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Processo sigiloso aponta erros e irregularidades em decisão de bloqueio de Moraes contra ex-deputado estadual

Homero Marchese teve contas das redes sociais bloqueadas de forma indevida

Por Da Redação
Ás

Processo sigiloso aponta erros e irregularidades em decisão de bloqueio de Moraes contra ex-deputado estadual

Foto: Pedro de Oliveira/Rosinei Coutinho/STF

Um processo que estava em sigilo há quase dois anos contra o ex-deputado estadual Homero Marchese revelou erros e o uso inadequado do órgão de combate à desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pelo ministro Alexandre de Moraes. Documentos obtidos pela Folha de São Paulo mostram contradições nas explicações do ministro e o uso do TSE para abastecer inquéritos criminais contra bolsonaristas.

O caso teve início no sábado, 12 de novembro de 2022, após as eleições. De acordo com mensagens e documentos obtidas pela Folha mostram um diálogo entre o juiz Airton Vieira, braço direito de Moraes e principal assessor Supremo Tribunal Federal (STF), e Eduardo Tagliaferro, então chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED) do TSE. Às 22h02 daquele dia, Vieira enviou três arquivos para Tagliaferro contendo postagens e um vídeo sobre um evento em Nova York onde ministros do STF se hospedariam. 
"Máfia Brasileira. Eduardo, por favor, consegue identificar? E bloquear? O Ministro pediu… Obrigado", escreveu Vieira. "Urgente, em razão da data", acrescentou.

Na mensagem, Tagliaferro respondeu que estava retornando de São Paulo para Brasília e que faria o relatório, mas observou que as postagens não tinham relação com o processo eleitoral: "Só não sei como bloquear pelo TSE ‘pq’ não fala nada de eleições", disse ele. Posteriormente, afirma que conseguiu identificar “apenas um candidato do Paraná”. Então, Vieira pede que Tagliaferro envie um relatório, mesmo com a dificuldade em identificar os autores das postagens. "Pode enviar para mim um relatório simples, inclusive dizendo não ter como identificar os outros dois? Bloqueio pelo STF…", pediu Vieira.

Um pouco mais tarde, às 23h54, Tagliaferro enviou um relatório que, ao invés de registrar que o pedido foi feito pelo gabinete de Moraes, afirmou que o material foi recebido de forma anônima e produzido a pedido de Marco Antônio Vargas, juiz auxiliar de Moraes no TSE. Na análise, Tagliaferro identificou incorretamente Homero Marchese, então deputado estadual pelo Paraná, como autor de uma postagem. Na verdade, a postagem de Marchese era apenas um panfleto sobre o evento em Nova York, que foi montado por outra pessoa para incluir a frase "máfia brasileira".

O relatório do TSE chegou ao STF às 8h do dia 13 de novembro, e com base nele, Moraes determinou o bloqueio integral das contas de Marchese no Twitter, Facebook e Instagram. Airton Vieira afirmou no grupo de WhatsApp que a decisão de ofício foi tomada naquela mesma madrugada. Não houve consulta ao Ministério Público e nenhuma diligência foi solicitada à Polícia Federal.

Na sessão plenária do STF realizada no último dia 14, Moraes afirmou que todos os alvos de relatórios do TSE já eram investigados nos inquéritos das fake news ou das milícias digitais, sob sua relatoria. "Todos os documentos oficiais juntados à investigação correndo pela Polícia Federal, todos já eram investigados previamente nos inquéritos já citados, com a Procuradoria acompanhando e todos, repito, todos os agravos regimentais, todos os recursos contra as minhas decisões, inclusive de juntada desses relatórios. Todos que foram impugnados foram mantidos pelo plenário do Supremo Tribunal", disse o ministro.

Porém, os dados do processo mostram que Marchese não era investigado previamente nos inquéritos de Moraes e que os agravos regimentais apresentados pelo Twitter, pela PGR e pelo próprio Marchese não foram analisados. Segundo informações do documento, o bloqueio foi baseado em uma identificação incorreta e as alegações de Moraes sobre a divulgação de informações pessoais dos ministros foram equivocadas.

As contas de Marchese ficaram bloqueadas no dia 13 de novembro pelas plataformas que tiveram que executar a decisão em duas horas sob pena de multa diário de R$10mil.  Com isso, o deputado teve seu Instagram bloqueado por quase seis meses e ficou sem o X, na época ainda chamado de Twitter e Facebook por mais de um mês. 
PGE

A procuradora-geral Lindôra Araújo protocolou um recurso solicitando a anulação da decisão e o trancamento da investigação.  No texto, Araújo afirma ser ilegal o uso do órgão do TSE para investigação criminal. "Assim, ao contrário do que foi consignado na decisão judicial recorrida, não se depreende que o investigado tenha veiculado informações pessoais relacionadas ao local de hospedagem dos ministros do Supremo Tribunal Federal, uma vez que tais dados constam de publicações de autor desconhecido", escreveu Lindôra.

Moraes não analisou nem os recursos da PGR nem do ex-deputado. Em decisão monocrática, o ministro debloqueou o Twitter e Facebook de Marchese, no dia 23 de dezembro. O bloqueio do Instagram, só foi revertido em 2 de maio de 2023, após decisão da Justiça do Paraná. O ex-deputado tomou conhecimento sobre o motivo do bloqueio somente cerca de 15 dias após o fato e teve que procurar a Justiça para restabelecer suas redes sociais.

Para a decisão, Moraes cita um ofício do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que solicitava a revogação de bloqueios de contas de deputados federais. Porém, Marchese nunca ocupou o cargo de deputado federal, apenas estadual no período de 2019 e 2023. 

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