Motta destrava emendas de comissão e distribui R$ 11 milhões extras por deputado
Com esse movimento, ele usa os recursos para tentar reforçar o apoio que tem no plenário da Casa

Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), definiu que cada deputado poderá direcionar o pagamento de R$ 11 milhões em emendas de comissão, verba distribuída pelos colegiados do Congresso.
Com esse movimento, ele usa os recursos para tentar reforçar o apoio que tem no plenário da Casa, assim como fez seu antecessor, o ex-presidente Arthur Lira (PP-AL).
Com a determinação de Motta, cada parlamentar poderá apadrinhar o valor adicional, além dos R$ 37 milhões a que tem direito na forma de emendas individuais. A cifra de R$ 11 milhões foi confirmada por seis parlamentares ouvidos pela Folha de S.Paulo.
O presidente da Câmara, Hugo Motta, começou a distribuir as emendas de comissão entre os deputados, mas dependerá de uma dobradinha com o governo.
Na prática, os deputados irão enviar às comissões uma indicação de como os R$ 11 milhões deverão ser gastos. Cada colegiado, então, terá que votar e registrar em ata essas escolhas. As comissões de Saúde, Esporte e Turismo da Câmara já informaram aos parlamentares a abertura do cadastro para as indicações, mas o prazo ainda não foi informado.
Além disso, os líderes de cada partido e o próprio Motta terão direito de distribuir valores ainda maiores em emendas de comissão. Esse número é mantido em sigilo pela cúpula da Câmara. O montante apadrinhado por cada líder depende do tamanho de sua bancada e, em anos anteriores, superou R$ 100 milhões.
As emendas parlamentares são uma forma de deputados e senadores direcionarem recursos para suas bases eleitorais, o que costuma render dividendos políticos e votos.
As emendas individuais (total de R$ 19 bilhões para a Câmara em 2025) e as emendas de bancada estadual (R$ 14 bilhões) são de execução obrigatória pelo governo. As emendas de comissão não são impositivas, o que significa que a liberação dos recursos depende do governo.
Essa discricionariedade de pagamento é tradicionalmente usada como moeda de troca para obter apoio dos congressistas. Aqueles que são fiéis nas votações são contemplados com a liberação das verbas, enquanto os que fazem oposição ou divergem da cúpula podem ter o dinheiro represado. Em 2025, essas emendas de comissão representarão R$ 10,5 bilhões.
Durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), e em parte do governo Lula, os autores dessas emendas de comissão ficavam sob sigilo e apenas a cúpula do próprio Congresso tinha conhecimento sobre o valor que cada parlamentar recebia e como seria gasto. Esse formato era usado anteriormente com as emendas de relator ao Orçamento, declaradas inconstitucionais em 2022.
As emendas de comissão substituíram as emendas de relator em 2024, mas foram bloqueadas por ordem do ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), até que fossem adotadas regras de transparência e rastreabilidade para os recursos, diante de seguidas operações policiais para investigar desvios de dinheiro e irregularidades.
Agora, com o fim do sigilo, Motta e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), dependerão de um alinhamento com o governo para coordenarem a liberação dos recursos de acordo com suas indicações.
Até o ano passado, essa negociação fez com que Lira entrasse em conflito com o então responsável pelas verbas no governo, o ex-ministro da SRI (Secretaria de Relações Institucionais) Alexandre Padilha.
Dois interlocutores do presidente Lula dizem que, por enquanto, não há acordo sobre o pagamento dessas verbas. Eles ressaltam também que, em meio ao conflito com o Congresso em torno das medidas de aumento de impostos, será preciso avaliar como fica esse cenário e se o ambiente com a Câmara e o Senado estará positivo para isso.
O aviso sobre os R$ 11 milhões por deputado começou a circular nesta semana entre os partidos. Ainda não há informação a abrangência da distribuição do dinheiro nem se todos serão contemplados com esses valores, incluindo partidos que costumam criticar as emendas, como PSOL e Novo.
A partilha da verba para os deputados vai na contramão de sinais, enviados por Motta nos últimos dias, de que a Câmara está disposta a restringir esse tipo de pagamento para contribuir com o ajuste das contas públicas.
Na sexta-feira (4), o presidente da Câmara disse que é preciso discutir cortes no valor das emendas parlamentares como parte da "colaboração" do Legislativo.
"Da mesma forma que nós estamos aqui defendendo corte de benefícios tributários, nós temos que discutir corte de emendas, corte em desperdícios, gastos de dinheiro público por parte do Executivo. Todos têm que dar sua contribuição. Não defendo um Congresso intocável, não defendo emendas parlamentares intocáveis", afirmou à CNN.