No frio e chuvoso mês de junho acontece o ciclo quente e fervoroso das festas de Xangô aqui no Opô Afonjá. Muitas vezes, por conta do calendário católico Gregoriano – criado em 1582 por iniciativa do Papa Gregório XIII – e seguido por todos nós aqui no Ocidente enquanto referência para a contagem dos dias, semanas, meses e anos, acontece do feriado de Corpus Christi ser no mês de junho, daí, as funções aqui no Opô Afonjá nem tem o recesso pós Oxossi. Nestes casos, os ciclos se emendam e o corre-corre se torna mais intenso.
Com datas fixas, o ciclo de Xangô começa em 23 de junho com a fogueira de Ayrá. Nas primeiras horas da manhã, as atividades começam com a montagem da fogueira. Ela tem aproximadamente dois metros de altura, é composta por grandes toras e enfeitada com palha de coqueiro. Durante muitos anos, Joãozinho (in memoriam) foi o responsável pela arrumação da fogueira, e Bispo - aquele da caminhonete do dia do Boi de Oxossi (citado em artigo anterior, também de minha autoria) - trazia os troncos de seu sítio. Após a partida de Joãozinho, Guelê - Ogan de Oxossi, juntamente com alguns outros jovens da comunidade, tomaram a frente desta missão. Quando a noite chega, todos se reúnem em torno da fogueira esperando a Iyalorixá com os Obás chegarem para dar início ao ritual. Lembro-me de Mãe Stella, imponente e de xeré na mão – chocalho de cabaça ou cobre adornado, acompanhada dos Obás, sempre ao seu lado. Com a voz baixinha por conta da idade, porém cheia de energia, Mãe Stella começava a saudar e cantar para o homenageado. Fogueira acessa; atabaques tocando; Tutuca de Iansã cantando; fogos estourando no céu; e o frio do mês de junho imediatamente começava a ser aquecido pelo fogo vivo que anuncia a chegada de Ayrá e Xangô no Aiyê – na Terra.
Quando o ritual termina no Opô Afonjá, alguns filhos ligados ao culto de Egun vão parar no Ilê Axipá, casa fundada por Deoscóredes Maximiliano dos Santos, o afamado Mestre Didi, que também era filho do Opô Afonjá. Lá acontece um ritual parecido com a fogueira de Ayrá, mas, ao invés dos Orixás dançando em torno à fogueira, são os Eguns que fazem a festa. Esta semelhança decorre pelo parentesco que Xangô tem com Babá Alapalá, Egun protetor do Opô Afonjá. O esplendor desta cerimônia vai muito além destas linhas. Portanto, vale muito à pena assistir, pois, como já disse no artigo “Egungun: a morte por debaixo do pano”: ‘o culto a Babá Egun é tão lindo quanto o culto aos Orixás’.
Em continuação do ciclo, em 28 de junho acontece a fogueira do patrono Afonjá. A sensação de bem-estar é a mesmo do dia 23, pois todos estão esperando o grande dia do Retorno da Guerra – o Abogun de Xangô, que é quando ele traz consigo o fogo da vitória – vide o artigo: “A Quaresma e o Olorogun”. Todo ritual é semelhante à fogueira de Ayrá. A Iyalorixá, juntamente com os Obás, dão início à cerimônia, e aí toda aquela energia se concentra junto aos atabaques, cânticos e fogos.
Já no dia 29 de junho, Xangô se apresenta com o fogo nas mãos, e compartilha sua vitória com todos os presentes. E como Xangô é um Orixá que gosta de festa e muita comida, seu ciclo se estende até 11 de julho, sendo que nos dias 02 e 05 de julho tem festa no barracão e no dia 11, Xangô dedica a festa a sua mãe Iyamassê.
Neste ano de 2023, no dia 05 de julho, completo 32 anos como Obá de Xangô.
Kabiêsi!
Salve a Majestade!