Ministro do STF revela análise policial sobre celular de ex-ajudante de ordens de Bolsonaro
Relatório da Polícia Federal menciona militares em diálogos sobre atos contra a democracia
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), divulgou nesta sexta-feira (17), a análise realizada pela Polícia Federal sobre o conteúdo do celular de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do presidente Jair Bolsonaro.
Mauro Cid encontra-se detido desde maio, em decorrência de uma operação que investiga suposta fraude em registros de vacinas em benefício do ex-presidente.
Registros encontrados no aparelho mencionam cinco militares em diálogos sobre ações e movimentos contrários à democracia, em uma tentativa de manter Bolsonaro no poder. Um dos militares citados foi transferido para a reserva em abril deste ano.
Os militares mencionados pela Polícia Federal no relatório do celular de Mauro Cid são:
Coronel Jean Lawand Junior
O coronel do Exército Jean Lawand Junior é mencionado em uma troca de mensagens com Mauro Cid, discutindo a possibilidade de convencer Jair Bolsonaro a adotar uma tomada autoritária de poder.
Em dezembro de 2022, Lawand afirmou a Cid: "Pelo amor de Deus, Cidão. Pelo amor de Deus, faz alguma coisa, cara. Convence ele a fazer. Ele não pode recuar agora. Ele não tem nada a perder. Ele vai ser preso. O presidente vai ser preso. E, pior, na Papuda, cara."
Em resposta, Cid afirmou que o "PR [Presidente da República] não pode dar uma ordem...se ele não confia no ACE [Alto Comando do Exército]".
Na última troca de mensagens, Lawand demonstrou decepção com a falta de ação de Bolsonaro. "Soube agora que não vai sair nada. Decepção irmão. Entregamos o país aos bandidos." Cid respondeu: "Infelizmente".
Atualmente, Lawand ocupa o cargo de supervisor do Programa Estratégico ASTROS do Escritório de Projetos do Exército.
General Édson Skora Rosty
Édson Skora Rosty, então general de Divisão do Exército, é mencionado em um áudio encaminhado por Lawand a Cid.
Em dezembro de 2022, Lawand escreveu a Cid que "ele [em referência ao então presidente] tem que dar a ordem", referindo-se às tentativas de mantê-lo no poder.
No áudio, Lawand afirma ter recebido o relato de um "amigo do QG [Quartel-General]". A mensagem diz: "Meu amigo, na saída do QG [Quartel-General] encontro bom o ROSTY, SCmt COTER. Foi uma conversa longa, mas para resumir, se o EB [Exército Brasileiro] receber a ordem, cumpre prontamente. De moto próprio o EB [Exército Brasileiro] nada vai fazer porque será visto como golpe. Então, está nas mãos do PR [presidente da República]".
Segundo a PF, o "nome ROSTY pode estar relacionado ao General de Divisão, Subcomandante de Operações Terrestres do Comando de Operações Terrestres do Exército Brasileiro, EDSON SKORA ROSTY".
Rosty ocupou o cargo de Subcomandante de Operações Terrestres do Exército Brasileiro de julho de 2022 a abril de 2023. Posteriormente, ele foi transferido para a reserva pelo presidente Lula.
Tenente-coronel Marcelino Haddad
O tenente-coronel Marcelino Haddad Aquino Carneiro é apontado pela Polícia Federal como responsável por enviar a Cid um conjunto de arquivos relacionados ao emprego das Forças Armadas para a "garantia dos Poderes constitucionais". Na época, Haddad era tenente-coronel de Comunicações.
Os arquivos defendem a tese de que as Forças Armadas desempenham um papel de "poder moderador". Um dos documentos inclui uma consulta ao jurista Ives Gandra.
Nas respostas às perguntas, Haddad defende a ideia de que o artigo 142 da Constituição Federal atribui às Forças Armadas o papel de poder moderador, que poderia ser empregado em caso de "inimigo externo ou crise entre poderes".
Essa tese, no entanto, já foi contestada por juristas de diversas tendências, como o ministro Joseli Camelo, presidente do Supremo Tribunal Militar (STM), ministros do STF e entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Atualmente, o tenente-coronel Haddad ocupa o cargo de comandante do Centro de Preparação de Oficiais da Reserva do Rio de Janeiro. Anteriormente, ele foi assessor da Cooperação Militar no Paraguai.
Major Fabiano da Silva Carvalho
O relatório da Polícia Federal menciona o major Fabiano da Silva Carvalho como destinatário inicial da mensagem do jurista Ives Gandra sobre a tese de que o artigo 142 da Constituição Federal atribui às Forças Armadas o papel de poder moderador, que poderia ser empregado em caso de "inimigo externo ou crise entre poderes".
No entanto, o Portal da Transparência, que reúne dados dos servidores públicos da União, indica apenas a existência de um Fabiano da Silva Carvalho vinculado ao Ministério da Defesa. Ele é tenente-coronel e ocupa o cargo de adjunto da Seção de Doutrina e Estudos do Centro de Comunicação Social do Exército.
Sargento Luis Marcos dos Reis
O sargento do Exército Luis Marcos dos Reis recebeu destaque especial na análise do conteúdo do celular de Cid feita pela Polícia Federal. Dos Reis foi um dos presos pela PF na operação que investiga a fraude em cartões de vacina do ex-presidente e seus ajudantes, em maio.
Ele aparece pela primeira vez em uma conversa com Cid sobre manifestações de cunho golpista em frente ao Quartel do Exército de Goiânia (GO).
Na época, Cid estava cotado para assumir o comando do Batalhão de Ações e Comandos de Goiânia, uma unidade de Operações Especiais do Exército. No entanto, a posse foi suspensa pelo novo comandante do Exército, Tomás Miguel Ribeiro Paiva.
"Ao ser questionado sobre a manifestação, Mauro Cid disse: 'Mais fácil eu ajudar os caras do que tirar de lá'", destacou a PF.
Segundo a PF, Dos Reis também participou dos atos golpistas de 8 de janeiro e chegou a subir na cúpula do Congresso. Ele ainda esteve acampado no Quartel-General do Exército em Brasília e incentivou a "tomada de poder pelas Forças Armadas".
O documento enviado pela PF ao ministro Alexandre de Moraes indica que o sargento enviou vídeos e imagens de sua participação nas invasões às sedes dos Três Poderes.
"Eu estou no meio da muvuca! Não sei o que está acontecendo! O bicho vai pegar!", escreveu ele em uma das mensagens.
Dos Reis ingressou no Exército em 2004, no Rio de Janeiro, e participou de missões no Haiti. Entre 2013 e 2016, ele foi motorista e segurança pessoal do comandante do Exército.