Flávio Bolsonaro disse ganhar R$ 57 mil, metade com chocolates, ao fazer empréstimo por mansão
Desse total, R$ 24.934,81 (44%) viriam do salário como parlamentar

Foto: Reprodução/TV Senado
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) declarou renda mensal de R$ 56,8 mil ao BRB (Banco de Brasília) para obter um financiamento de R$ 3,1 milhões na compra de uma mansão em 2021. Do total, mais da metade dos ganhos informados viria da franquia de chocolates da qual era sócio.
Os números são citados nos autos de uma ação popular movida pela deputada Erika Kokay (PT-DF), que questiona a legalidade do empréstimo para adquirir o imóvel com valor total de R$ 5,97 milhões, em Brasília. A parlamentar apontava suposto favorecimento em razão da posição de Flávio como senador e filho do então presidente Jair Bolsonaro (PL).
Como revelou a Folha de S.Paulo, a defesa de Flávio chegou a argumentar que parte da renda dele vinha do trabalho como advogado embora ele não tivesse processos registrados nas duas unidades federativas onde tem inscrição válida na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Rio de Janeiro e Distrito Federal.
De acordo com os documentos apresentados nos autos, Flávio declarou ao BRB ter renda mensal de R$ 56.833,51.
Desse total, R$ 24.934,81 (44%) viriam do salário como parlamentar, R$ 3.372,87 (6%) de aplicações financeiras e R$ 28.525,83 (50%) de uma franquia de chocolates. Nenhuma renda do trabalho como advogado foi informada.
Já a esposa, Fernanda Bolsonaro, teve renda presumida de R$ 8.650, segundo dados obtidos pelo banco por meio do Serasa. A soma dos rendimentos do casal totalizou R$ 65.483,51.
Com atualização pela inflação, o total declarado pelo casal naquela época equivale a R$ 85 mil em valores de hoje, e o valor financiado representa cerca de R$ 4 milhões.
Flávio deixou gestão da loja de chocolates, no Rio de Janeiro, em fevereiro de 2021, dias após a assinatura do contrato da casa. Mesmo assim, ele alegou na ocasião ter usado o dinheiro da loja para ajudar a pagar o valor de entrada da mansão.
O BRB afirmou nos autos que a taxa de juros e o prazo do empréstimo estavam dentro das condições praticadas pelo mercado e disponíveis a qualquer cliente, com centenas de contratos semelhantes firmados no mesmo período.
O banco disse ainda que o financiamento teve como garantia fiduciária o próprio imóvel, avaliado em quase R$ 6 milhões, o que mitigaria eventuais riscos à instituição e ao patrimônio público. Segundo o BRB, não houve qualquer favorecimento, e todos os trâmites seguiram o fluxo padrão.
Após análise do caso, o MPDFT (Ministério Público do Distrito Federal e Territórios) apontou que a operação seguiu os manuais internos do BRB e usou como base documentação fiscal, bancária e contábil que comprovaria a renda do casal, incluindo atividades empresariais de Flávio e a atuação de Fernanda na odontologia.
A manifestação foi assinada pelo promotor Eduardo Gazzinelli Veloso. Ele é também o titular do inquérito civil aberto em abril para investigar a aquisição de 58% das ações do Banco Master pelo BRB.
Segundo o Ministério Público, "a proposta dos compradores seguiu a tramitação e os normativos previstos para a negociação" e não houve indícios de que o BRB tenha flexibilizado regras em benefício do senador. A visão é que a instituição também apresentou garantias suficientes.
Além disso, foi destacado que o contrato já se encontra integralmente quitado, o que afasta, segundo o Ministério Público, qualquer alegação de risco ou prejuízo ao patrimônio público.
"Não prevalece a suposição de irregularidade na formação do ato, ante a existência da documentação que deu lastro ao pedido e da análise realizada pela instituição financeira", afirmou o promotor.
O financiamento de R$ 3,1 milhões foi quitado em 2024 em seis parcelas, com valores de R$ 198 mil a R$ 997 mil. Em março de 2024, o senador pagou R$ 520 mil e quitou a mansão. Antes disso, fez pagamentos de R$ 698 mil e R$ 697 mil em novembro de 2022, de R$ 997 mil em janeiro de 2023, de R$ 250 mil em agosto de 2023 e de R$ 199 mil em setembro passado.
O filho do ex-presidente declarou à Justiça Eleitoral em 2018, última vez em que se candidatou, patrimônio de R$ 1,7 milhão (R$ 2,4 milhões em valores atualizados pela inflação).
A compra da mansão foi revelada no início de 2021. Na ocasião, Flávio disse que o dinheiro ganho como empresário permitiu realizar o negócio, mas não fez menção a recursos recebidos como advogado. A justificativa foi apresentada na ação no TJDFT (Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios) movida por Kokay.
A deputada questionou a capacidade do senador de obter um financiamento no BRB de R$ 3,1 milhões montante de que necessitava para completar a compra do imóvel, de R$ 5,97 milhões.
Kokay argumentou ainda que os ganhos como parlamentar são decorrentes de mandato eletivo com prazo definido, uma vez que o mandato de Flávio no Senado acaba no início de 2027 e o contrato de financiamento tinha duração de 30 anos.
Para rebater a argumentação da deputada, a defesa de Flávio apontou no processo que a renda familiar dele não se restringia à "atividade parlamentar, visto que o mesmo atua como advogado, além de empresário e empreendedor, por muitos anos".
O processo segue em tramitação na 1ª Vara Cível de Brasília e está pronto para ser julgado.
Flávio foi procurado, mas não houve resposta até a publicação desta reportagem. O BRB não se manifestou.