MPF obtém decisões que reconhecem crime de trabalho análogo à escravidão como imprescritível
Processos serão remetidos ao STF e ao STJ para análise

Foto: Divulgação/Ministério do Trabalho
O Tribunal Regional Federal (TRF1) admitiu recursos do Ministério Público Federal (MPF) em dois processos em que se é discutido se o crime de redução à condição análoga à escravidão é prescritível, ou seja, se pode deixar de ser punido ao fim do prazo prescricional.
As ações têm origem em fiscalizações do Ministério do Trabalho e Emprego no Pará, feitas em 2003 e 2004, que constataram trabalhadores em condições degradantes, sem acesso a água potável, banheiros ou alojamentos adequados, além de terem direitos trabalhistas negados e contribuições previdenciárias sonegadas.
Diante da decisão, os processos serão remetidos ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para análise. O MPF destaca que o crime é imprescritível por se tratar de grave violação à Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH) e às decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
De acordo com o MPF, a escravidão e as formas contemporâneas caracterizam graves violações de direitos humanos e delitos de Direito Internacional com status de jus cogens (normas imperativas). A jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, de caráter vinculante para o Brasil, firmou que tais crimes não prescrevem. O país reconheceu a jurisdição da CIDH, ao ratificar a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica).
Entenda os casos
Em março deste ano, o procurador regional da República Danilo Pinheiro Dias recorreu de decisão da 10ª Turma do TRF1 que havia reconhecido a prescrição do crime praticado na fazenda Bom Jardim, em São Félix do Xingu (PA), onde 23 trabalhadores foram resgatados em situação análoga à escravidão. Para o procurador, considerar esse tipo de crime prescritível viola a Convenção Americana de Direitos Humanos, a Constituição Federal e o Código Penal.
Em julho, o TRF1 admitiu os recursos apresentados pelo Ministério Público Federal (MPF) e ressaltou a relevância jurídica da matéria, que já está sob análise do Supremo Tribunal Federal (STF), na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1053, proposta pelo próprio MPF. A ação busca o reconhecimento de que o crime de trabalho escravo é imprescritível e inclui pedido de liminar para que juízes e tribunais deixem de declarar a prescrição até o julgamento final da ADPF.
Já em junho, o procurador regional da República Bruno Caiado de Acioli também recorreu contra acórdão da 3ª Turma do TRF1 que declarou a prescrição em outro caso, envolvendo a condenação de um fazendeiro por manter 118 trabalhadores em condições degradantes. As vítimas viviam em barracos improvisados de galhos e lonas, sem acesso a água potável ou banheiros, próximos a fornos e expostas à fumaça, além de terem seus direitos trabalhistas negados e contribuições previdenciárias sonegadas.