Sem ar
Confira o artigo de Bruna Esteves
Foto: Reprodução
A morte de George Floyd foi um soco no estômago. Como se não bastasse viver uma tragédia sem tamanho com a epidemia do corona vírus, surgem outras ainda piores. E o que dizer da morte de Floyd? Para lhes ser sincera, me faltam palavras... pois somente com um grito de dor e indignação para expressar a perda de uma vida inocente de forma tão banal.
"Eu não posso respirar" foram as últimas palavras de um homem que, diante um ato de violência, preferiu combater a discriminação racial de forma pacífica e com dignidade. Infelizmente, esta atitude lhe custou a vida. Talvez ele não tivesse tido outra alternativa a não ser permanecer imóvel, pois provavelmente levaria um tiro caso reagisse aos comandos de uma autoridade policial.
Contudo, testemunhar um homem agonizando por quase nove minutos no chão por falta de ar é uma imagem difícil de ser esquecida, ainda mais quando o responsável por isso é um policial que, em tese, deveria estar protegendo cidadãos e não os matando. Pior ainda quando se mata por questões de ideologia de superioridade racial.
A morte de mais um homem negro evidencia que o racismo é um problema antigo e ao mesmo tempo bastante atual, latente e causador da desigualdade social em que muitos vivem, seja no Brasil ou em qualquer outra parte do mundo. A diferença é que em alguns países, o racismo é velado, enquanto que em outros, ele é totalmente explícito e até mesmo escancarado.
O mundo está de luto. E não é de agora. Afinal de contas a morte de centenas de milhares de negros está registrada na história da humanidade para nos lembrar que diversos sistemas sociais adotados são injustos, desiguais e racistas. Não há como negar ou sequer apagar o sofrimento e a humilhação daqueles que foram oprimidos, escravizados e assassinados pelas mãos de diversos opressores ao longo dos séculos. As mortes estão sendo contabilizadas há tempos e a pilha de cadáveres não para de crescer.
Aquele policial errou demasiadamente enquanto ser humano, faltou com o compromisso primordial de sua atividade que é defender pessoas e falhou com o senso de humanidade, que nos conecta uns aos outros, independentemente da cor, religião, condição social e gênero de cada um. E o fato dele ser branco, implica dizer que, todavia, uma minoria privilegiada dita as regras sociais.
E o que dizer da morte de Floyd? Ele foi mais um rosto dentre tantos outros que morreram pelas mãos de opressores racistas. Uma lástima pensar que para determinadas pessoas, uma vida negra não signifique nada, quando na verdade, todas as vidas importam! Mais triste ainda é um indivíduo pensar que tem o direito de eliminar a vida de outrem pelo simples fato da cor de sua pele não lhe agradar! Em que mundo estamos vivendo afinal? Tudo está de ponta cabeça e os valores totalmente invertidos.
Até quando negros serão vítimas da violência para a sociedade perceber de que o racismo mata? De que ninguém é melhor do que ninguém? De que é na diversidade que se encontra a riqueza e a beleza dos povos? De que negros, brancos e amarelos sangram iguais?
O mundo está de luto e ninguém mais consegue respirar este ar da hipocrisia, do fingimento e da indiferença. Os protestos pelos Estados Unidos e pelo mundo estão aí para mostrar que a comunidade negra, assim como outros grupos étnicos minoritários, está cansada de ser oprimida. Ela quer ter voz e lugar de pertencimento para defender seus direitos e as vidas de seus integrantes.
Imaginar que após meses de isolamento social, as pessoas estariam mais solidárias e empáticas umas com as outras, uma vez que, ao infectar indiscriminadamente negros, brancos, ricos e pobres, o corona vírus demonstrou que todos os seres humanos estão em pé de igualdade.
Em um momento em que mais de seis milhões de pessoas ao redor do mundo estão com dificuldade de respirar em razão do Covid-19, outra doença pré-existente como o racismo vem para deixar-nos ainda mais sem ar. Uma doença muito pior, mais gravosa, que já matou centenas de milhares de negros e que continua matando diariamente. E que infelizmente ainda não tem cura.
Bruna Esteves
03/06/2020