São Paulo viveu, no último domingo, um dia especial em sua história, desde os tempos imemoriais, batizada pelos padres jesuítas com o nome da São Paulo dos Campos de Piratininga, em 1554. Jamais poderia suspeitar que na sua rua mais famosa, acolheria uma multidão incalculável, tão constitucionalista quanto aquela que lutou bravamente pelo advento da lei maior em 9 de julho de 1932.
Desta vez, São Paulo clamava, em uníssono com todo o Brasil, pela liberdade dos presos políticos que, por si só, configura o temível estado de exceção, a que fomos conduzidos.
Seguramente, a Avenida Paulista reuniu a mais possante manifestação política de todos os tempos, cuja presença de manifestantes foi ridiculamente estimado em números subestimados, com o propósito de subtrair ao povo brasileiro suas lídimas conquistas e anseios.
A palavra de ordem da ANISTIA reverberou por todo o país e se tornou um objetivo nacional. O fito de pacificar a nação não poderia ser outro, frente o conflito que nos aproxima de um dissenso sem precedentes, tal é a desordem constitucional e as forças que se confrontam.
Defender e preservar a Constituição de 88 é o único caminho que nos levará a uma conjuntura de paz. A anistia faz parte ativa e imprescindível deste processo e só não compreende esta inescapável disjuntiva os que insistem em trilhar os caminhos da ilegalidade e da supressão das garantias individuais e da igualdade de todos os cidadãos perante as leis.
A violação dos princípios constitucionais é de evidência meridiana, um acinte perpetrado pela suprema corte do país. A nação, através de suas representações intelectuais, artísticas, de mídia, eclesiástica e outras, assiste passiva as violações mais descabidas e provocativas da Constituição e somente as massas populares representam a nação insurgente, como constatamos na grandeza politica da manifestação paulista do último domingo.
As elites políticas no poder se contradizem e fingem não ver os absurdos que são cometidos, como se fossemos realmente, como disse o douto presidente do STF, um país engolfado pela barbárie, carente de sua sabedoria ímpar, para apagar toda a bela história da grande nação mestiça, e recivilizá-la, iniciando-a em sua rica cultura, religiosidade e incomparável idioma.
Nossa Constituição tem 37 anos, assegurando ao nosso ordenamento jurídico as bases necessárias a tão longeva existência, mas sobretudo ela figura, no concerto mundial, como uma carta moderna e atenta aos grandes problemas porque passa a Humanidade. Nada se lhe afigura superior no que concerne à organização do Estado, dos direitos e garantias individuais, os institutos fundamentais para a segurança dos indivíduos, a proteção dos índios e do meio ambiente e outros tantos institutos fundamentais para uma sociedade civilizada.
Se muitos a acoimam – e com razão – de prolixidade, esquecem que tem sido devidamente emendada, seguimos a tradição ibérica que nos formou desde a colônia e que temos uma forte centralização na União, diferente de países de tradição anglo saxã, profundamente federalistas, principalmente os EUA, cujos poderes do Estado são descentralizados. Estas questões podem merecer, em outro texto, tratamento mais técnico, que nos permitirá uma melhor compreensão do problema.
O fato político irrecorrível é que só sairemos dos graves problemas em que nos enredamos quando recuperarmos o império das leis e da Constituição, quando concedermos a liberdade dos presos políticos, quando devolvermos os direitos dos refugiados, enfim com o nosso reingresso na plena democracia.
O poeta Ferreira Goulart, que nos emprestou o título dessas breves considerações, conclui esse magnifico poema com as seguintes e clarividentes palavras: “sei que a vida vale a pena, embora o pão seja caro e a liberdade pequena”. Amém!