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Tráfico de pessoas no Brasil: uma realidade alarmante e desafiadora

Este domingo (30) é dia mundia de combate ao crime

Por Stephanie Ferreira
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Tráfico de pessoas no Brasil: uma realidade alarmante e desafiadora

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

De 2017 a 2020, 499 pessoas foram resgatadas pela Rede de Núcleos de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Postos Avançados de Atendimento Humanizado ao Migrante (Rede NETP / PAAHM). Segundo o Ministério da Justiça, há uma enorme subnotificação sobre o crime de tráfico de pessoas no país. Este domingo (30), é o Dia Mundial contra o Tráfico de Pessoas que visa alertar as pessoas sobre a prática. Os dados são do último Relatório Nacional sobre Tráfico de Pessoas. 

O crime, popularmente mais conhecido pelo tráfico sexual tem outras vertentes. De acordo com a Lei 13.344/2016, são cinco finalidades para o tráfico de pessoas: para fins de remoção de órgãos, tecidos ou partes do corpo; para submeter a pessoa a trabalho em condições análogas à escravidão; para fins de servidão; tráfico para adoção ilegal; e tráfico para exploração sexual.

O tráfico para exploração sexual e para o trabalho análogo ao de escravo são as modalidades mais recorrentes. Na Bahia, nos últimos meses, vários casos foram registrados de pessoas encontradas nestas condições. Além disso, baianos também foram resgatados em outros estados na mesma situação.

Segundo o delegado Bruno Andrade Marconi da Delegacia Regional de Defesa social e institucional da Polícia Federal da Bahia, não há dados concretos ainda no estado por conta da subnotificação. “Esse é um grande problema de todas as estatísticas criminais no Brasil”.

Mulheres e crianças migrantes, afrodescendentes e minorias sociais são os principais alvos deste crime. O relatório aponta um perfil de vítimas associada a uma vulnerabilidade social que impulsiona que a pessoa consinta, mesmo sem o uso da violência física,  com a prática sem ter real noção da gravidade. 

“Ainda existe aquela situação da pessoa que vem do interior, criança ou adolescente para trabalhar numa casa de família e permanece por 10, 20, 30,50 anos quase sem qualquer tipo de suporte da legislação trabalhista. Esse é um tipo de vítima muito comum. Nas regiões de cidades menores, regiões mais Isolados do nosso interior, também é muito comum a exploração de pessoas que atuam na lavoura, que trabalha em indústrias mais desgastantes”, aponta o delegado.

O Relatório mostra uma incidência ainda maior para mulheres e meninas que, na maioria dos casos, sofrem com a exploração laboral e sexual simultaneamente. Segundo o estudo, entre as mulheres vítimas, 77% foram traficadas para a exploração sexual, 14% para a exploração laboral e 9% para outras formas de exploração. Sendo o trabalho doméstico o principal local. 

O Ministério da Justiça classifica o Brasil como um país de origem do tráfico já que muitos brasileiros são vítimas do crime no exterior, mas também de destino, por conta do alto fluxo migratório relacionado às crises econômicos ou civil em outros países. Além disso, também é um país de trânsito por servir como conexão entre a América do Sul e boa parte da Europa, Oriente Médio, África e América do Norte. 

O combate à pratica no país é realizado em conjunto com a Polícia Federal (PF), Defensoria Pública e o Poder Judiciário. No estado baiano, a superintendência da PF atua em Salvador e em outras cinco delegacias situadas em Barreiras, Juazeiro, Vitória da Conquista, Porto Seguro e Ilhéus, além de um posto policial em Feira de Santana. 

Os dois setores que registraram as denúncias são canais destinados à violência de gênero (Ligue 180) e a violações de direitos humanos (Disque 100). Ao todo, de 2017 a 2019, o Disque 100 recebeu 388 denúncias, já o Ligue 180, foram 510 – somando todas as modalidades do crime.  

O delegado Bruno Marconi ressalta que as pessoas também podem denunciar para a Polícia Federal e que é importante passar todas as informações possíveis.  “Seja através do nosso plantão policial, por telefone ou presencialmente, a pessoa vai ser encaminhada para o órgão responsável para cada caso. Para denúncias anônimas existem algumas restrições, algumas reservas e impedimento jurisprudenciais da Justiça da necessidade de elementos mais concretos para que seja viável a efetiva o início da investigação. Quanto mais detalhes mais sucesso teremos no decorrer das investigações”, afirma. 

O impacto da pandemia no tráfico de pessoas 

O estudo apontou ainda que a médio e longo prazo, a recuperação econômica desigual dos países pode aumentar a migração laboral irregular e o contrabando de migrantes para nações com recuperação mais rápida.

No Brasil, o número de vítimas resgatadas de trabalho forçado permaneceu estável durante a pandemia, sem redução significativa. Isso sugere que a crise não freou o tráfico de pessoas para exploração laboral, conforme o Ministério da Justiça.

Mulheres Venezuelanas em situação de vulnerabilidade no Brasil

Cerca de 48% da população migrante venezuelana no Brasil – até 2020, são mulheres, mas quando se trata da formalidade no mercado de trabalho, elas são minorias. Em 2019, apenas 5.936 mulheres foram admitidas, em contraste com 14.801 homens, apontando uma clara discrepância nos direitos e oportunidades de melhoria de vida entre os gêneros.

O deslocamento dessas pessoas da Venezuela para o Brasil é acompanhado por uma série de riscos, tanto durante a jornada como na chegada aos países de destino. Sequestro, extorsão e tráfico de pessoas são algumas das ameaças enfrentadas por esses migrantes. A situação já era grave antes da pandemia, e a emergência sanitária provavelmente agravou ainda mais a vulnerabilidade dessas pessoas.

Recente pesquisa do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime sobre tráfico de pessoas no fluxo migratório venezuelano trouxe à tona inquéritos e processos judiciais relacionados a situações de tráfico para fins de servidão e exploração laboral. O relatório também apontou outras formas possíveis de exploração, como exploração sexual, adoção ilegal de recém-nascidos - especialmente em Roraima, casamento servil e casos de transporte de drogas por "mulas".

Acordo Mundial

O tráfico de pessoas foi internacionalmente definido pelo Protocolo de Palermo, adotado em dezembro de 2000. O Brasil ratificou o documento em 2004, estabelecendo diretrizes fundamentais para o enfrentamento desse crime.

O Protocolo orientou a concepção da Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas em 2006, e posteriormente, a criação dos Planos Nacionais de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. 

A Lei nº 13.344 foi promulgada em 6 de outubro de 2016, e estabelece uma legislação nacional específica para o tráfico de pessoas. Essa determinação visa combater e punir de forma mais efetiva os envolvidos nesse tipo de crime.

As implicações penais do tráfico de pessoas estão definidas no Artigo 149-A do Código Penal, que define o crime de tráfico de pessoas e suas penas:
“Tráfico de Pessoas
Art. 149-A. [...]
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
§ 1º A pena é aumentada de um terço até a metade se:
I - o crime for cometido por funcionário público no exercício de suas funções ou
a pretexto de exercê-las;
II - o crime for cometido contra criança, adolescente ou pessoa idosa ou com
deficiência;
III - o agente se prevalecer de relações de parentesco, domésticas, de
coabitação, de hospitalidade, de dependência econômica, de autoridade ou de
superioridade hierárquica inerente ao exercício de emprego, cargo ou função;
ou
IV - a vítima do tráfico de pessoas for retirada do território nacional.
§ 2º A pena é reduzida de um a dois terços se o agente for primário e não
integrar organização criminosa.”

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