Nessas últimas semanas, as redes sociais têm replicado com perplexidade as atitudes da atriz Cassia Kiss, em razão de seus posicionamentos religiosos extremados, “motivados” por suas também questões políticas, mas, honestamente, penso, pelos estudos que sempre me animaram, na área da psicanálise, que a questão não tem baliza na religião, ou mesmo no viés político. Penso que seja possível, pelo que ela disse no programa da Leda Nagle, em suas palavras, de culpa por ter abortado um filho. “Eu matei meu filho”, afirmou na entrevista.
Culpa é o sentimento que acomete a pessoa ao se sentir indigna, má, ruim, carregada de remorso e censura. A culpa, então, afirmam os estudiosos do comportamento humano, é o resultado de muita raiva guardada que se volta contra o próprio(a) culpado(a), dentro dos conceitos sociais a que estão submetidos. Assim: raiva mais mágoas reprimidas igual a culpa e consequente necessidade de autopunição. Dessa forma, entendo, que Cássia Kiss vem de um processo de julgamento a si mesma pelo aborto cometido. De acordo com a psicanálise, o sentimento de culpa surge do “fracasso” em relação à imagem que o superego projetou. Dessa forma, quando não atingimos o que nosso superego (conjunto de forças morais inibidoras apreendida na socialização) imaginou que seria, nós ficamos decepcionados conosco mesmos, quando estas forças não nos inibiram no que esperávamos.
Pesquisadores do comportamento afirmam que o sentimento de culpa é o nosso julgamento negativo por não conseguirmos viver de acordo com padrões estabelecidos pela sociedade, com repetardos das religiões. Esses padrões podem ser de maneira objetiva, ou criamos por conta de nossos processos de recalques e traumas. Dentro da visão religiosa, o sentimento de culpa se dá quando violamos uma norma moral. Assim, o arrependimento resultaria em uma melhora pessoal, pois só se alcançaria a mudança reconhecendo o pecado, o arrependimento traria o perdão divino, espiritual, porém para muitos a mente necessita de uma punição. Nessa direção, que sinto Cássia Kiss buscando essa punição, sendo extremista na religião, pois sabia que seria ridicularizada, estigmatizada, hostilizada, ou seja, “pagaria” por, em suas palavras, “ter matado” o seu filho. Mesmo considerando o universo individualizado que é a mente humana, mas sinto, no entanto, que aí reside a necessidade de redenção de Cássia Kis. Ao que parece, ela não estanca e ressignifica a culpa por resiliência, mas a aumenta, buscando uma espécie de epifania, ajoelhando-se na chuva, rezando o terço... a religião, infelizmente, pode ser dínamo potencializador de neurose, quando não entendida no seu sentido de real libertação e consolo.