O retorno ao habitat

Com as praias vazias, uma tartaruga marinha foi flagrada na terça-feira (16) depositando ovos nas imediações do Barravento, no bairro da Barra, em Salvador. Sem a presença de humanos, digamos, em seu habitat, o reptil volta a ocupar um espaço do qual foi indiretamente desalojada – há décadas, entendeu que uma praia repleta de seres de outra espécie colocava em risco a gestação e nascimento dos seus filhotes. 

Como um chamado da natureza, com um sentido que jamais compreenderemos em sua totalidade, a tartaruga compreende que, em areias limpas e sem a agitação humana, é novamente um local seguro   para germinar o futuro. Entretanto, mal sabe ela que, daqui a pouco, sentirá o alerta para recuar, se esconder e manter os ovos longe daquele espaço.

É bem provável que o retorno da humanidade a alguns espaços, que habitávamos antes da pandemia, aconteça com a mesma cautela e senso de desbravamento como possivelmente aconteceu com a tartaruga marinha, redescobrindo um local que lhe pertenceu – sem perigos – há anos longínquos. 

Também fomos irremediavelmente desalojados de espaços públicos, por conta de um vírus letal, silencioso e não raramente enigmático. O retorno a estádios de futebol, restaurantes, hotéis, cinemas, praças públicas, casas de shows, ou mesmo movimentos como o turismo pelo mundo, sem dúvida virá com um certo receio, uma fagulha de medo.

Mas deve vir, sempre, com confiança, esperanço, senso desbravador e ocupar, como fez a tartaruga, velhos espaços. O ideal, mesmo, é que este retorno seja amparado por empatia e solidariedade – por que não forçar um novo mundo, um novo jeito de conviver em sociedade? Podemos, inclusive, começar hoje mesmo nas imediações do Barravento, dando segurança às tartarugas marinhas a depositar ali seus ovos, respeitando o elo natural desta ação, mesmo quando as prais forem novamente reocupadas por nós, humanos.