Projeto musical no sertão da Bahia se destaca por produzir instrumentos a partir de planta
Grupo já realizou concertos internacionais e possui uma orquestra completa com instrumentos extraídos do Sisal

Foto: Reprodução I Instagram (@somdosisal)
A música tem o poder de transformar vidas, aguçar a criatividade e dar prazer as pessoas. São diversos os instrumentos musicais que existem no mundo, dentre os de corda, sopro, percussão e outros. Mas alguém já ouviu falar de instrumentos feitos do Sisal?
Sim, a planta sisal é capaz de servir de material para a construção de instrumentos musicais, e foi exatamente por causa dela que surgiu um projeto social no interior da Bahia, batizado de "O Som do Sisal".
A ideia surgiu em 2012, quando um dos fundadores do projeto, Josevaldo Nim, depois de ser premiado por um programa cultura do banco Itaú, viajou para o povoado em Tocantins onde conheceu uma comunidade que transformou um buriti em uma viola.
"Percebi que havia bastante semelhança entre a madeira de buriti e a madeira de sisal. Quando retornei da viagem trouxe um instrumento e convidei meu primo, Webson Santana, que até então trabalhava como pedreiro. Ele topou o desafio de construir o instrumento musical. Desde então a gente vem realizado ações e projetos que transformou esta ideia inicial no que hoje é o projeto Som do Sisal", disse Josevaldo.
Primórdios do grupo
Tocar com o Sisal surgiu em 2012, mas a história do grupo surgiu há muito mais tempo. Vindo de uma família grande de músicos da zona rural de Conceição do Coité, Josevaldo aprendeu a tocar bateria com latas quando tinha apenas 12 anos, vindo formar sua primeira banda aos 15 anos.
Em 2007, o irmão da mobilizadora social da comunidade local enviou um dinheiro para Josevaldo, arrecadado em um trabalho feito nos Estados Unidos, do qual Josevaldo usou para comprar os instrumentos e pôr em prática a ideia do projeto.
"Começamos com 15 violinos e a cada ano era realizada uma nova feijoada e novos instrumentos eram adquiridos. Tivemos muitos avanços e pouco tempo depois o projeto que atendia 15 crianças e adolescentes passava a atender 150. Construímos uma sede e conquistamos apoio para a realização das atividades", contou o músico.
Logo depois da formação do projeto, em 2012 os membros do mesmo passaram a utilizar os instrumentos feitos do Sisal.
Em 2018, o grupo conseguiu formar uma orquestra completa com instrumentos de sisal e realizaram uma tour por 10 cidades do território do sisal.
"A ação de construção de instrumentos musicais nasce como um alternativa para conseguir mais instrumentos musicais a baixo custo e de criar um projeto novo, com a cara da nossa cultura do interior da Bahia, região do sisal. Os jovens músicos passam a multiplicar aquilo que aprendem. Realizamos diversas oficinas de construção de instrumentos musicais, iniciação na música e de técnica para que eles pudessem tocar os instrumentos feitos com a madeira de sisal", afirmou Josevaldo.
Do sertão para o mundo
O projeto abriu portas para vários jovens, que segundo Nim, tiveram acesso ao ensino superior em música, em universidades federais e estaduais e até no exterior.
E sobre música no exterior, o grupo também já fez apresentações internacionais, tocando no México e na Espanha.
"Essas apresentações internacionais tem uma importância muito grande na vida desses jovens. São oportunidades de ganhar uma nova leitura de mundo e compreender que é possível ir muito mais além através da arte", alega Nim.
O projeto vem alcançando voos cada vez maiores, cobrindo agora duas comunidades no interior da Bahia com aulas de música gratuitas, contando com um grupo que realiza apresentações artísticas do forró-pé-de-serra, além de uma loja online para a comercialização dos instrumentos.
"Nossa fábrica está a todo vapor e a lojinha online já começou a receber encomendas de instrumentos musicais. Com a parceria estabelecida com o projeto na Espanha, aguardamos em breve receber o maestro construtor de tambores e diversos instrumentos musicais com agave (sisal que produz fibra)", declarou Josevaldo Nim.
E o futuro?
O grupo agora almeja a construção de sua própria fábrica, criação do museu do sisal e um espaço maior para a expansão do projeto que almeja o desenvolvimento de outras atividades socioculturais.
"Com o aumento da faixa etária dos jovens que ingressaram no projeto, um dos principais desafios é conseguir sustentabilidade para as nossa ações, gerando trabalho e renda para a juventude envolvida no projeto".
A música realmente tem o poder extraordinário de mudar a vida das pessoas e reformular a visão de mundo de muita gente, especialmente os moradores do sertão brasileiro que passam por muitas dificuldades.
O Sisal no sertão era lembrado ao trabalho da extração do mesmo, onde muitos trabalhadores eram mutilados, perdendo membros do corpo ou até mesmo a visão. Com a novidade deste projeto, muitas pessoas ficaram surpresas e orgulhosas de como um trabalho árduo pode se transformar em algo tão belo.
"Esse é um trabalho de ressignificar o som batido do motor do sisal pela poesia das violas", confirma Josevaldo Nim.