A cada volta dos ponteiros de um relógio, surgem declarações de altas autoridades brasileiras e do próprio Presidente da República que suscitam comentários e interpretações desconcertantes. Elas criam um clima de torpor, de medo, de inquietação e descrença.
Não há quem não se espante ou se exaspere. Aqueles que se colocam ao lado do atual regime se calam, não ousam manifestar simpatia ou adesão, tamanho são os disparates que se ouve a todo instante. Os que reverberam são os cúmplices desse caminho de perdição para onde estamos sendo arrastados.
Tais declarações não se contentam em disparar gafes ou simples derrapagens de linguagem. Elas revelam mais do que isso. Traduzem conteúdos explosivos, ameaçadores, os quais merecem mais que a denúncia de uma visão de mundo corrompida e tosca.
Não foram poucos os filósofos e historiadores que deram inestimáveis contribuições intelectuais, quando se viram diante de conjunturas onde proliferaram afirmações dessa índole e os desastres históricos a que elas conduziram grandes nações.
As expressões “primeira realidade” e “segunda realidade” nasceram com Helmito Von Doderer, escritor austríaco, prisioneiro na Sibéria durante a Segunda Guerra Mundial, e depois muitas vezes utilizadas por Robert Musil para associar ao líder político, dotado de poder, com a finalidade de escapar dos fatos reais e construir um sistema de natureza ideológico, destinado a trapacear e exprimir objetivos políticos, justificados por seus fins magnânimos e superiores. Já que a realidade não tem o caráter de um sistema, o sistema gerado pela “segunda realidade” é sempre enigmático, falso e mentiroso.
O General Jodl e o almirante Raeder, dois militares que participavam dos ambientes íntimos do Fuhrer, disseram que quando Hitler despencava nas profundezas de suas convicções ideológicas, fluíam as ideias e projetos mais criminosos que foram gestados pelo nacional-socialismo, como a solução final, consistente na extirpação do povo judeu. São ideias nascidas da “segunda realidade”
Essa arrematada estupidez, segundo Eric Voegelin, que entre 1933 e 1938 foi um dos mais vigorosos críticos do regime de Hitler na Alemanha, “por prejudicar não apenas o estúpido, mas também outros seres humanos (nesse caso, milhões de seres humanos, que devido a ela foram levados à miséria e foram mortos) - tem de ser chamada, nessa circunstância social específica, estupidez criminosa”.
Desassossega fortemente o espírito do homem comum, a frase proferida por Lula da Silva, o Presidente do Brasil, segundo a qual “essa gente que renasceu no neofascismo colocado em prática no Brasil tem que ser extirpada, e nós vamos ser muito duros com essa gente para eles aprenderem a voltar a serem civilizados”.
É evidente o quanto esta declaração é uma ameaça ao Estado Democrático de Direito. A eliminação da Oposição, aqui indistintamente considerada fascista, implica em abrir caminho ao estabelecimento de um sistema totalitário de poder.
Todavia, o que estarrece é a existência de um Governo encabeçado por um governante, cujo espírito está infectado de uma doença incurável. Não se trata uma enfermidade da mente, mas de um defeito do espírito, que não tem limites e de cujo mal podemos esperar as monstruosidades que o nazismo instaurou num continente civilizado.