Em entrevista à BBC News Brasil, o escritor Paulo Coelho define a situação política brasileira como um "delírio"
O escritor também relembrou a tortura que sofreu na época da ditadura e sobre os seus posicionamentos políticos na internet
Foto: Reprodução \ BBC News Brasil
Em entrevista à BBC News Brasil, divulgado nesta quarta-feira (25), o escritor e jornalista Paulo Coelho, atualmente morando em Genebra, na Suíca, fez comentários sobre a política do Brasil, relembrou a tortura que sofreu na época da ditadura e sobre os seus posicionamentos na internet.
Paulo Coelho é considerado como um dos autores da atualidade mais traduzidos no mundo e coleciona mais de 30 premiações entre reconhecimentos internacionais pela ONU. Em 2009, foi considerado pela Revista Época como um dos 100 brasileiros mais influentes do ano.
Ao ser questionado sobre comentários sobre o Brasil na Suíça, Paulo Coelho comentou que evita falar sobre o país pois, "(eu) não posso, no momento, falar bem do meu país, então falar mal é muito chato".
Já sobre seus posicionamentos políticos na internet relacionados ao Brasil, o escritor definiu a situação como "um delírio". "Eu tenho 72 anos e nunca vi nada igual. Eu já vivi ditadura, democracia, muitas fases do Brasil, mas nunca vi o que está acontecendo agora. É um delírio. Necessitava (Howard Phillips) Lovecraft, um escritor de ficção científica, para descrever o Brasil. Fico muito triste com o que está acontecendo. Uma coisa é certa: não se morre de tédio com a política brasileira, porque todo dia tem-se uma coisa nova. Por outro lado, francamente, o que é isso? Que é isso? O que o presidente brasileiro está fazendo para colocar o Brasil em tanta saia justa?"
Ao relembrar sobre a época da ditadura militar no Brasil, Paulo Coelho falou sobre o período de tortura que sofreu de maio até junho de 1974.
"Então, eles me botaram numa coisa chamada geladeira. É uma caixa, de 3x3, estou chutando, a porta hermeticamente fechada. Um ar condicionado. Você está nu. Eu estava nu o tempo todo. Só com capuz. Tortura é uma coisa que é uma violência total. Essa geladeira, é uma coisa que eles não me tocavam. Me fechavam lá dentro, botavam aquele ar condicionado tremendamente frio, e era tudo escuro, pintado de preto. Você não tem mais nenhuma sensação".
"Quando eu saí da prisão, saí como entrei. Sem explicação. Nunca fui processado, nunca fui ao Tribunal Militar. Nada. Fui preso em maio, fiquei preso até junho. Você perde a noção de data. Mas aquele medo fica. Aquele terror fica".
Quando eu estava preso oficialmente, fichado, com impressão digital, meus pais conseguiram mandar um advogado. Aí eu falei para o meu advogado "olha, não aconteceu nada, está tudo bem". Aí, me soltaram no mesmo dia e me sequestraram em frente ao aterro do Flamengo. Me arrancaram do táxi, me jogaram na grama, me botaram a arma. Eu olhei para aquele hotel e disse "Putz, eu tenho 26 anos, vou morrer olhando o hotel Glória? Isso não é justo. Eu não estou pronto para morrer." Mas aí há um bloqueio, há um mecanismo de defesa que você simplesmente entrega ao seu destino. Acho que fiquei uns 20 ou 30 minutos (pensando) "Ah, tá. Já que eu vou morrer, eu vou morrer".
Aí, em um dado momento, quando cheguei ao centro de tortura, que só fui descobrir muito tempo depois que era na rua Barão de Mesquita, voltou o instinto de sobrevivência. Mas até lá eu estava entregue. Aí eu fui torturado, apanhei, essas coisas todas.