Uma se agiganta, outro se apequena

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Uma se agiganta, outro se apequena

Coloquei em meu Instagram, que pode dizer o que quiser de Daniela Mercury, mas ela se entrega aos seus ideais e verdades. A coragem de Daniela Mercury sempre se destacou na cena cultural brasileira, mas há episódios que a colocam de maneira ainda mais emblemática como uma voz solitária, capaz de se arriscar quando outros preferem o silêncio. Num contexto em que muitos artistas baianos, por aqui – Salvador -, reconhecidos nacionalmente, optaram por não se pronunciar em momentos de tensão política e social, Daniela ergueu sua voz. A sua postura foi menos a de quem busca protagonismo individual e mais a de quem entende que a democracia se sustenta também pelo gesto de dizer o que é incômodo. Um paralelo possível foi a atuação de Adelmo Casé, não vi outros, que, em outra chave, não se eximiu de expressar posicionamentos firmes quando percebeu ameaças ao convívio democrático.

Esse contraste entre a coragem individual e o silêncio coletivo leva a uma reflexão sobre a fragilidade das democracias diante de uma sociedade que, muitas vezes, só reage quando o preço do silêncio se torna insuportável. Daniela, em seus campos, rompe a lógica da acomodação, revelando que a cultura e a comunicação não são apenas entretenimento, mas instrumentos de resistência.

Porém, lamentavelmente, no outro extremo, há situações que escancaram comportamentos incompatíveis com princípios básicos de razoabilidade e pluralismo. O episódio envolvendo a esposa do ministro Alexandre de Moraes, sancionada junto à sua empresa pelo governo americano, sob uma legislação estrangeira que atua como braço extraterritorial, expõe uma distorção preocupante. Trata-se de uma sanção que, mais do que atingir um indivíduo, levanta dúvidas sobre o respeito a garantias internacionais fundamentais. A medida parece menos um ato jurídico equilibrado e mais um gesto de poder que ignora fundamentos democráticos de soberania, consequentemente de respeito. Certos políticos não entendem que tudo na vida é uma onda, que pode vir forte, mas passa, quando não se arrebenta na praia. Quando colocamos lado a lado a coragem de quem fala  em defesa da democracia e  de quem busca punição para o seu país, percebemos dois polos de um mesmo dilema. O primeiro é a força do gesto individual que inspira coletividade; o segundo, o perigo do personalismo antidemocrático, que impõe sanções sem debate nem legitimidade ampla.

Assim, a avaliação crítica passa por reconhecer que a democracia não se sustenta apenas em normas escritas, mas também em práticas: a prática da coragem, do risco assumido, da palavra que se lança mesmo sem coro de apoio; e, por outro lado, a prática deletéria de transformar poder em instrumento de intimidação. O comportamento coletivo democrático deveria ser o de somar vozes, não o de se calar esperando que poucos assumam a linha de frente.

Por fim, no balanço, Daniela Mercury encarna a potência transformadora do gesto individual que inspira outros a repensarem seu silêncio. Já as sanções sem critério contra a esposa de Alexandre de Moraes simbolizam o risco de se abandonar a lógica da democracia para buscar a lógica da força. Entre esses extremos, cabe à sociedade escolher se seguirá pelo caminho da acomodação que legitima abusos ou se buscará, pelo exemplo de vozes corajosas, construir uma cultura coletiva de verdadeira democracia.

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