Foi precisamente diante do computador, que mudei de ideia. Pensei em comentar a fraude nas “eleições” da Venezuela, a trapaça de Maduro, useiro e vezeiro na arte de trapacear prender e matar. Quis dar à História seu verdadeiro sentido.
Recorri a Marc Bloch, que lá nos idos de 1929, juntamente com Lucien Fevre e Fernand Braudel definiram os princípios da escola dos Annales, através da qual destruiu a historiografia “événementieele”, sustentada nos fatos, na ação dos grandes homens e heróis, para inaugurar a História como problema, enredo de uma época.
A História não seria mais entendida como ciência do passado. Para Marc Bloc “passado não é objeto de ciência”. O presente passa a ser um elemento fundamental para o entendimento do passado, mesmo que este seja ainda essencial para explicar o presente. Porém, é no presente que floresce o que no passado não tinha desabrochado por inteiro.
Essa visão regressiva ilumina a História para novos empreendimentos científicos, para aquilo que denominamos ciência dos homens nos tempos passado e presente.
Daí ser evidente a suspeita bem fundada que caminhamos inexoravelmente para nos tornar uma Venezuela. São os elementos do presente que saltam aos olhos. Na proporção de nossas diferenças históricas, porém cumprindo os mesmos roteiros políticos, desenhamos um cenário muito semelhante.
O que nos falta? Já temos implantado claramente a fundição entre os poderes do Estado, notadamente entre o Executivo e o Judiciário; a chamada velha imprensa adota uma linguagem de subserviência aos ditames do poder politico vigente; jornalistas e políticos, quando não estão presos ou foragidos, têm seus direitos cassados; o estamento militar acomodou-se perante um poder civil corrupto e corruptor; os detentores do poder econômico, uma elite dos super-ricos, contentam-se com o cumprimento pelos poderes do Estado da Agenda 30, arguida pela ONU e aparelhada para o Governo Mundial e o fim das Democracias; a política externa do Governo aprofunda suas alianças com a China, as ditaduras espalhas pelo mundo, o terrorismo e as ilusões lulistas; a Nação estraçalhada pelas divisões identitaristas incentivadas pelo Governo central. O que falta para o golpe final?
Nem o povo, concebido como o conjunto das classes dominadas, nem a burguesia têm um projeto nacional voltado para a emergência de uma Democracia forte, livre da fome e da miséria.
O projeto nacional, concebido e que vem se desenvolvendo anos a fio, consiste numa esdruxula aliança entre a nossa emburrecida burguesia, sua congênere internacional e o petismo, em que o capital e o trabalho estão irmanados na Festa de Babette!
O que de fato presenciamos neste estranho e paradoxal entrelaçamento, é um dos produtos menos estudado e conhecido das consequências do desaparecimento do velho mundo, à época da guerra fria e do desmantelamento do mundo comunista.
A transformação da luta de classes em conflito de identidades, esta última estimulada pelos super-ricos e a esquerda, numa aliança de anormais. Os primeiros porque almejam a diminuição da população mundial e o segundo porque alimenta a confrontação e o conflito no interior das sociedades. Em ambos os casos solapam as Nações, propiciando o fim das fronteiras nacionais e das suas instituições culturais e democráticas.
Extintas as Nações, os super-ricos têm o terreno fértil para a destruição das instituições democráticas e consequentemente do governo mundial que tanto desejam e os comunistas, ansiosos para restaurar o totalitarismo, estimam que o caos é o pai e a mãe do regime sem leis e destituído de soberania popular.
É disso que se trata, quando pensamos os valores que qualificam e igualam a Venezuela e o Brasil. Albert Camus nos chama a atenção, com sua sabedoria e sua consciência do mundo: “A única forma de lidar com um mundo que não valoriza sua liberdade, é tornar-se tão absolutamente livre que o mero fato de você existir já representa um ato de rebelião".