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'Incerteza gerada por Trump é pior do que tarifas', diz chefe de agência da ONU para comércio

Até o momento, as tarifas que efetivamente foram aplicadas tiveram como alvo a China, em 10%

Por FolhaPress
Ás

'Incerteza gerada por Trump é pior do que tarifas', diz chefe de agência da ONU para comércio

Foto: Isac Nóbrega/PR

A incerteza gerada pelas ameaças de Donald Trump sobre medidas que afetam o comércio global é pior do que os efeitos em si das tarifas impostas pelo republicano, diz à reportagem a chefe do órgão da ONU para o comércio e desenvolvimento.

Desde que tomou posse, Trump anunciou que colocaria impostos de 25% sobre produtos do Canadá e do México. Depois, suspendeu a aplicação da medida por 30 dias, e não se sabe se haverá novo adiamento ou se as tarifas entrarão em vigor.

No caso do aço e do alumínio, o republicano disse que os novos impostos começarão a valer em março, o que também gerou dúvidas entre especialistas se serão implementados ou se alguns países conseguirão negociar isenções com o americano.

Até o momento, as tarifas que efetivamente foram aplicadas tiveram como alvo a China, em 10%.

As consequências dessa falta de previsibilidade, afirma Rebeca Grynspan, 69, são sentidas de forma mais aguda nos países em desenvolvimento.

"Há o elemento da incerteza. Porque se nós já soubéssemos quais são as medidas, nos adaptaríamos, teríamos uma estratégia, faríamos um plano. Mas quando alguém não sabe, a primeira coisa que acontece é a paralisação do investimento. O temor que temos é que esse período de incerteza se prolongue de forma que o investimento sofra, especialmente nos países em desenvolvimento e nos mercados emergentes", afirma Grynspan, em entrevista concedida durante o Fórum de Segurança de Munique, na Alemanha.

"Além disso, mesmo se as tarifas anunciadas não se concretizarem, isso já vai ter um efeito sobre a inflação e as taxas de juros. Nós já vemos que as taxas vão permanecer altas por mais tempo. Portanto, os países que estão endividados no mundo em desenvolvimento vão ter taxas de juros muito altas e isso não vai ajudar no problema da dívida. Esses dois aspectos podem afetar ainda mais para baixo a taxa de crescimento da economia global —e já estávamos em uma taxa baixa de crescimento".

Vice-presidente da Costa Rica entre 1994 e 1998, Gryspan ocupou postos de direção em organismos internacionais, entre eles o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), e a secretaria-geral Ibero-Americana. Desde 2024, ela comanda a UNCTAD (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento).

Para além da incerteza, Gryspan argumenta que elevação das tarifas pelo republicano pode causar um problema inflacionário que também afetará os mercados emergentes com mais força.
"A pergunta é se a inflação vai aumentar nos Estados Unidos, o que pode atrair muita volatilidade nas taxas de câmbio nos países em desenvolvimento. Esse pode ser um efeito adicional, que seria ruim para os emergentes. Mas os países em desenvolvimento podem fazer coisas que os tornem mais resilientes", afirma.

"Por exemplo, o comércio sul-sul é o que mais cresceu nos últimos anos. [Precisamos de] instrumentos de financiamento para um melhor comércio sul-sul. Ou seja, buscar a diversificação de mercados deve ser uma das tarefas para o mundo em desenvolvimento".

A secretária-geral da UNCTAD afirma que não se trata de substituir o mercado americano – "não sejamos ingênuos" –, mas que há espaço para que o comércio entre nações e blocos emergentes avance.

Apesar de o sistema de regras internacionais do comércio sofrer com medidas unilaterais dos EUA e pela ação dos americanos de bloquear o funcionamento do órgão de apelação da Organização Mundial do Comércio, Gryspan afirma que não é possível dizer que o sistema gerido pela OMC esteja quebrado.

"Hoje, 80% do comércio internacional é realizado dentro das leis ou das regras da OMC ou dos acordos comerciais que foram negociados pelos países. Obviamente, a violação das leis [de comércio internacional] vai diminuir esse percentual. Mas o fato de termos acordos comerciais vai ajudar, como o novo acordo entre o Mercosul e a União Europeia. Faz com que a União Europeia também tenha um papel diferente que está desempenhando em outros contextos. Isso vai ajudar. Se o comércio é realizado com a União Europeia dentro desse marco, ainda mantemos um sistema de comércio".

Ao analisar a resposta da China às tarifas de Trump contra seus produtos, Gryspan afirma ainda não ver uma guerra comercial aberta entre as duas potências. Em resposta à ofensiva americana, Pequim aumentou o imposto de importação de alguns produtos dos EUA, como petróleo, maquinário agrícola e determinados tipos de veículos, além de estabelecer controle de exportação de alguns itens estratégicos.

"A única coisa que podemos prever sobre uma guerra comercial é que vai ser muito cara. Espero que não se desate uma guerra comercial aberta. Espero, para o bem do mundo, que se mantenha dentro de limites razoáveis", diz.
 

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