Arthur Val, o "Mamãe Falei", já respondeu na Justiça por assédio contra adolescentes em Curitiba
Advogada de um dos casos, Tânia Marinho compartilhou carta após áudio vazado e disse que deputado "confirmou mais uma vez quem é"
Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal
Deputado estadual pelo Podemos, Arthur do Val, conhecido como 'Mamãe Falei' já foi acusado criminalmente, em 2016, por importunação ofensiva (hoje, importunação sexual) contra menores meninas de 18 anos.
Advogada de uma das adolescentes que teriam sido assediadas no Colégio Estadual do Paraná, em Curitiba, Tânia Tamandarino relembrou o caso após vazar um áudio do deputado afirmando, na Ucrânia, que as refugiadas entre o país e a Eslovênia "são fáceis porque são pobres".
Em carta compartilhada no fim de semana, Tânia lembrou das agressões sofridas por sua cliente, que, no dia 19 de outubro de 2016, aos 17 anos, teria sido alvo de ataques por Arthur do Val, na época ele era ainda apenas youtuber.
Segundo a advogada, ele filmava meninas durante uma ocupação na escola. "Umas das graves ofensas proferidas pelo delinquente foi dizer às estudantes que ali estavam, palavras chulas e de conotação sexual, tais como: 'vocês são todas gostosas, se me acharem bonito é só chegar; posso beijar todas as meninas'", revela Tânia.
"Ele era apenas o dono de um canal no Youtube, chamado “Mamãe Falei”, que vivia de provocações políticas e outras baixarias que eram práticas constantes no MBL, movimento financiado pelos políticos da vez que melhor patrocinem os mercenários conservadores, oscilando, ora com Bolsonaro, ora com Sérgio Moro, mas sempre com o verniz nazistificado, inconfundível", acrescenta.
Na época, com 30 anos, Arthur do Val teria sido afastado do colégio após passar a mão pela lateral do seio de algumas estudantes, entre elas a adolescente que procurou um advogado para dar queixa após o ocorrido.
"Como naquele dia a Polícia Civil do Paraná estava em greve, a Delegacia da Mulher, que fica logo ao lado do local dos fatos, recebeu Karol para o registro da ocorrência. Se dizendo agredido, o Mamãe Falei também adentrou a Delegacia da Mulher e exigiu registrar um boletim de ocorrência. Durante sua permanência naquela delegacia, ele transmitia ao vivo em seu canal, fazendo uso de palavras desrespeitosas, que distorciam a verdade dos fatos e debochavam da instituição de polícia, que é a Delegacia da Mulher", conta Tânia Mandarino.
Na carta divulgada, a advogada apresenta documentos que comprovam a ocorrência registrada. O delegado na época escolhido peça família da adolescente teria denunciado o ato como estupro de vulnerável, mas "por determinação policial de plantão, tipificou-se o crime, no Boletim de Ocorrência, como importunação ofensiva", que hoje tem a classificação de importunação sexual.
"Nesse particular, é preciso informar que o artigo 217-A do Código Penal Brasileiro tipifica como estupro de vulnerável não só a conjunção carnal, mas também a prática de qualquer outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos e prevê uma pena para o crime, que é a reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos", escreve Tânia, em carta pública.
Na época, Arthur do Val utilizou suas redes sociais e disse que estava sendo acusado por estupro indevidamente:
"Me lembro que, após ter sido procurada por estudantes secundaristas, recebi a adolescente acompanhada de sua Mãe e Irmã, numa sexta-feira, já tarde da noite, no escritório", conta Tânia. Ela relata que a estudante sofria ameaças e tinha medo de sair de casa, pois passou a ser atacada na internet pelos seguidores de Arthur do Val. O caso foi denunciado pelo portal Jornalistas Livres, que ouviu o depoimento de outras estudantes.
"Enviamos a notícia do fato para a Promotoria da Vara de Infrações Penais contra Crianças e Adolescentes de Curitiba. Mas a Promotora preferiu arquivar, entendendo tratar-se de contravenção penal chamada à época de “importunação ofensiva” (hoje, importunação sexual). E remeteu a questão para um dos Juizados Especiais Criminais de Curitiba. Tivemos que peticionar pedindo que o segredo de justiça fosse respeitado, porque nem em segredo estava o processo que fora remetido para o Juizado especial Criminal, já que se tratava de uma adolescente submetida à importunação sexual por um homem de 30 anos", relata a advogada.
Arthur Modelo do Val teria ido a Curitiba responder pela ação em uma audiência preliminar criminal. O caso, contudo, foi arquivado por insuficiência de provas. Conforme conta a advogada em sua carta, a adolescente na época já apresentava sinais de exaustão sobre o caso e se sentia constrangida. Ela teria perdido o pai enquanto o processo corria, sem muito sucesso para sua parte.
"Bastante deprimida à época, ela não teve animo para colacionar as provas necessárias à condenação do delinquente naquele termo circunstanciado, e o processo criminal acabou sendo arquivado por justa causa. Dois anos depois, quando já atingira a maioridade, Karol foi chamada para responder uma ação de danos morais, movida contra ela por Arthur Moledo Val. O meliante, aproveitando-se do arquivamento do feito criminal por falta de provas, foi para um juizado especial cível pedir a condenação da jovem que ele importunara sexualmente. Reivindicou R$15 mil como indenização por ter sofrido “enorme preocupação e angústia” quando ela o denunciara", escreve Tânia Mandarino.
Ao receber a citação, a cliente telefonou para Tânia pedindo ajuda em sua defesa, relatando que não queria reviver o transtorno sofrido. "Estava noiva, pretendia se casar e esse assunto a constrangia demais. Tudo o que ela queria era colocar um ponto final no assunto, sem ser condenada a indenizar aquele ser abjeto que a ofendera", diz a advogada.
A advogada teria dito na época à jovem que faria sua defesa, mas apenas se pudese fazer uma ofensiva reunindo provas contra Arthur do Val. A jovem teria relutado, procurando outro advogado para apenas encerrar o caso. "Quando se deu conta, estava sozinha com Arthur Modelo do Val e seu advogado numa audiência de conciliação — a primeira que aconteceu no processo cível".
Depois disso, a moça retomou o contato com Tânia Mandarino e aceitou que a defesa fosse feita nos termos que a advogada julgasse necessário. No decorrer do processo, a advogada ganhou a ação. "Somente depois da audiência, quando a sentença foi homologada por um juiz togado, que percebi que a juíza que conduzira a audiência era uma juíza leiga (figura institucional nos juizados, que é uma operadora do direito comum que passa numa seleção para presidir audiências e dar sentenças que na sequência são homologadas pelo juiz togado). Arthur Moledo Val perdeu a ação, mas a juíza também não deferiu o pedido contraposto [contra sua cliente], para que fosse indenizada por ele, amplamente fundamentado". relata.
Após o áudio recente do deputado citando as ucraniana, a advogada revisitou o caso. Disse que encontrou a juíza em questão no Facebook e constatou que "ela é totalmente bolsonarista", mas que reconhece que, "apesar de ter omitido em tutelar os direitos" de sua cliente na sentena, "a juiza leiga conduziu a audiência com muita firmeza, competência técnica e dignidade".
Na ocasião, atendendo ao desejo da jovem, Tânia não recorreu e pela indenização e o caso foi dado por encerrado. Após o áudio, retomou o contato com sua cliente e pediu autorização para revelar, por meio de carta pública, sua história. A jovem autorizou e teria dito "obrigada por compartilhar comigo e lembrar que nenhuma luta é em vão".
"Eu já enviei o áudio para a Promotora que havia dito que o Mamãe Falei não cometera crime contra a adolescência [de sua cliente]. Foi para conhecimento… Essas coisas sempre podem enriquecer o trabalho de uma operadora do direito. [...] Arthur Moledo Val confirmou mais uma vez quem é. Dessa vez na Ucrânia, ao lado do mesmo Renan que o acompanhava durante as provocações delituosas a estudantes em Curitiba", concluiu Tânia Mandarino.eres, que viajaria a outros países para ficar com refugiadas.