Preço do botijão de gás impacta famílias de baixa renda e sofre menor redução que outros combustíveis
Custo elevado do gás de cozinha afeta orçamento de famílias vulneráveis em diversos estados brasileiros
Foto: Agência Brasil
O botijão de gás, item de grande peso no orçamento das famílias de baixa renda, tem registrado uma redução de preço menos significativa em comparação a outros combustíveis desde o início da guerra na Ucrânia, que gerou uma escalada inflacionária mundial.
Apesar dos cortes realizados pela Petrobras, o valor do combustível aumentou em seis estados. Um levantamento feito pela Folha indica que o preço do botijão de gás consome mais da metade da renda de famílias pobres em algumas regiões.
Enquanto a gasolina e o diesel tiveram uma queda de 32% e 34% respectivamente, o preço médio do botijão de gás de 13 quilos caiu apenas 12% desde o recorde registrado em março de 2023 (R$ 159,58, em valor corrigido pelo IPCA) até os R$ 104,37 verificados na última semana. Embora os preços dos três produtos tenham sido reduzidos várias vezes nas refinarias nos últimos meses, o gás de cozinha apresenta um represamento em seu preço, de acordo com dados compilados pelo Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis).
Na refinaria da Petrobras, o valor de venda do botijão de gás teve uma queda de 47,9% desde o pico de R$ 61,65 atingido em março de 2022. Foram realizadas cinco reduções no período, sendo a última delas no dia 17 de maio, de 21,6%, o que equivale a uma redução de R$ 8,97 por botijão. A Petrobras esperava que o preço médio do produto chegasse a R$ 99,87 após essa redução. No entanto, duas semanas depois, segundo a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis), o valor médio de venda era de R$ 104,37.
Antes do corte, o preço do gás de cozinha foi pressionado pela implantação do novo modelo de cobrança do ICMS, que estabeleceu uma alíquota única nacional R$ 7,50 acima do valor médio cobrado pelos estados até abril.
Um levantamento da Folha revela que o custo do botijão de gás pode representar mais da metade do orçamento das famílias vulneráveis, que estão entre os 10% mais pobres da população brasileira, em estados como Pará, Bahia, Piauí e Maranhão. Em outros estados, como Ceará, Amazonas e Sergipe, o preço médio do botijão de gás representa mais de 40% da renda dos 10% mais pobres. Nas capitais, o combustível chega a superar 20% do orçamento das famílias vulneráveis em Manaus (AM), Fortaleza (CE), Teresina (PI), Salvador (BA), São Luís (MA) e Belém (PA).
Segundo a pesquisadora do Ineep, Carla Ferreira, há indícios de que as distribuidoras e revendedores de gás de cozinha estão se
apropriando da queda de preços nas refinarias. Dados recentes da ANP mostram que o combustível representa 40% do preço final do botijão, enquanto as margens do setor correspondem a 48%. Em março de 2022, as margens representavam 37%, em comparação com 51% do custo do gás.
"A redução de preços nas refinarias não está sendo repassada, o que sugere que o setor está aproveitando esse momento para recuperar suas margens", afirma Ferreira. Em janeiro de 2020, antes da pandemia, as margens correspondiam a 43% do custo final.
O setor se abstém de comentar sobre a evolução dos preços. Em nota divulgada logo após o anúncio da última redução da Petrobras, a associação que reúne os revendedores lamentou que os cortes não têm sido repassados integralmente pelas distribuidoras, deixando as revendas em uma situação desconfortável. No entanto, a associação defende que os preços são livres no país e que cada empresa pode precificar seus produtos e serviços de acordo com os custos operacionais.
Apesar do auxílio oferecido pelo governo para a compra do botijão de gás pelas famílias de baixa renda, as vendas desse produto têm diminuído nos últimos anos, o que o setor considera um reflexo do aumento dos preços. Em 2022, houve uma queda de 2,6% nas vendas, e no primeiro trimestre de 2023, a queda foi de 1%.
Com o objetivo de minimizar esse problema, o governo federal concede um auxílio mensal de R$ 52 para famílias inscritas no Cadastro Único para programas sociais, o que corresponde a R$ 104 a cada dois meses, aproximadamente o tempo de duração de um botijão de gás. Em abril, esse benefício foi pago a 5,69 milhões de famílias, totalizando um custo de R$ 626,2 milhões. No dia 1º de junho, o governo publicou um decreto estendendo o prazo para o pagamento da parcela extra do benefício, que antes garantia 50% do valor do botijão a cada dois meses.
O setor questiona a forma de pagamento desse auxílio, que não exige que o beneficiário comprove a aquisição do produto. O Sindigás, que representa as distribuidoras, argumenta que essa transferência de renda deveria ter como foco o combate à pobreza energética, visando melhorar a qualidade de vida das famílias através da redução do uso da lenha como fonte de cocção. Para a associação, destinar o auxílio especificamente para a compra de gás de cozinha aumentaria as chances de sucesso dessa política pública.
Além disso, a pesquisadora do Ineep observa que a Petrobras tem dado mais importância aos combustíveis alternativos em sua nova estratégia comercial, abandonando o conceito de paridade de importação e reduzindo os preços da gasolina e do diesel. Segundo ela, os dois maiores desafios são o gás de cozinha e o diesel, sendo o diesel essencial para o transporte e o gás de cozinha fundamental para o consumo das famílias.