Mudança do Garcia: tradição com quase 100 anos segue firme em Salvador

Um carnaval dentro do próprio carnaval de Salvador com forte característica de protesto, esse é o 'Mudança do Garcia'. O bloco sem corda tradicional do bairro do Garcia, que acontece desde o século 20, reúne multidões que seguem para o Campo Grande, ao som de samba e axé. A folia será realizada nesta segunda-feira (20). 

Em 2018, o estudante Bernardo Filho participou pela primeira vez do movimento. Contratado para fazer parte da organização do evento, ficou encantando com a festa. “Eu fui trabalhar segurando uns estandartes com palavras de ordem, frases apoiando as campanhas contra a violência à mulher. E quando eu vi, era um samba incrível, o clima era muito bom, muito família. Esse ano, eu vou como folião, para aproveitar bastante”. 

O que Bernardo não sabia era que os cartazes que ele segurava durante o trajeto fazem parte de uma tradição do bloco: o protesto. De acordo com o historiador e pesquisador da cultura material e iconografia da cidade de Salvador e Bahia, Rafael Dantas, essa peculiaridade é iniciada na metade do século 20.

“O protesto vai evidentemente surgindo como forma de fazer esse momento de festividade, também ser um lugar de  contrariedade, de mostrar sua indignação ou mesmo de protesto. O que é muito significativo porque une a política e a festa em um só espaço”, disse. 

A ‘Mudança do Garcia’ não é o único bloco sem corda nos bairros de Salvador mas, tem a maior popularidade na capital baiana. “Neste período, muitos lugares tinham essas expressividades de blocos carnavalescos no mês de fevereiro, cada lugar com suas particularidades, com suas festividades. Com realidades muito propícias a cada bairro onde se expressava o Carnaval do seu jeito. E era o que tinha no Garcia” afirma Dantas. 

O historiador atribui a popularidade a junção da ação dos moradores e a localidade do bairro. “Acontece que lá ganhou muita notoriedade entre outros pontos. Primeiro por conta da organização dos habitantes que foi muito mais destacada do que em outros lugares. Também por uma questão da referência central do bairro, em contato com a região do Campo Grande, esse lugar de deslocamento para o circuito oficial do Carnaval de Salvador. E evidentemente que toda importância que a festa tinha para as pessoas que moravam ali no entorno, e ganha uma uma difusão muito maior especialmente nos anos cinquenta. Inclusive com o nome que a gente conhece hoje.” 

Em 2014, o percurso feito pelo bloco Mudança do Garcia foi oficializado como Circuito Riachão, em homenagem ao sambista nascido no bairro, em 1921.