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Defensores públicos tentarão barrar no Senado projeto que regulamenta o homeschooling

Ao Farol, presidente da ADEP-BA aponta inconstitucionalidade em texto aprovado na Câmara

Por Da Redação
Ás

Defensores públicos tentarão barrar no Senado projeto que regulamenta o homeschooling

Foto: Reprodução

Aprovado neste mês na Câmara dos Deputados, o texto-base do projeto de lei que regulamenta o homeschooling (prática de ensino domiciliar) acendeu um alerta entre os defensores públicos que atuam no Brasil. Apontando inconstitucionalidade na matéria, os profissionais estão se organizando para que a medida seja recusada no Senado.

O tema vem sendo discutido no Brasil por meio de projeto de lei desde 2012, mas voltou a ganhar força a partir de 2020. Em conversa com o Farol da Bahia, o presidente da ADEP-BA (Associação de Defensoras e Defensores Públicos da Bahia), Igor Santos, contou que a primeira estranheza é que o projeto foi aprovado "às pressas" na Câmara, sem que fosse aberto debate amplo com a sociedade.

O chamado homeschooling é um dos projetos defendidos pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), que defende a educação de crianças no ambiente domiciliar com os pais para evitar supostas ideologias que, segundo ele, são propagadas por profissionais da educação.

Quando se observa os quesitos técnicos do Projeto de Lei 3179/2012, conforme explicou o defensor público Igor Santos, o primeiro quesito a apontar é que o texto-base possui concepções inconstitucionais. "Abstraindo qualquer viés político/partidário sobre o tema, o posicionamento dos defensores públicos é que o projeto viola os direitos das crianças e dos adolescentes em vários aspectos. É importante pontuar que esse projeto já tramita desde 2012, e aconteceram audiências públicas apenas em 2013. Então, primeiro há uma preocupação em relação à ausência de debate sobre o tema. E do ponto de vista técnico, viola a Constituição, tendo em vista que, por essência, qualquer atividade educacional pressupõe concepções pedagógicas diferentes, coexistência de pensamentos diferentes e integração social. A escola é eminentemente plural", destacou.

Outra preocupação seria a garantia de promoção da saúde para as crianças, ação que costuma ter forças nas escolas públicas e privadas. Outro grande ponto negativo apontado por defensores públicos é que o homeschooling poderá contribuir para o aumento de violência contra crianças e adolescentes.

"A gente sabe que muitos casos, inclusive com relação à violência sexual, ocorre dentro do ambiente familiar. E a gente sabe que é obrigação dos dirigentes dos estabelecimentos de ensino comunicar ao Conselho Tutelar casos de maus tratos, aquelas faltas justificadas e até mesmo sinais de violência doméstica. Então, tanto de uma perspectiva pedagógica, do direito a saúde das crianças e dos adolescentes, no combate à violência, o projeto traz essa preocupação enorme aos defensores públicos. Não deveria ter passado pela Câmara e nem deveria ser ratificado no Senado", pontua o presidente da ADEP-BA, em entrevista ao Farol.

Contraria Constituição Federal 

Na análise da entidade, o ensino domiciliar pode vir a ser generalizado caso o projeto vire lei, contrariando ao menos três objetivos da educação definidos pela Constituição Federal, conforme reforçou Igor Santos. Segundo a ONG, o projeto nao atende o "pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho". Sinaliza ainda que a prática poderá impulsionar a intolerância religiosa e inviabilizar o respeito às diferenças.

"Ao longo desse processo emitimos notas técnicas e tentamos diálogo com os parlamentares, especialmente os que estavam na Comissão de Educação na Câmara. Mas de forma até inesperada, foi aprovado. Inesperado inclusive diante da atual perspectiva do Brasil. Temos demandas sociais e econômicas muito grandes e não entendemos um projeto desse ser aprovado de forma tão rápida. Esperamos ampliar o debate no Senado", destacou o defensor público.

Ainda de acordo com o presidente da ADEB-BA, apesar do interesse em ampliar o debate, não há possibilidade de manter a aprovação ou de se encontrar um meio termo para a aplicação geral do homeschooling diante das questões de inconstitucionalidade.

"O artigo 206 da Constituição da República traz elementos de que há a necessidade de estabelecer esse plurarismo de ideias, de ações pedagógicas, existência de instituições públicas e privadas de ensino, profissionais com formação pedagógica. Então, sob a perspectiva constitucional, não há espaço para evolução nesse sentido [de aprovação]", explicou.

Além de tentar reverter o quadro no Senado, caso ocorra a aprovação da matéria também por parte dos senadores, a estratégia dos defensores públicos será ajuizar as chamadas Adins (Ação Direta de Inconstitucionalidade). "Do ponto de vista da Associação dos Defensores Públicos, a gente vai continuar a tentar o debate político, tendo em vista que a lei ainda não foi aprovada. Vamos levar essas perspectivas ao conhecimento dos senadores. Caso aprovado, aí vamos avaliar um eventual ajuização de ação para considerar a lei inconstitucional. Defensoras e defensores públicos que somos, de instituição de Estado, não de instituição de governo, sempre seremos pautados à luz da técnica constitucional, buscando os direitos dos nossos assistidos, no caso dos vulneráveis, crianças e adolescentes", acrescentou.

Regras homeschooling

Seguindo o entendimento do que é definido pela Constituição, em 2018 o STF (Supremo Tribunal Federal) reforçou que o ensino domiciliar não é permitido no Brasil. Contudo, embora a prática não seja liberada pois não há lei para isso, ela também não é proibida explicitamente.

Pelo PL 3179/2012, fica "admitida a educação básica domiciliar, por livre escolha e sob a responsabilidade dos pais ou responsáveis legais pelos estudantes". E quem optar por essa modalidade de ensino, caso o homeschooling passe a ser liberado por lei, deverá formalizar a escolha junto a instituições de ensino credenciadas, fazer matrícula anual do estudante e apresentar:

- Comprovação de escolaridade de nível superior, inclusive em educação profissional tecnológica, em curso reconhecido nos termos da legislação, por pelo menos um dos pais ou responsáveis legais pelo estudante;
- Certidões criminais da Justiça Federal e Estadual ou Distrital dos pais ou responsáveis;
- Relatórios trimestrais com a relação de atividades pedagógicas realizadas no período;
- Acompanhamento com um docente tutor da instituição em que a criança estiver matriculada e que sejam realizados encontros semestrais com o estudante e os responsáveis;
- Avaliações anuais de aprendizagem;
- Avaliação semestral do progresso do estudante com deficiência ou transtorno de desenvolvimento.

Ainda conforme o texto-base aprovado na Câmara dos Deputados, fica definido um período de transição em relação à exigência de comprovação de escolaridade de nível superior, caso os responsáveis escolham "homeschooling" nos dois primeiros anos após a regulamentação entrar em vigor.

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