Por uma nova Areopagítica

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Por uma nova Areopagítica

Em 1644, John Milton, em plena guerra civil inglesa, antecedente da Revolução Gloriosa de 1688-9, pronunciou no Parlamento, o famoso discurso em favor da liberdade de expressão e pela revogação da Ordinance  de 14 de julho de  1643, também denominada de Ordem de Licenciamento, que  estabelecia a censura prévia, na Inglaterra.

A Ordem de Licenciamento, de triste memória, obrigava os  autores de livros e outras publicações a obterem consentimento prévio do órgão estatal, registro de todos os materiais de impressão com o nome  do autor, impressor e editor, busca, apreensão e destruição de  quaisquer livros ofensivos  ao  Governo e, finalmente, prisão e encarceramento de  quaisquer escritores, impressores e editores ofensivos.

Com Areopagítica, John Milton, autor também do maravilhoso livro o “Paraíso Perdido”, pugnava pela liberdade de expressão, visando alcançar, através do livre debate e do confronto das ideias, o avanço do conhecimento e da verdade. Numa Assembleia de maioria presbiteriana, John Milton classificava a censura como nascida na  Inquisição católica, herdeira  da tirania da modernidade nascente e  do Concílio de  Trento.

John Milton afirmava que o bem e o mal estão imbricados, são filhos do tempo e que proibir apenas um deles, dilacera o outro. Para este precursor das liberdades civis, tanto o  conhecimento, quanto a verdade brotam dos livros livremente publicados e que  cabe  ao  leitor distinguir o bem do mal, antevendo, assim, o que  viria anunciado no Bill Of Rights inglês de 1688.

O Areopagítica, reminiscência dos debates travados à época da Grécia democrática, no âmbito de seu famoso Areópago, o brilhante John Milton, condena veementemente a censura prévia de qualquer livro, conclamando pela prevalência  da razão e da liberdade, lembrando que os livros que  exaltam  maus princípios e valores serão combativos todas as vezes que não permaneçam ignorados. 

A coerção externa não torna os indivíduos virtuosos, pois os valores morais dependem da livre escolha de cada um e a censura termina por elidir as faculdades inerentes ao juízo racional e à capacidade de escolha.

Foi nessa época que John Milton deslocou-se até a Itália e visitou Galileu. Encontrou-o velho e alquebrado pelos  sofrimentos imposto pela crueldade da Inquisição, pela simples razão que sustentou as verdades de uma nova Astronomia, em franca divergência com seus inquisidores católicos. Nesta visita, certamente, John Milton comprovou que “onde é grande o desejo de apreender, é também grande a necessidade de discutir, de escrever, de ter opinião. Porque a opinião, entre homens de valor, é conhecimento em formação”.

Já nesta época, na  qual o mundo ocidental se  debatia para descobrir os  fundamentos de uma  vida plena, fundada nos direitos  humanos -principalmente nas liberdades - John Milton antevia as grandes  conquistas que o século XVII e o vindouro estavam prestes a proclamar, e  afirmou com máxima  sabedoria: “se o que se deseja saber é a causa  imediata de toda a liberdade de escrever e de falar, nenhuma outra me parece mais verdadeira  do que a vossa maneira moderada, livre e humana de governar”. A esse dever renunciaram nossos governantes atuais e os poderes entre nós constituídos abandonaram este princípio basilar, tornando a ação do Estado a mais insuportável tirania.

Parece que John Milton discursou para nós, os  coevos, tal a medida de  suas sábias palavras, que  atravessaram o tempo, em meio a guerras  e toda  sorte de infortúnios,  para nos  dizer que um novo Areopagítica, renascerá em plena História, para nos advertir  que ”qualquer magistrado pode ser vítima de  falsas informações, principalmente se a liberdade estiver limitada  ao poder de  alguém”.

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