O objetivo de hoje é destacar uma questão de urgência no âmbito dos Juizados Especiais do Consumidor no Brasil, que demanda reflexão e reforma. O foco central é a observada subutilização do conceito do dano moral por parte de alguns juízes, comprometendo a eficácia desta ferramenta jurídica crucial.
Os Juizados Especiais foram concebidos como um ambiente ágil e acessível para resolver demandas de pequeno valor, com foco na proteção do consumidor. Contudo, o que se tem observado é uma disparidade alarmante no tratamento do dano moral.
Em muitos casos, as condenações são tão baixas ou até mesmo inexistentes que, na prática, a finalidade do dano moral de reparar o sofrimento e desestimular a repetição do ato ilícito é, lamentavelmente, negligenciada.
Para ilustrar essa realidade, interessante recorrer a um exemplo verídico. Uma consumidora que teve sua assinatura falsificada em contratos elaborados pela empresa e precisou perder cerca de três dias de trabalho para resolver os problemas decorrentes, teve o dano moral negado, sob a justificativa de tratar-se de um “mero dissabor” da convivência em sociedade. Ou seja, é a aceitação judicial do cometimento de um crime.
O desrespeito às normas consumeristas pelo próprio Poder Judiciário mina a confiança no sistema, comprometendo a eficácia das leis criadas para proteger o consumidor, que é a parte hipossuficiente da relação. Afinal, se nem mesmo os juízes aplicam a norma, como esperar que as empresas o façam?
É que o descaso na aplicação do dano moral pelos juízes não apenas deixa consumidores desamparados, mas também cria um ambiente propício para a perpetuação da ilegalidade por parte das corporações. É alarmante observar que estabelecimentos com condenações recorrentes continuam a transgredir a lei, muitas vezes divulgando informações não amparadas pela legislação.
Isso se verifica constantemente no caso das companhias aéreas, por exemplo. O Código Civil estabelece como percentual máximo de multa pelo cancelamento de passagens o total de 5%. Todavia, nos próprios sites das empresas há avisos chamativos, expressando que o cancelamento não é reembolsável.
Para essas empresas, a matemática é simples: as condenações, quando ocorrem, são tão poucas e de valor tão baixo que se torna mais lucrativo desrespeitar as leis do que agir de acordo com elas. Este cenário não apenas extingue a confiança dos consumidores no sistema judiciário, mas também compromete a eficácia das normas consumeristas, criando um círculo prejudicial de impunidade e desrespeito às leis.
Aparentemente, os Juizados Especiais do Consumidor estão virando “terra de ninguém”, onde cada juiz aplica o que quer, ignorando o que diz a lei, sem temer as consequências – lógico, pois o que de pior poderia acontecer? Ser aposentado compulsoriamente?
A reparação moral não pode ser uma moeda de baixo valor, trocada de forma displicente. A sociedade merece uma justiça que, em sua essência, promova a equidade e a proteção efetiva dos direitos do consumidor.
Até que esta reflexão resulte em mudanças concretas, todos continuarão observando um sistema que, ao invés de servir como guardião da justiça, perpetua o desrespeito às normas e extingue a confiança na busca pela verdadeira reparação moral.
Mas essa reflexão não tem o intuito de fazer com que a busca pelo dano moral na justiça seja menor. Ao contrário, para derrubar estas decisões que não andam em congruência com as leis, é preciso um movimento ainda maior.
É preciso que o cidadão desrespeitado vá à luta e cobre, cada vez com mais vigor, um judiciário sério e que cumpre o seu papel de aplicar as normas corretamente. O contrário disso, infelizmente, é o oposto da coragem, é a acomodação remando em direção à desordem e à insegurança.