Associação Juventude Afonjá – AJA: “Cantiga que menino canta, gente grande já cantou!”

Ás

Associação Juventude Afonjá – AJA: “Cantiga que menino canta, gente grande já cantou!”

Com os objetivos de alfabetizar as crianças do Opô Afonjá, bem como as menos favorecidas do bairro de São Gonçalo do Retiro, além de apoiar moralmente e socialmente as mães solteiras destas crianças, no ano de 1977, Mestre Didi (in memoriam) criou o projeto: Mini Comunidade Obá Biyi. A proposta foi implantada por um grupo de trabalho composto por membros do Terreiro: profissionais pedagogos e antropólogos iniciaram um projeto-piloto que objetivou viabilizar melhores condições de aprendizado da educação formal que buscou valorizar, sobretudo, a cultura afrodescendente a partir de seus contos e histórias. 

A partir de um convênio com a SECNEB – Sociedade de Estudos da Cultura Negra no Brasil e com a Prefeitura de Salvador, o Opô Afonjá cedeu um terreno dentro do próprio Terreiro para a construção de um prédio adequado para funcionamento do projeto. Em 1978, a Mini Comunidade Obá Biyi abriu as portas oficialmente para acolher seus alunos que, com idades de seis meses a 13 anos, recebiam atendimento de creche, maternal, pré-escola e desenvolvimento integrado. Além da grandiosa idéia do Mestre Didi em criar este projeto, ele também foi um grande educador onde recriou peças teatrais desconstruindo rótulos maliciosos sobre a cultura africana, justamente a partir dos contos dos Orixás.

Em 1986, a Mini Comunidade Obá Biyi se tornou Escola da 1ª a 4ª série do ensino fundamental e passou a se chamar: Escola Eugênia Anna dos Santos. Tudo isso só foi possível a partir dos esforços e articulações de Mãe Stella, que seguiu a narrativa da homenageada, Mãe Anninha – Eugênia Anna dos Santos, Iyá Obá Biyi, cuja manifestação do sonho era ver seus filhos “com anel de Doutor, aos pés de Xangô”. Tais referências fizeram com que Mãe Stella levasse o projeto além do inicialmente planejado. Em 1998, a Escola foi municipalizada e, em 1999, foi implantado um projeto político pedagógico chamado Irê Ayó – Caminho de Alegria, pela filha de santo e Doutora em educação pela Universidade Federal da Bahia - UFBA, Vanda Machado.

Um dia tia Cantu (in memoriam) disse: “Cantiga que menino canta, gente grande já cantou!”. A partir desta narrativa, em 2006 a Associação Juventude Afonjá, com a ajuda de Cláudio Orlando, filho de Xangô e professor da Universidade Federal do Recôncavo - UFRB, resolveram homenagear os Mestres Populares da Cultura do Ilê Axé Opô Afonjá. As crianças nativas da roça respiram Axé, Educação e Cultura, por meio de projetos sócio-educativos, aqui citados: capoeira; percussão; tecelagem; arte visual; teatro; dança e canto em Iorubá – todos esses fazem parte do nosso dia-a-dia. Além do Mestre Didi e Mãe Stella de Oxossi, outras personalidades também contribuíram para a formação desta juventude. Passaram por aqui: Tia Detinha de Xangô, com as bonecas de pano; Alabê Nezinho, com esculturas em madeira; Carlos Petrovich, com o teatro; Nivalda Costa e Luiza Marques, com a mediação cultural; tio Kakanfô e tia Cantu como referências sacerdotais, dentre outros.

Na minha caminhada pude absorver os ensinamentos destes grandes Mestres e pude, também, compartilhar todo o conhecimento angariado. Tive a oportunidade de monitorar as aulas de percussão com o saudoso cientista da percussão, Bira Reis. Posteriormente, fiquei responsável pelas aulas percussivas. Recebi vários agradecimentos de mães e pais de crianças por ter oportunizado aos seus filhos outras possibilidades nos caminhos da vida tendo a música como invólucro de proteção, afastando-os do crime – no nefasto mundo da comercialização de armas e drogas que, infelizmente ainda provoca um alto índice de evasão escolar. Compartilhei, tempos depois, o conhecimento da arte visual. Cheguei ao conhecimento acerca de materiais diversos para confeccionar esculturas sacras de forma autodidata. Minha inspiração? As obras do Mestre Didi. E hoje, a literatura vem se fazendo cada vez mais presente em minha vida. Minha tia – Mãe Stella, foi e ainda é a minha grande inspiração. A partir dos meus textos, consigo levar aos leitores um pouco das minhas escrevivências dentro deste universo do Terreiro de Candomblé.

Dedico este artigo aos meus contemporâneos e à linda história social e sacerdotal que, juntos, conseguimos trilhar. Nomeio os que a memória me traz nesse momento: Dedéia, minha irmã; Bié; Rubinho; Petinho; Alex; Guelê; Thiago; Iraildes; Nicéia; Cátia; Telma; Jorge Bó; Valnei; Nino; Lampião; Super-Homem; Zé Bim; Léo; Anderson; Itá; Rosana; Wilton; Albérico; Licutan; Vaguinho; Paulinho; Fabinho, meu primo; Quênia; Daniele; Daniel; Dudu - entre outros...

In memoriam: Julica, Bal e Tawamin. 

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie:[email protected]

Faça seu comentário