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Regulamentação de trabalho por app: entenda o projeto de lei e saiba o que pensa especialistas e categoria

Apresentado pelo governo, texto tem sido alvo de polêmicas e dividido opiniões

Por Otávio Queiroz
Ás

Regulamentação de trabalho por app: entenda o projeto de lei e saiba o que pensa especialistas e categoria

Foto: Freepik

Tratado por muitos como apenas um "bico", o trabalho via aplicativos pode, em breve, ganhar um novo status graças ao projeto de lei que regulamenta a categoria, enviado ao Congresso Nacional pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no início desta semana.

O texto do projeto trata de diversos pontos, como salário, aposentadoria e carga horária. Cumprindo parte da promessa da campanha eleitoral de 2022, ele, no entanto, tem dividido opiniões. 

Para quem ainda tem dúvida sobre o assunto, o Farol da Bahia foi em busca de especialistas e profissionais do setor, além de explicar, em detalhes, os principais pontos do texto.

O Projeto de Lei


Rovena Rosa/Agência Brasil

Apresentada no início da semana, a proposta cria a figura do trabalhador autônomo por plataforma e prevê alguns pontos já conhecidos por trabalhadores com vínculo da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), como contribuição ao INSS, auxílio-maternidade e pagamento mínimo por hora de trabalho. 

“Vocês acabaram de criar uma nova modalidade no mundo do trabalho. Foi parida uma criança no mundo do trabalho. As pessoas querem autonomia, vão ter autonomia, mas precisam de um mínimo de garantia”, disse o presidente Lula após a assinatura do documento.

De acordo com a proposta, fica fixado o valor de R$ 32,10 mínimo por hora trabalhada. Desta forma, a renda mínima será de R$ 1.412. Mas para ter acesso ao piso da categoria, o trabalhador precisará exercer, ao menos, oito horas diárias.

Além disso, o texto prevê que a jornada de trabalho em uma mesma plataforma não pode ultrapassar as 12 horas diárias, limite já estabelecido pelas principais empresas, como 99 e Uber. O texto também cria a categoria "trabalhador autônomo por plataforma".

Juntos, motoristas e empresas terão que contribuir para o INSS. Os trabalhadores pagarão 7,5% sobre a remuneração, enquanto o percentual a ser recolhido pelos empregadores será de 20%.

As mulheres que trabalharem via aplicativo também terão direito a auxílio-maternidade. Além disso, não poderá haver acordo de exclusividade. Com isso, os trabalhadores poderão exercer suas atividades em quantas plataformas quiserem.

A proposta de projeto de lei é resultado de um grupo de trabalho, criado em maio de 2023, com a participação de representantes do governo federal, trabalhadores e empresas, e que foi acompanhado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).

Cenário atual


Rovena Rosa/Agência Brasil

Os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que, atualmente, o Brasil tem cerca de 1,5 milhão de trabalhadores de aplicativos. Os números são de 2022. 

Desse total, 52,2% trabalham com transporte de passageiros, enquanto 39,5% trabalham com entrega de comida e produtos e outros 13,2% com prestação de serviços.

Joana está entre os mais de 750 mil profissionais que transportam passageiros diariamente. Pelas ruas de Salvador, ela tira o sustento necessário para cuidar dela e da sua filha de quatro anos. Trabalhando em dois aplicativos há mais de três anos, ela mostra-se receosa com as mudanças que podem acontecer caso a profissão seja regulamentada.

"Migrei para o transporte por aplicativo justamente para poder trabalhar do jeito que gosto, no meu horário e nos dias que desejar. Todas essas obrigações com carga horária e valores previamente definidos não me agradam. Por este motivo, hoje, eu posso dizer que sou contra a regulamentação sugerida pelo governo", opina a trabalhadora.

Segurança jurídica

O advogado especialista em Direito do Trabalho, Diego Oliveira, ressalta que, apesar dos pontos levantados pelo PL, muita coisa ainda pode mudar e o texto final pode ser bem diferente do destacado nesta matéria. Ele ainda afirma que, mesmo que não agrade a todos, a medida é importante para esses trabalhadores.

"A regulamentação, sem dúvida, serve para conferir uma maior segurança jurídica e trazer, em algum grau, direitos para os trabalhadores e obrigações para as plataformas digitais", afirma o especialista.

Ele ainda exalta alguns direitos que, há algum tempo, vêm sendo discutidos por trabalhadores da categoria. “Agora, uma mulher conseguirá ter auxílio-maternidade durante a gestação, os trabalhadores terão ainda carga horária máxima e piso de remuneração bem definidos. Sem contar que poderão contar com o auxílio de sindicatos”, explica Diego.

Reclamações

Apesar dos benefícios que, teoricamente, os trabalhadores teriam com a regulamentação da atividade, há ainda muita desconfiança e dúvidas pairando no ar. Para Josias Guedes, presidente do Sindicato dos Condutores Autônomos Cadastrados em Aplicativos (Sincaap-BA), um dos pontos mais críticos do projeto está no trecho que aborda a remuneração dos trabalhadores. 

“Hoje, na prática, o condutor é remunerado por quilômetro rodado, o que significa que ele pode receber até o dobro do piso estabelecido pelo projeto, que é de R$ 32,09. Isso implica que, se em menos de uma hora ele alcançar o valor dobrado, a empresa repassará apenas os R$ 32,09. Ou seja, o trabalhador estaria perdendo dinheiro”, afirma Josias.

“Defendemos uma proposta baseada no pagamento por quilômetro rodado mais o tempo, o que é hoje na prática. Não aceitamos a proposta por hora trabalhada. Queremos que essas proposições sejam estabelecidas mediante acordo coletivo para ajustar os ganhos com os trabalhadores, e não entre a empresa e o governo”, completa.

Josias também entende que a jornada de trabalho de oito horas é um problema para toda a categoria. "Segundo o projeto de lei, nós teríamos uma jornada mínima de oito horas, podendo ser estendida para 12 horas mediante acordo coletivo. No entanto, nós entendemos que, como autônomos, a jornada deve ser livre”, argumenta.

O representante do Sincaap, no entanto, também diz enxergar pontos positivos para a categoria com o PL. “Um dos pontos positivos desta proposta de regulamentação é a criação da categoria de trabalhador autônomo, onde passamos a existir de fato e de direito, e incluídos nas pautas de benefícios do governo e da iniciativa privada”, afirma.

Se aprovadas por deputados e senadores e sancionada pelo presidente da República, as medidas passarão a valer em até 90 dias após a sanção.

O Farol da Bahia também procurou a 99 e a Uber, algumas das principais plataformas que atuam hoje no país, para entender quais seriam os impactos para seus parceiros e também para os consumidores. As empresas, no entanto, não responderam aos nossos questionamentos até o fechamento desta reportagem.

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