A nossa Universidade vai de mal a pior. É, sobretudo, imprestável. Ostenta um notável descolamento da sociedade que a cerca e a sustenta. Raramente, se percebe sua mão, ou melhor dizendo, uma contribuição efetiva frente às nossas necessidades, das mais simples às mais complexas, do ponto de vista científico.
Recentemente, o nosso país se viu engolfado, como o mundo todo, nas garras mortíferas de uma grave pandemia. Descobrimos, então, que precisávamos importar vacinas, máscaras, luvas, oxigênio, hospitais de campanha, pois não tínhamos nada disso, a fim de socorrer a nossa desvalida população.
Uma simples olhada, contudo, para a nossa universidade e lá estava ela, na melhor das hipóteses, discutindo se um homem era um homem ou uma mulher, como trogloditas da idade da pedra, quando não estávamos expondo nossas vergonhas em dancinhas mirabolantes.
Pichada em suas paredes com desenhos de mau gosto, conferindo um ambiente depressivo e degenerado, cadeiras quebradas, cenas de sexo explícito e nudez sem pudor, professores agredidos, consumo de drogas, tudo enfim, protegido pela autonomia universitária, sinônimo de território sem lei.
A maioria dos estudantes, e até mesmo dos professores, professa ideias, que visam desconstruir os valores mais enraizados da civilização ocidental, tais como o cristianismo, o sexo binário, a formação racial do Brasil e chegam a contestar elementos e personagens essenciais da nossa História nacional, no afã de reescreve-la com base em suas crenças ideológicas.
É comum nas universidades a proliferação de bandeiras políticas que vão do antissemitismo ao apoio explícito a grupos terroristas, transformando o marcathismo - ambiente político vivenciado pelos Estados Unidos de perseguição aos esquerdistas naquele país na década de 1947 a 57 num movimento angelical - comparado à caça às bruxas que se desenrola hoje nas nossas escolas superiores.
Há muito tempo a livre circulação das ideias foi desterrada do convívio universitário e substituída pelo pensamento único, num processo inexorável de sovietização dessa importante instituição para o presente e o futuro da nação, a qual será inevitavelmente uma reprodução daquilo que foi assimilado pelo corpo acadêmico da universidade.
Por volta de 1968, seguramente o mais festejado dos professores da época, responsável pela formação de tantos outros, como Fernando Henrique Cardoso, Paul Sínger, Otávio Iani entre tantos outros, Florestan Fernandes vociferou, como um sábio marxista que não teme em prever o futuro, que “o ‘protesto estudantil’ é o único que se equaciona com vitalidade indestrutível e que expõe, acima das vinculações e dos compromissos de classes, essas questões cadentes”. Em seu livro Reforma ou Revolução o referido professor emérito denominou de questões candentes a prometida revolução, a qual ele, logo no Prefácio que escreveu ao citado livro cuidou “esclarecer lealmente, porém, que não alimento nenhuma fé reformista”.
No que deu, então, a “fé revolucionária” de Florestan Fernandes? Sem nenhuma dúvida, nesse cenário de horror em que se converteu a nossa universidade e que, também sem nenhuma dúvida, se converterá a sociedade para a qual a mesma universidade fornece os quadros de sua futura gestão e pretensa solução dos problemas sociais ainda vigentes neste futuro-presente.
O que se pode esperar, quando finalmente a revolução chegar pelas mãos do gênio presuntivo do professor Florestan Fernandes, senão o caos, a desordem, a anarquia?
A menos que a nova universidade, oxigenada pelo sopro inovador da revolução, nasça da terra arrasada, não careça de uma tradição onde fincar seus pés e possa desse modo prosperar, com vistas a cumprir a missão imaginada desde a Idade Média, enfim, como se a História não fosse necessária, como é, a qualquer instituição.
Darci Ribeiro, antropólogo de tantos méritos, supõe em 1975, em seu livro A Universidade Necessária, que a nossa Universidade se encontra na encruzilhada entre duas opções: a modernização reflexa ou o crescimento autônomo.
A modernização reflexa representa a importação dos valores políticos e morais que comandam o processo de desconstrução da universidade norte-americana, anunciando que trilhamos o mesmo caminho. A cultura identitária e a do cancelamento encontrou no solo universitário brasileiro terreno fértil para a sua propagação, a tal ponto que hoje podemos falar de imperialismo ideológico.
Mais brando que seu colega Florestan, Darci reconhece que o crescimento autônomo, ainda que tenda a reproduzir instituições sociais arcaicas, “poderá representar um papel ativo no esforço de superação do atraso nacional”.