Transplante de útero: até onde a medicina consegue ir diante do desejo de Maya Massafera?

Procedimento já possibilitou o nascimento de 65 bebês em mulheres cisgênero, mas ainda não há registros de gestações em mulheres trans

Por Michel Telles
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Transplante de útero: até onde a medicina consegue ir diante do desejo de Maya Massafera?

Foto: Instagram

O desejo da influenciadora Maya Massafera de se tornar mãe por meio de um transplante de útero reacendeu uma discussão importante na medicina reprodutiva: até onde a ciência consegue avançar para tornar esse sonho possível? A fala, feita em entrevista recente, ganhou repercussão imediata, não apenas pelo sonho pessoal da artista, mas também por expor um tema que ainda é pouco conhecido fora dos círculos médicos.

Afinal, o transplante de útero já deixou de ser apenas uma hipótese: desde 2014, dezenas de mulheres que nasceram sem o órgão ou precisaram retirá-lo por motivos de saúde conseguiram engravidar e dar à luz com sucesso. Mas quando se trata de mulheres trans, como no caso de Maya, o assunto ainda se encontra em uma fronteira experimental, repleta de desafios técnicos.

O que é o transplante de útero

O transplante de útero consiste na transferência cirúrgica desse órgão de uma doadora, viva ou falecida, para uma receptora. O objetivo é permitir que mulheres sem útero funcional possam gerar uma gestação. O procedimento envolve múltiplas etapas, desde a avaliação psicológica e médica das pacientes até a complexa cirurgia de retirada e implantação do órgão, que pode durar mais de 10 horas.

“A receptora precisa passar por um período de adaptação, com uso de imunossupressores para evitar a rejeição do órgão, antes de iniciar as tentativas de gravidez”, explica a Dra. Carolina Rebello, especialista em reprodução assistida da VidaBemVinda, unidade do FertGroup.

Segundo ela, o transplante de útero é sempre temporário, sendo retirado após o nascimento do(s) filho(s), já que o uso prolongado de imunossupressores pode trazer riscos importantes à saúde da paciente.

Gravidez só é possível com fertilização in vitro

Mesmo com o útero transplantado, a concepção natural não é viável. Isso porque não há conexão entre trompas e útero. “Nesses casos, a fertilização in vitro (FIV) é obrigatória. A fecundação precisa acontecer em laboratório, e os embriões transferidos para o útero após sua recuperação”, esclarece Rebello.

O caso mais emblemático ocorreu na Suécia, em 2014, quando nasceu o primeiro bebê gerado em um útero transplantado. Desde então, já foram realizados cerca de 135 transplantes em dez países, resultando em aproximadamente 65 nascimentos. No Brasil, o primeiro bebê nasceu em 2018, no Hospital das Clínicas de São Paulo.

Mulheres trans podem engravidar após transplante de útero?

Até o momento, não há registros de gestação em mulheres trans após transplante de útero. Além da complexidade cirúrgica, existem barreiras fisiológicas importantes: diferenças anatômicas na pelve, além da necessidade de ajustes imunológicos e endócrinos.

“Ainda que a ciência avance rapidamente, hoje não é possível afirmar que mulheres trans possam engravidar com segurança através do transplante de útero. Mas o tema está em constante debate, e a medicina não pode ser vista como estática”, afirma Rebello.

Avanços e esperanças

Para mulheres cisgênero com infertilidade uterina absoluta, o transplante de útero já se consolidou como uma possibilidade concreta, ainda que restrita a protocolos de pesquisa em centros altamente especializados.

“O transplante uterino representa um dos maiores avanços da medicina reprodutiva nas últimas décadas. Ele oferece a chance de vivenciar a gestação a pessoas que, até pouco tempo, só podiam recorrer à adoção ou à barriga solidária”, conclui a médica.

Enquanto o desejo de Maya Massafera reacende uma discussão importante na medicina reprodutiva, especialistas concordam em um ponto: os avanços continuam acontecendo, e o que hoje parece impossível pode se tornar realidade no futuro.

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