Em seu livro O Povo Brasileiro, o estudioso Darcy Ribeiro pontua com precisão que há uma associação da pobreza com negritude, que gera grande dificuldade de acesso e conquista, mas, também, por outro lado, há um flagrante processo de separação de natureza social entre as estratificações econômicas do povo brasileiro. Ou seja, afirma o antropólogo, que além do cruel preconceito racial que existe no Brasil, há o da questão da posição social, conforme o seu acesso a renda. Existe sim no nosso País o chamado pelos cientistas sociais o preconceito de classe social. Geralmente, verticalizado, ou seja, de cima para baixo, mas, não raro, há também em sentido contrário e linear, considerando aqui não os mais pobres, mas os viventes na bolha da classe média. Não se trata de simplificar ricos e pobres, mas de se visualizar um leque que se abre de forma tão diversa, como, efetivamente, é a nossa sociedade.
Assim, houve um grande escândalo quando jogadores de futebol puseram em suas redes o “entretenimento” de comerem carne com folhas de ouro, em performance do chef, em uma sua conhecida coreografia de lançar sal em seus pratos. Naturalmente, em um país onde milhões estão passando fome, vejo esta realidade nas portas da Cidade da Luz, bem como em nossas ações de rua, as imagens chocaram, claro que sim. É preciso, todavia, nos despirmos de um certo moralismo piegas, em dúvida se se trata disto, ou, quem sabe, desse tal preconceito social, ou inveja...a saber. Digo isso porque, a bem da verdade, todos fazemos isso em nossas redes, se não com carne e ouro, mas com o que seja proporcional ao nosso status quo de conquista. Postamos cascatas de camarão, fumegantes caçarolas de moqueca de mariscos ou simplesmente um sandubão daqueles de quase um metro de altura. Ah! É diferente, Medrado, você poderá contrapor agora...pense considerando alguém que não tem nada para comer, que está com fome, mexendo em lixo?! Poderia ser uma imagem perturbadora dessas comidas todas? Mas, possivelmente, não conheço pesquisa alguma que remeta ao uso das redes sociais por esses brasileiros, eles não vêm os nossos acintes.
A questão, então, entendo, não é do que as pessoas compram, comem com o seu dinheiro. Não. Mas se estão se mobilizando em alguma medida para também ajudar aos que definham nas calçadas, abrigos, casas de acolhimento em geral por não terem o mínimo necessário para a sustentação do funcionamento de seus corpos cansados, doentes...A questão, para mim, então, é apenas de caráter social, mas principalmente de solidariedade humana.
Por outro lado, verdadeiramente, não acho que as classes econômicas mais desfavorecidas alimentam esse preconceito, de forma alguma, porque elas estão ali em uma renhida luta que nem se dão conta dessas questões, e são solidárias. Esse preconceito, ou melhor, discriminação, se dá mesmo entre nós classe média, que vivemos em um mundo de espelhos, onde queremos nos exibir mais que os outros, em geral. Regramos que valemos pelo que temos, não pelo que somos. Lamentavelmente.