TCU vê indício de crime em compra de tratores com verba para família pobre
MP e tribunal pedem suspensão dos pagamentos à empresa XCMF, que fornece os maquinários ao governo Federal
Foto: Divulgação/TCU
Um possível crime de responsabilidade na compra de tratores pelo governo Federal com recursos que deveriam ser usados para amenizar o impacto da pandemia da Covid-19 para a população pobre, foi apontado pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU).
Lucas Rocha Furtado, subprocurador-geral, ingressou com representação no tribunal na semana passada pedindo apuração do caso. O documento requisita ainda a suspensão dos pagamentos à empresa que fornece os maquinários ao governo Federal, a chinesa XCMG.
De acordo com o que foi divulgado pela Folha de S. Paulo, na segunda-feira (22), o Ministério da Cidadania usou R$ 89,8 milhões no apagar das luzes do ano passado para a compra de maquinários. O recursos estão no âmbito do programa Fomento Rural, voltado a famílias em situação de pobreza e extrema pobreza da zona rural —contexto estranho ao uso de maquinários de grande porte.
A assinatura do contrato com a XCMG e o empenho dos recursos burlou uma determinação do TCU. O acórdão do tribunal autorizou a utilização do dinheiro desde que aplicado "exclusivamente ao custeio de despesas com enfrentamento do contexto da calamidade relativa à pandemia de Covid-19 e de seus efeitos sociais e econômicos e que tenham a mesma classificação funcional da dotação cancelada ou substituída".
Essas condições não foram atendidas pelo governo. As compras de tratores são investimento, não custeio, e não há relação com a Covid-19. Recursos foram originados da transição do extinto programa Bolsa Família para o Auxílio Brasil.
O partido Cidadania comprou 247 máquinas agrícolas ao aderir a atas de registro de preços elaboradas a partir de licitação do Ministério do Desenvolvimento Regional. Essas atas de registro, em nome da XCMG, têm sido usadas pelo governo e políticos para distribuir tratores a municípios de aliados.
De acordo com documentos obtidos pela reportagem, as máquinas ainda não chegaram a ser distribuídas —estariam ainda no pátio da empresa, em Pouso Alegre (MG). O Ministério da Cidadania realizou a compra sem ao menos ter a lista de municípios que serão beneficiados, o que denota a ausência de critérios técnicos.
O maior beneficiado é a Bahia, onde o ex-ministro da Cidadania João Roma (PL), que assina a liberação para as compras, é pré-candidato ao governo estadual da Bahia.
O ex-ministro negou irregularidades. Desta forma, a meu ver, o governo novamente age em desacordo com os princípios de deveriam nortear a atuação do administrador público, em especial, confronta os princípios da impessoalidade e da legalidade", afirma o subprocurador-geral do Ministério Público na representação, baseada na reportagem da Folha.
Lucas Rocha Furtado solicita a atuação do tribunal para verificar se houve desrespeito ao acórdão do próprio TCU e favorecimento a aliados do governo. Para o subprocurador-geral, o TCU deve determinar a suspensão das compras "até que esta Corte de Contas decida sobre a legalidade". Até o momento, o Ministério da Cidadania não se manifestou sobre o assunto