Pax era um objeto pagão, nome da deusa romana da paz, que na Idade Média, representava um objeto litúrgico, beijado pelos fiéis no curso da missa católica, cuja simbologia evocava a paz entre os homens.
Na América Latina, um fantasma ronda nosso continente: o beijo da pax. Só ele poderá afastar de nosso contencioso político, num beijo prolongado a ardente, a ameaça da guerra, que nos dias atuais marcha a passos largos para transformar um continente pacífico, num conflito de consequências incalculáveis.
Este beijo, todavia, não contém os dotes divinos dos deuses pagãos, mas estão carregados dos demônios da ditadura, enraizados na Venezuela, em Cuba e na Nicarágua. Muitos anos atrás, em 1984, Norberto Bobbio escreveu em seu livro O Futuro da Democracia, referindo-se ao período posterior à Segunda Guerra Mundial, que “nenhuma guerra eclodiu até agora entre estados dirigidos por regimes democráticos...” para concluir que jamais fizeram guerras “entre si”. Bobbio ainda nos adverte que “a observação é temerária, como já reconheci, mas prefiro fazê-la e aguardar um desmentido.” Até nossos dias, o brilhante sociólogo e cientista político italiano não recebeu nenhum desmentido!
Do mesmo modo, e citado oportunamente por Bobbio no mesmo livro, Immanuel Kant insistiu que o princípio basilar da República, que deveria estar presente na constituição de todos os Estados - o de que todos são iguais perante a Lei- “foi uma ideia, forte, fecunda, inspiradora de muitos projetos pacifistas”. Esta premunição kantiana estava na raiz na sua concepção de paz perpétua.
Quem duvida, que o discurso do Vice Presidente norte americano, J.D.Vance, recentemente em Monique, falando para os europeus, que o retorno aos princípios elementares da Democracia, entre eles a liberdade de expressão, é essencial para que este continente, assim como o nosso, acrescento, reencontre os valores fundamentais, com os quais estarão fortalecidos para enfrentar os arreganhos belicistas das ditaduras¿
Tais palavras, sábias quanto urgentes, devem ser compreendidas no Brasil, que há muito abandonou a tradição de sua política externa, para aderir às ditaduras em nosso continente e no resto do mundo e, em consequência, encontra-se em dificuldades para discutir seu contencioso com a maior potência econômica e militar do mundo, e a braços com uma decisão política que põe em risco a nossa soberania e nossa independência.
Refiro-me, à visível dificuldade com que os principais militares de nossa hierarquia, principalmente no Exército, enfrentaram as ameaças da Venezuela em nossas fronteiras e a falta de consciência e preparo para defender nossos interesses nacionais, quando, brevemente, os projetos irresponsáveis e expansionistas da Venezuela, invadirem o território soberano da Guiana. Não é necessário para inferir o quanto agimos com tibieza e vacilação, quando apenas mobilizamos tropas militares para as nossas fronteiras ameaçadas, quando cabia ao Comandante Supremo das nossas Forças Armadas, desferir um claro comunicado diplomático, segundo o qual o Brasil não aceitará qualquer violação dos seus direitos internacionais e que tem sólido e inabalável compromisso com a paz no Continente.
O nosso país, todavia, envereda pelo descaminho da ditadura do judiciário, ditadura escancarada e violadora de todos os direitos fundamentais, elencados em nossa Constituição e consagrados nas leis. Leva-nos, nós cidadãos brasileiros, a dizer à Ditadura que não queremos a guerra que, como reza o princípio inaugural da Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, proclamar o direito de abolir a opressão e viver em liberdade.