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Lei de Cotas completa dez anos em busca de reparação histórica da população negra e indígena

Em entrevista, defensora afirma que país ainda não alcançou índices necessários

Por Ane Catarine Lima
Ás

Lei de Cotas completa dez anos em busca de reparação histórica da população negra e indígena

Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Após a abolição da escravatura, em 13 de maio de 1888, propagou-se no Brasil a ideia da existência de uma democracia racial. No entanto, pesquisas mostram que a ocupação de lugares de destaque dentro do mercado de trabalho e o acesso ao ensino superior é desigual no país quando se compara a população negra, indígena e branca. As discrepâncias causadas por mais de 300 anos de escravidão tentam ser reparadas dentro de uma sociedade por meio de ações afirmativas. A Lei de Cotas, por exemplo, completa neste mês de agosto uma década em busca de reparação no país. 

Um levantamento feito pelo site Quero Bolsa, com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que, entre 2010 e 2019, o número de alunos negros no ensino superior cresceu quase 400% no Brasil. Além da população negra, que é composta por pretos e pardos, indígenas, deficientes e alunos de escolas públicas também são assistidos pela política de cotas.

Em entrevista ao Farol da Bahia, a defensora pública Jamara Saldanha afirmou que o avanço proporcionado pela lei nos últimos anos tem permitido a inclusão de negros e indígenas em cursos que antes tinham predominância de pessoas brancas como, por exemplo, os de licenciatura, direito e medicina. Além disso, ela reforçou a importância da política para corrigir disparidades históricas causadas pela escravidão.  

“A Lei 12.711 de agosto de 2012, mais conhecida como Lei de Cotas, foi instituída no âmbito federal. Antes da previsão da lei federal, no entanto, algumas universidades estaduais já tinham implementado a reserva de vagas em decorrência de uma luta dos movimentos sociais, principalmente os que eram encabeçados pelas pessoas negras. É um luta do movimento social negro para reparar um dano histórico. Isso porque o Brasil viveu um período de escravização, onde os negros foram retirados da África, trazidos para o país a força e aqui escravizados”, disse a defensora.

“Após a abolição da escravatura, as pessoas que foram libertas não tiveram acesso a direitos. Naquele momento, não houve uma política de reparação social. Em decorrência dessa não reparação social lá em 1800, as populações negra e indígena foram afetadas. Antes dos negros, os portugueses exploraram a mão de obra indígena. O movimento negro lutou pelas cotas raciais como uma forma de reparação social. Ao longo da história do Brasil esses grupos de pessoas não tiveram acesso à educação. Essa reserva de vagas na universidade pública é conhecida como ação afirmativa”, completou. 

No geral, a lei de cotas prevê que 50% das vagas em universidades e institutos federais sejam direcionadas para pessoas que estudaram em escolas públicas. Desse total, metade é destinada à população com renda familiar de até 1,5 salário mínimo per capita. A distribuição das vagas da cota racial e deficiência é feita de acordo com a proporção de indígenas, negros, pardos e pessoas com deficiência da unidade onde está situada a universidade, de acordo com o IBGE.

Alguns estados têm criado as próprias ações afirmativas para inclusão de outras categorias, como quilombolas e pessoas transgênero. De acordo com Saldanha, a implementação da lei possibilitou que o perfil das universidades se tornasse mais diverso. 

“Além de negros, indígenas e pessoas com deficiência, algumas instituições já ampliaram essa política de cotas para trans. Dessa forma, a educação é ampliada para pessoas que não tinham acesso”, afirmou Saldanha. “Ao longo desses dez anos, é possível ver que houve um avanço. Hoje temos muito mais diversidade dentro da universidade e isso é reflexo da política de cotas”, continuou.

Revisão da lei 

Dez anos após sanção, a Lei de Cotas deve passar por uma avaliação. Com isso, o debate sobre a reserva de vagas para negros e indígenas em universidades estão cada vez mais frequentes no dia a dia.  Ainda em entrevista, a defensora Jamara Saldanha explicou que a revisão é legal e está prevista.

“Dentro da própria lei tem uma previsão legal para que seja feita uma revisão em dez anos. A ação afirmativa é uma medida especial e temporária. A gente não quer que a ação afirmativa seja eterna.  Afinal, a ideia é que essa política mude uma realidade social. Mudando, não há mais necessidade. No Brasil, ainda não alcançamos índices que comprovem que essa ação afirmativa da lei de cotas não seja mais necessária”, disse a defensora.

“Pelo contrário, ainda não temos um impacto social definitivo que coloque a população negra e indígena em patamar de igualdade com a população branca. As desigualdades ainda não foram excluídas. Negros e indígenas ainda ocupam menos cargo de poder, além de terem menos acesso à saúde, educação e moradia. Ainda recebem menores salários. Então, a lei de cotas ainda precisa continuar”, completou.

Segundo Saldanha, é preciso se preocupar para que nenhum direito seja retirado da lei após a revisão. “Isso é importante para que a gente não tenha nenhum tipo de retrocesso nos direitos que alcançamos. Se houver um retrocesso nessa legislação, tudo que foi construído nesses dez anos pode ser perdido”, concluiu Saldanha.
 

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