Sambaquis: misteriosos monumentos milenares da pré-história
Saiba onde eles foram encontrados no Brasil e o que se conhece sobre os grupos que os construíram
Foto: Reprodução/G1
Uma escavação para a construção de quatro condomínios do Minha Casa, Minha Vida em São Luís revelou a existência de 43 esqueletos e cerca de 100 mil itens arqueológicos, entre fragmentos de cerâmica, materiais líticos (pedras trabalhadas), ossos e conchas decoradas.
Vários dos esqueletos estavam enterrados em um sambaqui, um tipo de monumento formado por camadas de conchas, ossos e outros restos de animais e sedimentos encontrado em várias partes do Brasil e que, em alguns casos, é mais antigo que as pirâmides egípcias.
Um sambaqui é definido como um sítio arqueológico formado pelo acúmulo de restos de animais, como ossos de peixes e conchas de moluscos.
"Eles existem no mundo inteiro e aparecem nas zonas ocupadas por humanos entre 10 mil atrás, na Europa, e em torno de 8 mil anos atrás, no Brasil", explica a arqueóloga Veronica Wesolowski, professora no Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (USP).
Há, entretanto, diferenças entre os sambaquis de acordo com o local e os povos que os construíram.
Na Dinamarca, por exemplo, esses sítios parecem ter sido espécies de acúmulos de restos de cozinha. Já no Brasil, há indícios de que as construções eram usadas como marcadores de território, avistáveis à distância – como da beira do mar ou de um rio, explica a também arqueóloga Claudia Cunha, professora da Universidade do Piauí.
Essa é uma característica comum aos sambaquis brasileiros. Outra é uso funerário, como locais para enterrar e homenagear os mortos, essa já estabelecida nos monumentos construídos junto ao litoral atlântico, mas ainda em investigação nos chamados amazônicos, que incluem o encontrado no terreno da MRV no Maranhão.
No Brasil, os sambaquis foram encontrados em três grandes zonas distintas:
- ao longo da costa atlântica, entre o Espírito Santo e o Rio Grande do Sul;
- na beira de rios de São Paulo;
- na margem de rios amazônicos em Rondônia e no Pará e no litoral paraense e maranhense.
A maioria dos sambaquis conhecidos (cerca de 1 mil) estão no Sul e no Sudeste do Brasil, segundo a arqueóloga Maria Dulce Gaspar. Na região chamada de litoral Salgado, que se estende da Ilha do Marajó, no Pará, ao Rio Gurupi, no Maranhão, foram encontrados cerca de 40.
Os mais antigos sambaquis brasileiros foram construídos em geral há cerca de 8 mil anos, o que os torna algumas das construções mais antigas da pré-história mundial, e continuaram ser erguidos até cerca de 3 mil anos atrás, principalmente entre 6 mil e 3 mil anos.
O fato de os sambaquis terem sido construídos em diferentes partes do país ao longo de um mesmo período não significa que essas misteriosas estruturas foram erguidas por um mesmo grande grupo. Na verdade, a identidade e a conexão entre as populações sambaquieiras é uma das grandes dúvidas dos arqueólogos.
"São os mesmos povos? Qual era a relação entre os povos que construíram os sambaquis amazônicos no litoral Salgado [como é conhecido o trecho entre o Marajó e o Rio Gurupi] e essa população costeira? Se é que existia relação. São algumas das grandes perguntas que restam por responder", explica Wesolowski, da USP.
Em julho deste ano, um estudo publicado na revista Nature Ecology & Evolution tentou encontrar uma resposta analisando os DNAs de 34 indivíduos pré-históricos (o mais antigo deles sendo o esqueleto de 10 mil anos encontrado no sambaqui Capelinha citado acima) de quatro regiões do Brasil.
Os resultados da pesquisa apontam que os sambaquieiros da costa Sul e Sudeste do Brasil não eram geneticamente homogêneos, ou seja: não necessariamente esses grupos compartilham uma mesma linhagem. Apesar disso, há várias semelhanças culturais nos sambaquis construídos nessa região.