade. Em um cenário em que plataformas, produtos digitais e impressos desprovidos de avaliação são adquiridos por entes federados, questionamos: para onde caminha a educação pública brasileira?", escreveu Maria Cecília Condeixa, presidente da associação.
Ela afirmou à reportagem que qualquer problema no programa de livros didáticos pode ter um efeito catastrófico. "Gostaria que isso fosse olhado com mais carinho pela sociedade e pelos políticos. As despesas em educação precisam ter maior previsibilidade e segurança."
COMO FUNCIONA O PROGRAMA NACIONAL DO LIVRO DIDÁTICO
O PNLD é destinado a avaliar e a disponibilizar obras didáticas, pedagógicas e literárias, de forma sistemática, regular e gratuita, às escolas públicas de educação básica das redes federal, estaduais, municipais e distrital.
A seleção dos livros a serem distribuídos é de responsabilidade do MEC. Porém, compra e distribuição dos materiais ficam a cargo do FNDE, cabendo ao órgão também a logística do provimento e do remanejamento dos materiais didáticos para todas as escolas públicas do país cadastradas no censo escolar.