Justiça impede Funai de distribuir lona a indígenas de ocupação no PR
Juiz alega que entrega de material contraria o propósito de desocupação
Foto: Eloy Terena/Instagram
A Justiça Federal no Paraná determinou que a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) se abstenha de entregar lonas, madeiramento, ferramentas e outros materiais que possam ser utilizados para construção de moradias às comunidades indígenas que ocuparam imóveis rurais das cidades de Guaíra e Terra Roxa, no oeste paranaense.
A sentença foi proferida na última terça-feira (23), pelo juiz federal João Paulo Nery dos Passos Martins, da 2ª Vara Federal de Umuarama. A Funai informou à Agência Brasil que recorrerá da decisão.
O juiz afirma que a entrega dos materiais de construção pela Funai contraria “o propósito de desocupação do imóvel” manifesto nas “ordens judiciais vigentes”, que determinam “expressamente a desocupação dos imóveis pelos indígenas”.
A manifestação judicial ocorre após a coordenação regional da Funai solicitar o apoio da Polícia Federal para entregar kits de suprimentos aos avá guarani, que participam do que os indígenas classificam como um processo de retomada de seus territórios originários.
Na última sexta-feira (19), João Paulo Nery dos Passos Martins autorizou a reintegração de posse de áreas rurais que grupos avá guarani ocuparam a fim de cobrar a conclusão do processo demarcatório do território já delimitado pela Funai e em disputa, na Justiça, desde 2018.
Segundo o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) 22 famílias avá guarani que ocupam parte do território já delimitado para dar lugar à futura Terra Indígena Guasu Guavirá se espalharam, ampliando a ocupação. De acordo com a pasta, isso aconteceu “porque a comunidade em que vivem já não comporta mais habitantes.”
“As famílias foram, então, alvo de ataques de ruralistas”, relatou o MPI, destacando que nem mesmo a presença de agentes da Força Nacional de Segurança Pública na região intimidou os agressores. “Entre os feridos, um indígena foi baleado. Além da violência física sofrida pelos avá guarani, doações e entrega de alimentos foram impedidas de serem realizadas no local por ruralistas”.
Em razão da violência, o governo federal organizou um grupo com representantes de várias pastas e órgãos públicos, incluindo MPI e Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, para tentar mediar os conflitos em Mato Grosso do Sul e no Paraná. Uma comitiva esteve em Guaíra, na terça-feira (16).
Em nota, o Ministério dos Povos Indígenas atribuiu o aumento da “instabilidade” à aprovação da Lei 14.701/23, que, na prática, estabelece o chamado marco temporal – tese segundo a qual os povos indígenas só têm direito aos territórios originários que já ocupavam ou reivindicavam até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
O Congresso Nacional aprovou a lei em setembro do ano passado, poucos dias após o Supremo Tribunal Federal (STF) apontar a inconstitucionalidade da tese.