"Isolamento social é alternativa de excelência nos países com equidade social, nos demais é extremamente hipócrita", diz José Tavares
Nessa pandemia, o eficaz é a regular lavagem das mãos

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A chegada do novo corononavírus no Brasil e no mundo tem causado preocupação de diversas ordens na vida da população. Hábitos precisaram ser modificados, rotinas e acima de tudo cuidados para que menos pessoas sejam contaminadas. O Farol da Bahia fez uma entrevista exclusiva com o médico José Tavares Neto, professor titular da Faculdade de Medicina da Bahia (FMB) da Universidade Federal da Bahia, a fim de esclarecer algumas questões científicas e até mesmo dirimir alguns mitos criados diante de um cenário de preocupação.
Tavares contextualizou o conhecimento do vírus desde a década de 1960 e procurou elucidar as formas de tratamento, as práticas de higiene que se deve ter além de reforçar o uso da cloroquina como uma das formas de tratamento.
Farol da Bahia: O mundo científico já conhece este vírus que causa a Covid-19, porém a doença tem assustado. O que é mais preocupante do ponto de vista clínico no tratamento da doença?
José Tavares: Os vírus da família Coronaviridae são conhecidos desde 1965 e, atualmente, tem quatro gêneros e um desses, o Betacoronavirus, tem três linhagens: A, B e C. Das linhagens B e C há vírus que já acometem seres humanos: do B, o responsável pela gripe chinesa (CoNViD-19) classificado como SARS-CoV-2; e da linhagem C, o vírus MERS-CoV responsável, em 2012, pela Síndrome Respiratória do Oriente Médio. De modo geral, os vírus da família Coronaviridae circulam entre animais silvestres e, no caso desse último vírus chinês, o SARS-CoV-2, o ciclo biológico natural ainda não foi integralmente elucidado.
Esse preâmbulo introdutório para destacar que esse novo betacoronavírus, da linhagem C (SARS-CoV-2) tem característica similar a quase totalidade dos microrganismos agentes de doenças: a grande maioria das pessoas infectadas tem formas clínicas imperceptível (assintomática) ou de baixa morbidade com curta duração (oligossintomática); no caso dos infectados pelo novo vírus chinês (SARS-CoV-2) aproximadamente 86% das pessoas têm as formas clínicas assintomática ou oligossintomática, como descreveram Li & Colaboradores na revista Science (vol. 368, 2020); todavia, aqueles outros 14% infectados e que adquirem a forma clínica têm espectro clínico variável: leve, moderado e grave; e, esses últimos, com a forma grave, desenvolvem quadro tromboembólico, comprometimento da molécula da hemoglobina, lesões moleculares, entre outros comprometimentos sistêmicos também relacionados as prévias doenças da pessoa acometida, também denominadas de comorbidades. Ou seja, o mais preocupante do paciente com estado grave da gripe chinesa (CoViD-19) é o comprometimento multisistêmico, como evidencia o estudo de Sanders & Colaboradores publicados noutra prestigiada revista científica JAMA (de 13 de abril de 2020).
FB: Em relação à higienização, quais os métodos realmente eficazes e o que é exagero? Se alguém for a uma padaria que fica a 100 metros da sua residência, por exemplo, ao retornar precisa colocar a roupa para lavar?
JT: Preliminarmente, é necessário considerar a ampla heterogeneidade da população do Brasil; entre várias peculiaridades: aproximadamente 38% da população vivem em domicílios com quatro (4) ou mais moradores (PNAD/IBGE); menos da metade da população vive em cidade ou região sem tratamento de esgoto (dados de Araújo & Bertussi de 2018, publicado pelo IPEA); pouco mais de dois terços (77%) são analfabetos ou analfabetos funcionais (Fundação Paulo Montenegro, 2018); as diferenças regionais com diferentes naturezas, etc., etc., sem desconsiderar o grande contingente de pessoas com gravíssima precariedade econômica, com todas as características relacionadas à pobreza.
Assim, o início é: bem educar sobre o que é higienização, a começar pela adequada lavagem das mãos e a higiene pessoal. Nessa pandemia, o eficaz é a regular lavagem das mãos e dos antebraços, especialmente após contatos com objetos; não levar as mãos à boca; uso do álcool gel 70%, notadamente quando não for possível a lavagem das mãos; uso de máscara do tipo N95, PPF-2 ou do tipo cirúrgico (com as observações especificas para o tempo de uso de cada tipo); não obstante, pelas características da população, a grande maioria não tem condições de compra do uso das máscaras, acima especificadas, e mesmo a fabricação de máscaras caseiras confeccionadas com tecido de dupla face, de algodão, tricoline, por exemplo, e que seja de EXCLUSIVO uso individual - também por isso, cada pessoa deve ter no mínimo duas (2) máscaras e, se houver trabalho externo, idealmente, quatro máscaras para troca a cada 6h no máximo. Após o período de uso deve ser lavda com água corrente, sabão e, se possível, com imersão de 5 a 10 minutos em água com hipoclorito. Durante o processo de secagem, cada máscara deve ser individualizada.
Por outro lado, parece exagero o uso de luvas, nos ambientes fora de unidades de saúde, pois a maioria das pessoas as usa de modo inadequado e falsa proteção aumenta as chances de auto-exposição a objetos contaminados pelo vírus chinês SARS-CoV-2.
Nem todas as pessoas têm condições ou recursos para lavar toda roupa, quando de uso externo ao domicílio, como aquela usada numa ida à padaria, ao mercadinho, etc. Nessa condição, a roupa deve ser colocada em local e ambiente, preferencialmente externo, e que possa ficar exposta ao sol ao menos durante 30 minutos; se não possível, deixar em ambiente arejado. Nem todas as famílias dispõem de condições de usar ferro elétrico. O banho deve ser diário, mas, se houver saída ao ambiente externo, esse banho deve ser logo após o retorno ao domicílio.
FB: O isolamento social é, de fato, a melhor solução para conter a disseminação?
JT: A melhor e mais efetiva solução é a vacina, mas essa ainda é medida só esperada daqui a 12 a 18 meses.
Quanto ao isolamento social é alternativa de excelência ou mais exequível nos países com equidade social, nos demais é extremamente hipócrita; pois, é possível às pessoas das classes média (com proventos ainda garantidos ou rentistas), rica, muito rica e multimilionário; todavia, mera falácia, entre aquelas famílias que residem em cubículos, sem saneamento básico, etc. Ademais, como posto no Brasil, a geração de desemprego irá criar, em escala exponencial, mais fome e mortes à desnutrição associada.
Infelizmente, mesmo com decreto de emergência, de 4 de fevereiro, a quase totalidade dos governadores e prefeitos optaram pelo carnaval quando recebemos inúmeros turistas estrangeiros, muitos de áreas com circulação do vírus chinês, além de chineses nas férias do Ano Novo Lunar (de 15 de janeiro a 15 de fevereiro). Ou seja, numa paráfrase do ditado da nossa cultura popular: “só foi fechada a porta, depois do ingresso do vírus”. Agora, ao meu juízo, a “Inês é morta” e é impensável, além de insustentável à pobreza, manter esse isolamento por mais tempo.
FB: O senhor poderia esclarecer alguns mitos que se criam em relação a como se prevenir da Covid-19? Pode-se afirmar que toda pandemia viral tem duração média de 13 semanas?
JT: Passados mais de 167 anos, da epidemia de cólera na cidade do Salvador, a releitura do primoroso livro “A morte é uma festa: rituais ...”, de João José Reis, nos leva a ter consciência o quanto a humanidade é sujeita a mitos, muitos decorrentes do elevado grau de ignorância. Portanto, qualquer epidemia, desde a peste no Século XIII, carreia mitos, crendices e até asnices. Nesse sentido, para mais reforçar, noutro livro “A Peste”, esse de Albert Camus, tem-se ainda mais ideia da fragilidade humana frente o dessabido, especialmente quando muitas perguntas ainda não têm respostas seguras.
Esse número mágico de “13 semanas” começou por ocasião da epidemia de cólera em Londres, por volta de 1839, brilhantemente esclarecida (quando ainda era desconhecido o agente etiológico, a bactéria Vibrio cholerae), pelo médico John Snow, pois coincidia com o período que não mais existiam pessoas susceptíveis; ou seja, as pessoas que restavam eram aquelas sobreviventes ou “resistentes” por algum mecanismo à doença.
Na atualidade, na estimativa de duração de duração é multifatorial e considera-se, entre muitos outros critérios: Rzero do agente infeccioso[1]; condições ambientais[2]; características da população; e capacidade do sistema de saúde.
FB: O senhor poderia dar dicas de prevenção para aqueles que têm sintomas leves e qual o momento correto de recorrer à uma unidade hospitalar?
JT: Como já comentado anteriormente, é muito provável que a maioria nem saberá que foi infectada pelo vírus chinês, e só saberá se for pesquisado no sangue proteína (imunoglobulina) chamada IgG anti-vírus, pois tiveram uma das formas clínicas, sem queixas ou muito discreta, respectivamente assintomática ou oligosintomática; isso num estudo epidemiológico coordenado por instituição governamental ou de pesquisa ou ainda, se houver justificativa, exame solicitado pelo médico.
Nesse momento, deve-se evitar a busca de unidades de saúde sem prévia avaliação, pois a aglomeração de pessoas aumenta o risco de infecção.
O Ministério da Saúde, via whatsapp, disponibilizou o número (61) 9938-0031 para esclarecimentos, bem como as Secretarias da Saúde dos Estados e Distrito Federal, bem como dos maiores municípios do País.
Os sinais de alerta para busca desse auxílio à distância, como triagem preliminar, são: febre (sem outra causa aparente), coriza, dor de garganta, tosse seca e falta de ar (esses dois últimos são sinais de alerta, mais urgentes; e se houver dificuldade de comunicação deve logo ser buscada a unidade de referência da cidade ou região).
FB: Há algum medicamento promissor para a Covid 19? A Hidroxicloroquina é realmente um medicamento importante para o tratamento da doença e deve ser usada apenas para estados grave mesmo?
JT: Na História da Medicina, a quase totalidade das novas doenças tiveram os iniciais tratamentos baseados em relatos de casos, muitas vezes isolados ou casuais; depois em séries de casos; e, mais adiante, foram realizados ensaios clínicos de maior acurácia.
Desse modo, as evidências da sensibilidade in vitro do coronavírus à cloroquina e ao derivado (hidroxicloroquina) desde o ano de 2005; os recentes relatos de caso e de séries de casos do Prof. Didier Raoult (Marselha, França), entre outros no Brasil e no exterior, reforçam as evidências dos benefícios da hidroxicloroquina associada à azitromicina (quimioterápico antiinfeccioso), entre outros medicamentos em teste, recentemente revistos por Sandro Rosa e Wilson Santos na Revista Panamericana de la Salud Publica volume 44, página e40, de 2020.
Como é imprevisível a evolução dum caso de gripe chinesa, especialmente nos maiores de 60 anos de idade ou numa pessoa portadora de doença crônica grave, parece-me bastante irracional e também amoral deixar de iniciar precocemente o esquema terapêutico, o qual atualmente mais consensual é: hidroxicloroquina mais azitromicina, com as medidas associadas dependentes de cada caso clínico.
FB: É correto o protocolo estabelecido pelo ministério da saúde? E em relação as vacinas, algum horizonte para se tê-la?
JT: Pelo exposto acima, discordo do atual protocolo do Ministério da Saúde. Parte da produção de novas vacinas envolvem segredos industriais e científicos, mas, considerando algumas evidências descritas em revistas especializadas, parece-me, S. M. J., ser a vacina produzida em Israel a mais promissora e de mais rápida aplicabilidade em larga escala. Por outro lado, e quase nada se comenta, o Estado de Israel tem a menor taxa de letalidade e também a menor mortalidade por um (1) milhão de habitantes decorrente da gripe chinesa.
[1]Número de pessoas infectadas em contato com um (1) infectado, no caso do vírus chinês é de 1 : @2,4 – em comparação o vírus do sarampo de 1 : 15.; e da bactéria da tuberculose de 1 : @ 1,3.
[1]Os coronavírus, por exemplo, são termolábeis às temperaturas ambientes >27°C.