Documento secreto indica preocupação da UE com o governo Lula
Arquivo aponta que líderes europeus estão preocupados com as recentes declarações do petista
Foto: Ricardo Stuckert/PR
Um documento oficial e confidencial que trata das relações do bloco europeu com os quatro países emergentes: Brasil, Chile, Nigéria e Cazaquistão, informou que a União Europeia está preocupada com a posição do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em relação à guerra da Rússia e Ucrânia. O documento foi obtido pelo jornal Folha de S.Paulo, mas inicialmente foi divulgado pelo site americano Político.
Se as "informações não públicas", segundo está no texto, não trazem informações bombásticas, são um vislumbre do trabalho de bastidores da diplomacia atual e traçam um instantâneo de como o Brasil é visto pela Europa.
No texto, abordam o quanto os líderes europeus ficaram aliviados com o fato de Lula ter ganhado as eleições de 2022, após quatro anos do ex-presidente Jair Bolsonaro, mas, ao mesmo tempo, apresenta preocupação com as recentes declarações do petista.
“Relançar a parceria estratégica com o Brasil” é um dos pontos do documento descritos como de interesse da comunidade europeia. “UE preocupada que o foco de Lula na reindustrialização possa se tornar protecionista” é outro tópico citado.
O arquivo analisa detalhadamente a ação de cada país. E, no início do texto, há um breve resumo da situação do Brasil. “O atual governo mostra sinais de disposição para intensificar a cooperação. Uma estrutura para fortalecer o engajamento já existe, uma vez que a UE já tem uma parceria estratégica que pode ser reativada. O avanço do acordo UE-Mercosul será de fundamental importância. Mas a UE também precisará aumentar os investimentos em energia e nas áreas digital e de sustentabilidade.”
Confira os tópicos separados no documento:
Interesses da União Europeia
Relançar a parceria estratégica com o Brasil
Concluir o acordo de Associação UE−Mercosul
Obter maior apoio político do Brasil na ONU, globalmente e regionalmente
Acesso ao mercado e aumento de oportunidades no Brasil para negócios e investimentos da UE
Obter o reconhecimento brasileiro para as garantias de segurança alimentar da UE
Impulsionar a cooperação em transformações verdes e digitais, ação climática e ambiental
Garantir matérias-primas essenciais para o Acordo Verde da UE
Abordar a atuação da China na adesão do Brasil ao Acordo de Compras Governamentais da Organização Mundial do Comércio
Fortalecer a cooperação em defesa e segurança
Interesses do Brasil
Ser reconhecido e tratado como um ator global (inclusive em relação à reforma da ONU)
Concluir o Acordo de Associação UE−Mercosul (ao mesmo tempo em que enfatiza a necessidade de resolver desequilíbrios nas relações UE−Mercosul)
Atrair mais comércio, investimento e tecnologia da UE e aproveitar as oportunidades em clima, energia e mineração
Melhorar o acesso ao mercado da UE para produtos agrícolas
Diversificação do fornecimento de fertilizantes (dependência excessiva da Rússia e de Belarus)
Agregar valor à matéria-prima exportada
Apoio ao desenvolvimento de instituições democráticas, direitos indígenas e meios de subsistência, redução da pobreza, desenvolvimento sustentável e políticas sociais, educação
Fortalecer a cooperação em defesa, segurança e espaço
Desafios
O Brasil vê as propostas legislativas autônomas da UE (legislação do Acordo Verde) como medidas unilaterais protecionistas, em especial a legislação sobre desmatamento
UE preocupada que o foco de Lula na reindustrialização possa se tornar protecionista
UE preocupada com a possibilidade de o Brasil querer reabrir o Acordo do Mercosul
UE preocupada com a posição do Brasil sobre a guerra da Rússia contra a Ucrânia e com a falta de cumprimento de obrigações em relação a clima, ambiente e aprovação sanitária dos produtos da UE
Oportunidades
A política externa está de volta ao topo da agenda do Brasil, com o presidente Lula ansioso para obter êxitos (o Acordo de Associação UE−Mercosul poderia ser um deles)
Forte alinhamento de políticas com o governo Lula, por exemplo, nas transições verde e digital, direitos humanos, direitos indígenas, combate ao garimpo ilegal de ouro, defesa e segurança
Possível avanço no combate ao desmatamento e biodiversidade se a UE conseguir apoiar o Brasil na criação de empregos e na adaptação às novas regulamentações da UE
Alavancar o papel do Brasil como um ator construtivo na região, inclusive na Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos
Ajudar no processo de adesão do Brasil à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico e à presidência do G20 (2024)