Dos Estados Unidos da América, primeira República, numa época em que o mundo ocidental vivia sobre cabeças coroadas, não se pode dizer que nasceu novamente, com a recente eleição presidencial de Donald Trump.
Não, ninguém nasce duas vezes, ainda mais que o nascimento do país norte americano se deu numa guerra cruenta com a Coroa Britânica e reafirmou sua existência como nação independente e soberana na grande guerra civil de secessão, entre os Confederados do Sul e a União do Norte, confrontando os Democratas escravocratas e os Republicanos sob a bandeira do trabalho livre.
O voto majoritário, concedido pelo povo norte americano, tanto nas eleições populares, como na escolha dos delegados do Colégio Eleitoral conferiram ao Presidente eleito, uma ampla maioria, consignando uma das eleições presidenciais mais representativas da longeva história política da Democracia norte americana.
Essas eleições ultrapassaram e muito uma simples escolha de candidatos, considerando os seus talentos e propostas, face os problemas econômicos, a crise inflacionária do país, a tibieza e vacilações das políticas externas da administração democrática, o fracasso das políticas sociais, o descaso com a classe trabalhadora, entre outros problemas internos dos Estados Unidos da América.
O debate público trouxe à tona os valores e a decadência da maior nação do mundo, tanto às suas crenças e convicções, quanto à sua capacidade de renovar-se, inovar, inventar e fortalecer seu modelo político, baseado na Democracia e na liberdade de expressão.
O valor universal da Democracia, expresso no zelo e devoção constitucional, na prevalência do federalismo como sistema capaz de assegurar equilíbrio e igualdade desde a criação da Republica pelos pais fundadores dos princípios políticos nacionais, foram valores que deixaram de ser elementos fundamentais do debate público.
A deletéria divisão da sociedade em identidades conflitantes e decisivas para a unidade da Nação, fomentadas por uma “inteligência” obtusa e aderente a concepções que eliminam do ser humana seus direitos naturais e sua identidade humana, independente de sua raça, sexo, gênero e dos próprios direitos humanos, por todos reconhecidos.
O discurso concebido para desqualificar e desumanizar o adversário político, levou o debate político para um mundo irreal, onde prevalecia a mentira e a sordidez. Tal comportamento, através do qual, o candidato republicano era o monstro, semelhante a Hitler ou algo parecido, ou em palavras mais chulas, o eleitor republicano era um lixo desprezível.
Nesta eleição, podemos ver bem desenhado o que no magnífico livro de Antônio Risério, intitulado IDENTITARISMO, e recentemente publicado no Brasil, o que ele distingue, como uma citação indispensável, para quem discute o assunto, as palavras de Ayaan Hirsi Ali, escritora negra, nascida na Somália e depois exilada na Holanda: “A civilização ocidental está sob ameaça de três forças diferentes, mas relacionadas”, para em seguida afirmar: “o ressurgimento do autoritarismo e expansão de grandes potências nas formas do Partido Comunista Chinês e da Rússia de Vladimir Putin; o aumento do islamismo global, que ameaça mobilizar uma vasta população contra o Ocidente; e a disseminação viral da ideologia ‘woke’, que está corroendo o tecido moral da próxima geração”.
A vitória de Donald Trump representou um sonoro grito de um povo, que certamente não é nem nazista, nem fascista, mas expressa uma tradição política democrática, cujas instituições são sólidas e já comprovaram a capacidade de enfrentar desafios, para os quais esteve ao lado das Democracias, mesmo que em outras circunstâncias possa ser questionado.
Trump tem a possibilidade, esperada por muitos no mundo inteiro, de deter o colapso da mais pungente Democracia do planeta, ainda que este colapso e as politicas que o representa já tenham se aproximado mais do que se imagina.