Terreiros de candomblé acusam Anielle Franco de 'descaso total' em carta a Lula
As entidades pedem uma mesa de negociação com o presidente Lula para conversar sobre os caminhos das políticas para terreiros
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Terreiros e entidades de matriz africana do país assinaram uma carta em que acusam a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, de ter um "descaso total" com os grupos. Cem entidades assinam o documento, que pede uma reunião com o presidente Lula (PT) para falar da gestão da ministra.
As organizações criticam o envolvimento da chefe da pasta com "polêmicas que não ajudam o governo Lula", como a recente demissão do titular da Sinapir (Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial), Yuri Silva, na terça-feira (8). Silva era ligado ao ex-ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, demitido após acusações de importunação sexual --em depoimento à PF, Anielle declarou ter sido uma vítima.
Além disso, as entidades alegam uma "falta de diálogo" da ministra com os terreiros, sobretudo a respeito da demissão de membros como Silva.
"Recebemos com muita preocupação a demissão por telefone, e durante um resguardo provocado por luto familiar, do secretário nacional Yuri Silva, que compõe uma organização histórica de ativismo em defesa das religiões de matriz africana, a saber o CEN, e que é um intelectual na formulação dessas pautas", diz trecho da carta.
As entidades pedem uma mesa de negociação com o presidente Lula para conversar sobre os caminhos das políticas para terreiros e se referem à gestão da ministra como frágil.
"Investidos desta história, os terreiros e as organizações que subscrevem essa carta manifestam-se com preocupação sobre a política do Ministério da Igualdade Racial para esse segmento, que encontrou o descaso total da ministra da pasta até agora, desarticulando a possibilidade da retomada do que iniciamos nos governos Lula e Dilma anteriores", afirma a carta.
Procurado, o Ministério da Igualdade Racial afirmou não ter recebido formalmente a referida carta e que soube do seu teor em circulação por mensagem de WhatsApp. Por isso, o ministério diz não ter como garantir a confiabilidade do documento.
A pasta informa ainda ter uma diretoria própria para Povos de Terreiro e de Matriz Africana desde a constituição do ministério, "por entender a relevância da agenda no Brasil".
"A política em construção tem como pauta o diálogo com os povos de terreiro das cinco regiões do Brasil e está sendo articulada para lançamento em breve", diz a pasta.
Sobre a demissão do ex-secretário, a pasta alegou que, visto que se tratava de um cargo de confiança, é prerrogativa da ministra contratar e exonerar servidores.
"Mudanças em cargos é uma prática comum de qualquer gestão. A continuidade do trabalho está garantida com a nomeação do novo secretário Clédisson Geraldo dos Santos, que tem larga experiência nas políticas e relação com os movimentos. Será fortalecido o Sistema de Promoção da Igualdade Racial e a agenda de direitos e para a população negra, quilombola, cigana, povos de comunidades tradicionais e de matriz africana do Brasil", diz a nota.
CRÍTICAS DAS ENTIDADES À MINISTRA ANIELLE FRANCO
- Má vontade na retomada de políticas relevantes para os povos de terreiro, como a Política Nacional de Desenvolvimento
- Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais e outras ações pontuais, como a distribuição de alimentos para terreiros de candomblé do Brasil via MIR e CONAB;
- Demora na publicação da Política Nacional de Combate ao Racismo Religioso, elaborado neste governo pela até técnica do Ministério, porém obstaculizada pelo Gabinete da Ministra e por sua Secretária Executiva;
- Falta de diálogo com os terreiros de candomblé patrimonializados como bens materiais e bens Imateriais do Brasil pelo Iphan, de forma a prestar apoio a esses patrimônios negros históricos que dialogam com a população negra local. A saber, a Ministra nunca visitou esses espaços sagrados e desmarcou encontros após eventos prontos, em pelo menos duas ocasiões;
- Baixo investimento orçamentário para povos de terreiro, o que demonstra a falta de prioridade do Ministério para o segmento