A ira de Deus

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A ira de Deus

Não há dúvida alguma que nos porões, esgotos das redes sociais, de um modo geral, circulam toda forma de lodo e sujeita, que nasce, acredito, de questões multifatoriais, mas talvez ao fundo de todas esteja a necessidade de prevalência das chamadas narrativas, como instrumento de verdade. No meio antropológico já se afirma que a verdade está deixando de existir, porque o que contará de fato a favor de alguma “notícia” será a quantidade de divulgação, curtida, engajamento que o fato ganhar, ou seja, quanto mais pessoas e rapidez uma informação chegar, aquela será a verdade, mesmo em se tratando de mentira. Talvez seja a visão atualizada do ministro da propaganda de Hitler, Goebells, que dizia se tornar em verdade uma mentira repetida mil vezes. O fato é que estamos vendo tentativas permanentes dessa tática. A última infame – sempre há superação neste hanking – foi uma mulher que (o vídeo está circulando intensamente pelas redes), residente de Porto Alegre (RS), afirmou que as recentes catástrofes no estado do Rio Grande do Sul são consequência da orientação sexual do governador Eduardo Leite.  Ela pediu que os eleitores do governador peçam desculpas para “aplacar a ira de Deus”. Exatamente: Deus estava irado com o Rio Grande do Sul por conta da homossexualidade do seu governante. “Esse pecado de ter colocado um homem, cuja primeira-dama é um homem, no poder, ativou a ira de Deus contra o povo gaúcho”, afirmou em voz chorosa, sem descer uma só lágrima sequer.

A Aliança Nacional LGBTI+ denunciou a declaração nas redes sociais e pediu que as autoridades investiguem essa senhora. A entidade ressaltou a necessidade de cumprimento das decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu a LGBTIfobia como crime equivalente ao racismo. É preciso, sim, que essas questões seja levadas mais a sério, e não apenas desconsiderar que se trata de alguma fanática, recalcada, onde cabe perfeitamente o bordão “Freud explica”. Enquanto não vermos pessoas sendo condenadas por esse crime, haveremos de continuar liderando o ranking de país que mais mata pessoas LGBTQI+. Parece mentira, considerando tantos países fundamentalistas religiosos no mundo, o Brasil lidera mundialmente em homicídios por questões de orientação sexual.

Os discursos sempre são em busca de apoio no imponderável, ou seja, no que não se pode comprovar – no divino. Todavia, qualquer pessoa com um mínimo de discernimento não pode conceber que Deus seja este ser de maldade extrema, diante do que se atribui a ele. Ademais, disse Jesus, está em Mateus 7:9-11: “― Qual homem, do meio de vocês, se o filho pedir pão, lhe dará uma pedra? Ou, se pedir peixe, lhe dará uma cobra? Portanto, se vocês, apesar de serem maus, sabem dar boas coisas aos seus filhos, quanto mais o seu Pai, que está nos céus, dará coisas boas aos que lhe pedirem!”. Simples assim.

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