Consumo abusivo de álcool entre jovens prevalece no Brasil enquanto mundo vê redução
No Reino Unido, um terço dos jovens de 18 a 24 anos diz não consumir bebida alcoólica

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Os números do hemisfério norte são claros: Estados Unidos, Reino Unido e outros países registram queda consistente no consumo de álcool entre jovens.
Estudo da consultoria Gallup publicado em 2023 indica que, nos EUA, 62% dos adultos de 18 a 35 anos dizem beber, uma diferença de dez pontos percentuais em relação a duas décadas atrás, quando 72% faziam essa afirmação.
No Reino Unido, um terço dos jovens de 18 a 24 anos diz não consumir bebida alcoólica, de acordo com um relatório da Mintel também de 2023. Além disso, os que dizem beber associam o álcool a celebrações e momentos de relaxamento ocasionais.
Ainda nos Estados Unidos, pesquisa da consultoria Statista mostra diferenças com relação ao tipo de bebida consumida pela geração Z. Americanos nascidos entre 1995 e 2002, por exemplo, consomem menos cerveja e vinho do que todas as gerações que os precedem. Eles ganham dos baby boomers e da geração X apenas no consumo de "hard seltzer", um tipo de bebida gaseificada com álcool. Para esse levantamento, também divulgado em 2023, foram entrevistadas 10 mil pessoas.
A tendência se confirma em âmbito global. Segundo dados da OMS (Organização Mundial da Saúde), 26% dos jovens de 15 a 19 anos diziam consumir álcool em 2016, número que caiu para 22% em 2019.
Ainda de acordo com a OMS, o consumo anual de bebida alcoólica caiu de 5,7 litros por pessoa, em 2010, para 5,5 litros em 2019. No Brasil, que bebe mais que a média global, o consumo também caiu: passou de 8,6 litros per capita em 2010 para 7,7 litros em 2019.
A queda do consumo entre os jovens, porém, é incerta por aqui.
Dados de pesquisa Covitel publicada em 2023 indicam redução na prevalência de consumo regular de álcool (três ou mais vezes na semana) entre os jovens de 18 a 24 anos. De 10,7% antes da pandemia para 10,5% em 2022 e 8,1% em 2023.
A mesma pesquisa, contudo, mostra que o consumo abusivo de álcool (cinco doses ou mais em uma mesma ocasião, para homens, e quatro doses ou mais, para mulheres) aumentou nessa faixa etária mais jovem -de 25,8% em 2022, para 32,6% em 2023.
Nos EUA, um percentual bem menor de jovens relata consumo abusivo de álcool: 6,9% na faixa dos 18 aos 25 anos, segundo dados da National Survey on Drug Use and Health de 2023, uma pesquisa nacional direcionada ao uso de drogas e álcool.
Conduzida pela organização Vital Strategies, a pesquisa Covitel entrevistou 9.000 pessoas a partir dos 18 anos nos primeiros bimestres de 2022 e 2023.
A pesquisa Vigitel, realizada pelo Ministério da Saúde, também traz números preocupantes sobre abuso de álcool. No levantamento de 2023, 21,4% dos jovens entre 18 a 24 anos relatam consumo abusivo de álcool. Em 2020 foram 25%, e em 2016, 22,1%. Para a Vigitel, ao menos 21 mil brasileiros são entrevistados por telefone.
De acordo com a socióloga Mariana Thibes, do CISA (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool), mensurar "a quantidade ingerida é mais importante do que a frequência".
"É pior consumir seis ou sete doses por vez do que fatiar isso em vários dias", afirma.
Para Luciana Sardinha, diretora da Vital Strategies, as restrições existentes nos Estados Unidos para a venda de bebidas alcoólicas têm efeitos positivos na redução do consumo. Ela avalia que o Brasil precisa de mais fiscalização na venda e também maior taxação a esses produtos.
Talita Di Santi, professora do Instituto de Psiquiatria da USP (Universidade de São Paulo), afirma que faz diferença pensar nas condições sociais e econômicas dos países em que se observa uma redução no consumo. São, segundo ela, lugares em que há mais atenção para a saúde mental, inclusive de crianças e adolescentes.
"Os adolescentes e adultos jovens que bebem hoje têm mais acesso à informação. Eles sabem mais sobre riscos, quantidades, tipos de álcool", diz.
No Brasil, chama a atenção o aumento mais pronunciado de consumo na segunda faixa etária mais jovem, dos 25 aos 34 anos, constatado na pesquisa Vigitel. Entre eles, 29,8% relataram consumo abusivo em 2023. Em 2020, foram 30,9%, e em 2016, 25,8%.
Também há crescimento na faixa dos 45 aos 54 anos. Em 2023, o consumo abusivo atingiu 21,1% dos entrevistados. Em 2020 e 2016 o percentual registrado foi de 18,2% (nos dois anos).
As faixas seguintes, de 55 a 64 anos e de 65 anos ou mais, apresentam aparente estabilidade, com oscilações. Dos entrevistados do primeiro grupo, 11,5% disseram ter bebido de forma abusiva na pesquisa de 2023. Em 2020, eram 13,8% nessa condição e, em 2016, 12,6%. Entre aqueles com 65 ou mais, 5,4% dizem ter exagerado na bebida na pesquisa de 2023. Em 2020, eram 5,7% e, em 2016, 4,6%.
Mariana Thibes avalia que "é difícil cravar uma tendência" de redução ou aumento do consumo no Brasil. "É um país grande, diverso e com várias culturas relativas à bebida", afirma.
Um relatório do CISA com dados da Vigitel de 2010, 2021 e 2023 mostrou que o Norte é a única região que apresentou queda no consumo abusivo de álcool no país -de 18,3% em 2010 para 16,4% em 2023. No Centro-Oeste e no Sul, por outro lado, houve aumento no período: de 18,7% para 23,6%, e de 15,3% para 20,7%, respectivamente.