Lelo Filho: ‘Espero nesta semana ter outras notícias a dar’
Após anúncio de fechamento da Cia, ator e diretor fala de encontro que pode trazer novas perspectiva para o grupo
Foto: Reprodução / Facebook
Na semana passada, Salvador foi surpreendida com o anúncio feito pelo ator e diretor de teatro, Lelo Filho, em relação ao encerramento das atividades da Cia Baiana de Patifaria, um dos grupos de teatro mais tradicionais da Bahia. Ele utilizou as redes sociais para dar a notícia, no dia 30 de novembro.
Mas parece que acendeu uma luz. Lelo Filho, disse ao Farol da Bahia, que após o clamor do anúncio, ele foi chamado para uma conversa com um órgão público para tentar encontrar uma saída e evitar o fechamento da Cia.
A Cia Baiana de Patifaria, sediada em Salvador e com quase 35 anos de história, levou ao público espetáculos como Noviças Rebeldes, Abafabanca, 3 em 1 e a A Vaca Lelé. O espetáculo "A Bofetada", um dos mais famosos da companhia, está nos palcos há mais de 29 anos.
Em seu post, Lelo Filho falou sobre os impactos da pandemia da Covid-19 e detalhou que o fim da companhia ocorreu por falta de incentivos. Destacou ainda que o grupo não teve projetos recentemente aprovados em editais.
O Farol da Bahia entrou em contato com o diretor para saber mais informações sobre a situação.
Confira a entrevista:
Farol da Bahia: Foi anunciado que o encerramento da Companhia se deu por falta de incentivo. Como você vê a situação da cultura no nosso país?
Lelo Filho: Estou falando num momento difícil, chegando ao final de uma semana difícil pra mim e para todos os integrantes da Cia, porque diante das dificuldades todas que o teatro brasileiro e especificamente o teatro baiano já vinha atravessando, por vários fatores, falta de pautas, frequência do público diminuindo, a pandemia foi digamos o estopim para que a situação ficasse mais difícil do que já estava. Nós paramos em março de 2020, por conta da pandemia, nós entendemos a necessidade do isolamento, mas isso acarretou para toda a cadeia produtiva, que não se refere apenas aos quatro atores que estavam na ‘A Bofetada’, mas para toda a equipe. Os empregos direto e indireto que a Cia gera. Foram dois anos difíceis, e chegamos à conclusão pelo fechamento. Isso gerou uma comoção muito grande, não só dos fãs como da própria imprensa e agora, um órgão público me chamou pra uma conversa, estou dando essa entrevista com a notícia de que espero que na semana que vem eu tenha outras notícias a dar. Esse primeiro papo foi muito proveitoso no sentido de achar saídas não só para manter as sedes e as nossas atividades, ainda é cedo para dizer o que vai acontecer, mas foi sinalizada a possibilidade de ganharmos algum fôlego.
LF: A situação da cultura no nosso país ela é desoladora no atual momento. A cultura brasileira de certa forma ela sempre passa por momentos de dificuldades do que de parcerias e apoios que deem suportes aos artistas espalhados nesse imenso país. Mas vivemos talvez o pior momento. Nós perdemos o Ministério da Cultura. Temos uma pequena secretaria de Cultura. Estamos no quinto secretário, os demais foram desligados. E o atual secretário é um cara que já foi ator, mas acho que ele desconhece um pouco como o artista que está no dia a dia, na lida, viajando com as suas montagens de seus espetáculos, como é que a realidade do verdadeiro artista acontece. É um cara que anda armado dentro da secretaria. Tudo isso é muito triste. A pandemia jogou os artistas no mesmo lugar, com a falta de trabalho. Algum projeto emergencial deveria ter sido criado para ajudar esta cadeia produtiva que é grande. Nós geramos de 2% a 4% do PIB do Brasil. Nós empregamos de 5 a 6 milhões de trabalhadores no Brasil. Isso precisa ser levado em conta e respeitado.
FB: O setor cultural foi um dos mais afetados pela pandemia, como foi para vocês atravessar este momento?
LF: Nenhum projeto nosso foi aprovado nos editais da Lei Aldir Blanc. Então, o ano acabou mal em 2020, começou de forma muito incerta, em 2021, apesar de termos lançado o Casarão 15 digital, espaço cultural na nossa sede, que também não emplacou por conta da pandemia. Espero que a partir de 2022, a cultura seja vista de forma séria e seja reconhecida a importância dela. Arte e educação juntos para que os jovens tenham acesso à cultura, que é um direito que está na Constituição.
FB: A Bahia é um celeiro cultural, mas os baianos não têm muito a cultura de ir ao teatro. Você acha que a Cia Baiana de Patifaria melhorou esta realidade?
LF: Eu não posso culpar o público. Uma boa parcela da população não tem dinheiro sobrando para o entretenimento, ou seja, numa crise financeira, a primeira coisa que a população corta é exatamente o teatro. A Cia quando surgiu há quase 35 anos invertemos o processo de busca do público para o que iria assistir. Naquela época o público ia para o TCA assistir grandes nomes da televisão que vinham se apresentar, a Cia começou a mudar isso, e o público começaram a lotar os espaços para ver os artistas locais. Ao longo do tempo, nesses 35 anos muita coisa aconteceu. A violência, a internet, a falta de transporte, tirou o público do teatro. A Cia percorreu quase 70 cidades do país. Fomos até Nova Iorque com ‘Noviças Rebeldes’, uma comédia musical americana, que nós fizemos a versão brasileira, e acabou levando duas semanas de apresentações por lá. A Cia acabou virando uma referência positiva para outros artista entrarem na profissão. Uma Cia independente, que dependeu pouco de verba pública. Nunca tivemos Lei Rouanet.
FB: Imagino que deve ter sido bem sofrido para vocês anunciar o fim de uma história de vida. Como você está lidando com isso?
LF: Para mim é muito difícil, mas estamos sempre tentando e resistindo, apesar de todas as adversidades.
FB: Para você, a situação de crise pode melhorar no futuro? Quais são os seus planos? Já tem algum projeto a caminho?
LF: Bom, até que a gente consiga vacinar a população, por isso que fica sempre a dica: “Se vacinem, se protejam, protejam quem você ama, seu entorno, o coletivo” esperamos que o teatro possa ter lotação completa em breve, que mais nenhum teatro feche, em 2021 perdemos dois teatros, o ACBEU e o Isba. Uma perda não só para o artista, mas para o público. Isso é muito grave. Desejamos que os gestores olhem com muito cuidado e carinho para este assunto para que achem saídas para salvar os teatros, para que nenhum grupo tenha que encerrar as atividades. Que as empresas privadas também possam ajudar os artistas.
Projetos nunca faltam. Já tenho uma peça inédita já escrita para Fanta e Pandora, personagem da ‘A Bofetada’ em uma nova situação. Mas tudo isso demanda produção, falta de patrocínio, que nós precisamos superar, e conseguir apoios e patrocínios para que saiam do papel e se torne realidade. Meu desejo é que a gente volte a ser a Cia que sempre fomos. Independentes, ganhar força de novo, ganhar fôlego, mesmo que seja com investimento privado e/ou público, para que a gente possa voltar a cena, voltar a trazer o público de volta, matar a saudades dos personagens, voltar a viajar, circular com os nossos espetáculos. Desejo que a gente consiga superar a pandemia e a crise que se abate sobre o Brasil. E que as artes possam voltar com força total.