A Constituição respira

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A Constituição respira

Ainda que mergulhada em um mar de insanidades, a Constituição teima e sobrevive. É a terceira mais longeva em 200 anos de independência política do Brasil. A do Império sobreviveu por 67 anos e a da Primeira República durou 39 e sucumbiu com a Revolução de 30. A de 88, que  hoje  festejamos, permanece vigorando por 35 anos, a despeito de tudo.  

Não soçobra às procelas do mar, por mais que seja  enxotada do  continente democrático. Pela voz de Ulysses Guimarães reverbera, impávido, o grito poético de Fernando Pessoa: “navegar é preciso”.

Desmente, assim, o vozerio incongruente de que é feita de  exageros e desmandos, pois se  assim fosse a vida já a teria alterado em seus fundamentos básicos.
Inaugural e irredentista, a  Constituição  institui logo em  seu Titulo II, Capítulo I, Art. 5º, incisos, alíneas e parágrafos os  direitos inalienáveis do cidadão, erguendo, desse modo, uma barreira inexpugnável às  sandices e violações do tribunal que, a  cada dia se  apequena perante o irrecorrível julgamento da História, toda vez que descaradamente agride esses  direitos  e valores. 

A Constituição de 88 teve o desassombro e a coragem de manter no seu corpo as luminares criações do direito, como o Habeas Corpus e o Mandado de Segurança.

Avançou, ainda mais, ao introduzir na nossa lei  maior o Mandato de Injunção e o Habeas Data, ambos  institutos destinados a robustecer a  cidadania. 

Difícil, quase impossível, será distinguir um só dos cerca de LXXVI dos ditames constitucionais contidos nesse incomparável corolário de direitos, consagrados nos documentos históricos relacionados aos direitos do homem e do cidadão. Chafurdando na lama de suas decisões, a suprema corte (com minúscula mesmo), é o retrato fiel da discórdia nacional.

Laudatória, programática e detalhista, os constituintes a  fizeram para que atendesse a todos, abrigasse em seus espaços mandatórios os mais distintos  direitos da atualidade. Nela estão presentes os direitos dos povos originários, a proteção ao meio ambiente, expresso em capítulo específico, para  que não se perdesse nas nuvens os institutos e as  normas legais que incluíam o prodigioso capítulo, resultando o  nosso  país o  mais protegido da  face da  Terra. Deixou, em letras de fogo, o brado contra toda forma de preconceito! 

Perfeita a Constituição não é. Obra de homens e mulheres que a redigiram com as nefastas lembranças que o arbítrio nos legou, ao calor dos debates ideológicos e, finalmente  estreando como detentora de vasto poder que há muito a Nação desconhecia, ela veio a lume. O próprio pai criador das ideias que a nortearam, o imortal Ulysses Guimarães, desferiu a advertência do estadista: “não é a Constituição perfeita; se fosse perfeita, seria irreformável. Ela própria, com humildade e realismo, admite ser emendada dentro de cinco anos”.

Não a reformaram em cinco anos como ela próprio previra, todavia ao longo desses 35 anos de vida, sofreu, contudo, mais de uma centena de emendas, votadas no Congresso Nacional, com quórum qualificado. Não se diga, os afoitos, que tais alterações do seu texto, sempre preservadas as normas pétreas, deformaram e impediram que cumprisse o seu papel perante a História: o de assegurar o império da lei, contra a anarquia e o arbítrio.

Muitos juristas de escol chegam a afirmar que o gigantismo legal representado pela nossa Constituição não é um fenômeno brasileiro, se  comparado ao volume legisferante  de  nações, como  os Estados Unidos da  América, as  quais ostenta em seu desenho federativo códigos  de  leis civis, penais ou de processo diferenciados em cada Estado, ainda que a sua Constituição seja  sintética e principialista. 

Precisamos compreender a nossa própria cultura, plasmada em questões legais na herança colonial portuguesa, cujas  leis do Reino eram transplantadas para a Colônia e esta, mesmo antes da independência,  quando D. João VI liderou a  transmigração, trazendo consigo a corte de Portugal para o Brasil, converteu, em 1815, o Brasil em Reino Unido a Portugal e  Algarves.

Longe de  aventar os  equívocos e disparates que a nossa Carta Magna possa conter, e contem, o grave momento político que ameaça de morte a Democracia brasileira, tão duramente conquistada, é o de proclamar suas virtudes, e são muitas, para as contrapor ao golpe civil perpetrado por esse conluio nefando entre o coletivismo petista e a violação da lei e da Constituição.

As ruas nos esperam, embora o fantasma do medo ronde a Nação. Não resta outro caminho, senão o pronunciamento do povo para salvar a Constituição demolida, restaurar as liberdades e corrigir os rumos nacionais.

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