Governo Lula corre para pagar R$ 1,4 bi por dia em emendas e cumprir acordo com Congresso
As regras eleitorais determinam que pagamentos desse tipo só podem ocorrer até 6 de julho
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil
O governo Lula (PT) corre para liberar verbas bilionárias de emendas parlamentares a tempo de serem usadas antes das eleições municipais deste ano e, dessa forma, cumprir o que foi acordado com as lideranças do Congresso e também respeitar a legislação.
As emendas são uma forma pela qual deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar seu capital político. A prioridade do Congresso tem sido atender seus redutos eleitorais, e não as localidades de maior demanda no país.
As eleições ocorrem em outubro, mas as regras eleitorais determinam que pagamentos desse tipo só podem ocorrer até 6 de julho (próximo sábado). Após essa data, a União fica proibida de fazer os repasses a estados e municípios.
Do total de R$ 52 bilhões previstas no orçamento de 2024 para emendas parlamentares, o governo se comprometeu a liberar cerca de 40% do montante até a trava eleitoral. Esse percentual representa R$ 22 bilhões.
Parlamentares têm pressionado o governo, desde o início do mandato petista, por avaliarem que há demora na liberação das emendas. A avaliação colabora com dificuldades em votações importantes no Congresso.
O governo tem acelerado as liberações nos últimos dias. Até a sexta-feira (28), pagou R$ 15 bilhões. Assim, ainda precisa liberar cerca de R$ 7 bilhões nesta semana, segundo projeções internas às quais a Folha teve acesso.
Esse saldo equivale a uma liberação diária de R$ 1,4 bilhão até sexta-feira (5), último dia útil antes da trava.
A pressão por celeridade cresce em função do ano eleitoral, uma vez que deputados e senadores buscam destinar recursos para suas bases eleitorais como forma de impulsionar a candidatura de aliados.
Do total de R$ 7 bilhões ainda a ser pagas, uma parcela será referente às chamadas emendas pix, modalidade de repasse de emenda individual em que a verba cai diretamente no caixas de estados e municípios.
Esse tipo de transferência não exige que o governo local apresente um projeto ou que o parlamentar indique em que área utilizar a verba.
O governo já empenhou neste ano, isto é, se comprometeu a pagar, R$ 33,4 bilhões de verbas a parlamentares. Desse montante, R$ 7,7 bilhões são referentes às "emendas Pix".
O objetivo do Executivo é pagar ao menos a metade desse tipo de emenda, R$ 3,85 bi, até a semana que vem para honrar um compromisso com o Congresso Nacional.
Os valores superam o que foi liberado pelo governo de janeiro a 5 de julho do ano passado, quando foram empenhados R$ 7,53 bilhões e pagos R$ 3 bilhões de emendas no total. O levantamento se concentra nos três tipos de emendas disponíveis em 2024.
No caso das emendas individuais, cada deputado tem uma cota de cerca de R$ 38 milhões, enquanto o limite de indicações dos senadores alcança R$ 69 milhões. Metade desse recurso precisa ser destinado para a Saúde.
Os parlamentares podem aplicar parte da cota individual em "emendas Pix". As emendas individuais e de bancada estadual são impositivas, ou seja, o governo é obrigado a executar a indicação do deputado ou senador.
Ainda há a emenda que é definida pelas comissões do Congresso. A Comissão de Saúde da Câmara tem a maior fatia dessa verba, com R$ 6 bilhões para indicar. O governo não é obrigado a executar esse tipo de emenda.
Essas verbas são usadas para custear obras patrocinadas pelos parlamentares. Um acordo feito entre Congresso e governo prevê que a divisão desse tipo de emenda será gerenciada pelos próprios parlamentares.
No caso da Câmara, o próprio Arthur Lira (PP-AL) é o responsável pela partilha. Ele repassa o valor acordado com o líder de cada partido, que depois transfere aos deputados. Esse modelo foi apelidado de pizza na Câmara, como revelou a Folha.
Na prática, avaliam parlamentares, essas emendas estão sendo usadas para replicar o modelo das extintas emendas de relator.
A Comissão de Saúde da Câmara, por exemplo, encaminhou repasses de mais de R$ 4,2 bilhões neste ano sem apontar quais deputados e senadores são os padrinhos das emendas.
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino determinou neste mês a realização de uma audiência de conciliação para discutir possível descumprimento da decisão da corte que declarou a inconstitucionalidade das emendas de relator.
O governo acelerou e ampliou o total de verbas pagas até agora porque a Justiça determina que elas só podem ser liberadas até 6 de julho, três meses antes do primeiro turno das eleições, marcadas para 6 de outubro.
A legislação eleitoral determina uma série de vedações ao governo federal e ao presidente Lula nesse período, como, por exemplo, a inauguração de obras federais.
A liberação dos recursos pelo governo até essa data foi negociada com os parlamentares num acordo que envolvia a manutenção do veto do presidente na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) em sessão do Congresso Nacional em maio.
Os congressistas incluíram na LDO um cronograma para o pagamento das emendas, o que ampliava o próprio poder do Legislativo na execução dessas verbas, já que não existia um calendário definido para isso --esse trecho foi vetado pelo petista.
Se mantido, ele poderia engessar o Orçamento federal e obrigar o governo a fazer pagamentos mesmo sem ter dinheiro no cofre. A solução para evitar a derrota de Lula foi o Planalto acertar com o Parlamento um calendário extraoficial para pagamentos.